O momento em que Vermelho, Branco e Sangue Azul me ganhou acontece por volta dos 45 minutos de filme, quando o príncipe britânico Henry (Nicholas Galitzine) e o primeiro-filho estadunidense Alex (Taylor Zakhar Perez) já superaram suas neuroses e começaram o namoro que forma a crúcis da trama - mas, claro, antes de assumirem o romance publicamente. Quando Alex comparece a um jogo de pólo beneficente do qual Henry participa, os dois escapam juntos para uma cabana onde os equipamentos dos jogadores são guardados a fim de… bom, você consegue imaginar o quê.
É nessa cena que o diretor estreante Matthew López mostra suas garras, entrecortando a pegação dos protagonistas com close-ups espertos da partida de pólo que aconteceu logo antes, do lado de fora, conectando a sensualidade do encontro entre os dois com a fisicalidade do esporte. López, com a ajuda do diretor de fotografia Stephen Goldblatt (Closer: Perto Demais) e da montagem de Kristina Ketherington (O Milagre) e Nick Moore (Um Grande Garoto), captura perfeitamente a eletricidade do jogo de olhares e movimentos que caracteriza o flerte, o bom humor inerente da sexualidade recém-desabrochada, e a agilidade ofegante da transição entre as “preliminares” e os “finalmentes” quando se trata da relação jovem-adulta.
Vermelho, Branco e Sangue Azul está salpicado de momentos como esse, que revelam uma preocupação expressionista inesperada para uma comédia romântica jovem lançada em um serviço de streaming e baseada em um livro que, independente de suas qualidades, deve grande parte do sucesso à ansiedade por inclusão queer nos chavões narrativos do romance. Não que o filme também não faça esse trabalho - aliás, ele o faz com inteligência aguda, contornando ao redor dos clichês mais cansados do gênero (por exemplo: a mentira que é descoberta de última hora, abalando a relação dos protagonistas) sem abrir mão dos mais charmosos (a paixonite intensa dos primeiros diálogos entre os dois é expressada em diálogos perfeitamente afinados).
A estrela-guia do filme é a vontade de se manter genuíno às situações únicas de seus personagens, confiando que - ao invés de se encaixar em uma narrativa pré-pronta e heteronormativa - o público LGBTQIA+ quer mesmo é se entender como possível protagonista de uma boa história que, como qualquer outra, é como nenhuma outra. Coescrito por López e Ted Malawer (Halston), o roteiro de Vermelho, Branco e Sangue Azul chega incólume aos últimos dez minutos do filme, o que faz com que seu rápido pulo para uma fantasia política ingênua de aceitação, a fim de entregar um final feliz, incomoda muito menos do que incomodaria em outro contexto. De certa forma, nesse sentido, o filme é menos Com Amor, Simon e mais Projeto Flórida.
O difícil mesmo, no entanto, é não se encantar pelo que ele faz além desse serviço. Em uma cena crucial do segundo ato, por exemplo, um aliviado Alex decide declarar seu amor a Henry após se assumir para a família, sem perceber que o príncipe ainda se sente preso aos deveres da realeza. A fotografia, então, se aproveita da ambientação em uma lagoa para registrar as gotas d’água cintilando na pele de Zakhrar Perez, tornado-o uma figura ofuscante em tela justamente no momento em que o personagem, despido de seus estresses, deixa a própria luz ofuscar a palidez do parceiro. O contraste entre os dois, capturado especialmente em um longo take de Henry posicionado à frente de Alex, evitando o seu olhar, diz muito mais do que o próprio diálogo.
É em momentos como esse que Vermelho, Branco e Sangue Azul demonstra estar acima da própria demanda que o tornou possível, no sentido mercadológico. Na especificidade expressiva de sua composição cinematográfica, assim como na assertividade brincalhona (mas nunca irônica) de sua sexualidade franca, ele se mostra dotado de uma visão rara em Hollywood: plenamente consciente de si mesmo como produto, mas teimosamente indisposto a ser somente isso.