Embora seus filmes nos últimos cinco anos, como Noite e Dia (2008) e Hahaha (2010), sejam pequenas variações de uma mesma análise cômica do comportamento masculino, o cineasta Hong Sang-soo também sabe prestar atenção ao lado feminino - especialmente no que as mulheres têm de oposição aos homens.
a visitante francesa
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O tema da mulher cortejada por vários homens, presente em filmes de Hong desde A Virgem Desnudada por seus Celibatários (2000) até Oki's Movie (2010), se repete em A Visitante Francesa (In Another Country, 2012). A particularidade deste filme é que Hong, pela primeira vez, trabalha com uma estrela internacional, a francesa Isabelle Huppert, que interpreta em três segmentos três personagens chamadas Anne, francesas de passagem pelo litoral sul-coreano.
De novo as pequenas alterações numa mesma situação. A primeira Anne é uma diretora de cinema; a segunda, uma esposa adúltera de um empresário; a terceira foi trocada pelo marido por uma coreana. Em todos os segmentos, Anne sempre encontra um salva-vidas na praia, pergunta pelo farol no mar, bebe shochu com amigos/pretendentes e toma pequenas decisões sem consequência aparente, como que caminho tomar num passeio.
Como aqui a relação se dá com uma estrangeira, o tradicional olhar de fora para dentro - Hong estudando de cima o que torna os homens, no caso os coreanos, tão apegados ao romance mas inaptos para o amor - deixa o subtexto e se torna texto. Então a frase que as várias Annes mais ouvem (e não necessariamente entendem) em coreano é: "Não posso deixar você beber que já vai se engraçando com outra mulher".
O humor dos filmes de Hong sempre vem daí (e dos seus zooms desconcertantes), e com A Visitante Francesa não é diferente. A novidade é o roteiro tornar isso um debate dentro da diegese: coreanos acusando em outros coreanos traços de personalidade que eles são incapazes de perceber em si mesmos. Todo mundo enche a cara e busca o amor nos filmes de Hong Sang-soo, mas aqui, diante de um estranho como Anne, isso se torna um problema, como se os coreanos subitamente desenvolvessem um superego à prova de pinga.
Então vira uma espécie de conforto saber que - diante de tanto desencontro de idioma, de expectativa, de comportamento, desencontros que só aumentam - as mulheres são iguais nas suas diferenças. Cada mulher ama de maneira própria, e é essa imprevisibilidade que as torna tão atraentes, tão abertas ao contato à beira-mar nos filmes de Hong, enquanto aos homens resta a trágica condição de repetir-se, em si e nos outros, com suas desesperadas tentativas de aproximação.
A atuação de Isabelle Huppert é certeira, nesse sentido. Atriz expansiva que frequentemente domina os filmes onde aparece, a francesa é domada pelos enquadramentos fixos e pela encenação dura de Hong, cuja mise-en-scéne quase sempre se resume ao elenco entrando pelas beiradas e andando até sua marcação no centro do quadro. Há pequenas diferenças de composição nas personagens vividas por Huppert, porém, que são suficientes para tornar as três Annes nitidamente distintas, desde inflexões na voz à maneira de mexer no cabelo.
Na verdade, é outra a frase que as Annes mais escutam ao longo de A Visitante Francesa, um elogio, todos os coreanos repetindo como ela é linda. Sentimos que é um elogio sincero - apesar da repetição, embora pareça um xaveco automático, como dizer bom dia - porque Anne nunca é a mesma.
A Visitante Francesa | Cinemas e horários