Seria muito fácil falar mal de Dreamgirls - Em busca de um sonho (Dreamgirls, 2007). Dizer que a produção suntuosa esconde um enredo que não aprofunda os sentimentos dos personagens. Que, na meia hora final, a história se perde. Ou cuspir que Beyoncé Knowles, como atriz dramática, é um ótimo corpinho.
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Mas pra que estragar a festa? Dreamgirls não quer provar nenhum tipo de arte, e não precisa ser tratado como tal. É diversão e ponto.
Baseado no musical homônimo, que estreou na Broadway em 1981, o filme é uma bela revisão da música negra estadunidense de vinte anos antes, daquele momento crucial em que o cinismo tomou conta da música e resultou no cenário de hoje, com rappers movidos a peso de ouro e divas R&B insossas construídas com massa de modelar.
O enredo, importado da peça, adapta em um trio fictício a história de Diana Ross e as Supremes. O caminho é praticamente o mesmo: garotas de Detroit descobertas pela recém-inagurada gravadora Motown fazem sucesso com o ingênuo doo-wop da época. Logo depois, a líder que canta bem é trocada pela integrante mais bonita para que o grupo emplaque nas paradas pop. Daí vem a decadência, com o som do trio se moldando à moda musical da época, do soul à disco music da década de 70.
O papel da gostosa com voz sem graça, é claro, caiu no colo de Beyoncé. A ex-Destiny's Child, apesar de ser a musa do cartaz, é a estrela mais apagada do elenco. Não é a toa que o filme perde boa parte da graça quando ela se torna a personagem principal. Beyoncé encarna com propriedade o novo momento da música negra, pasteurizado e chato, do qual é o expoente máximo hoje.
A concorrência da cantora-agora-atriz, que inclui Jamie Foxx e Danny Glover, não a ajuda. A novata Jennifer Hudson (que interpreta Effie, a gordinha que canta de verdade) rouba a cena assim que abre a boca. E Eddie Murphy alcança o grande papel dramático da sua carreira com seu cantor decadente, uma mistura de James Brown com Marvin Gaye.
Dreamgirls tem outros tantos pontos fortes além do elenco, como a direção de arte sensacional e os figurinos impecáveis. Para quem gosta das Supremes, vale prestar atenção para achar as dezenas de referências escondidas, nos vestidos das moças e nas capas dos discos. E o diretor Bill Condon, escolado depois de ter preparado o roteiro de Chicago (2002), consegue transferir o musical da Broadway com forca suficiente para a tela, não deixando espaço para o espectador pensar muito na história, costurada com as músicas possantes da trilha sonora.
Pelo menos é distração o bastante para diminuir a estrela superestimada de Beyoncé, uma mera coadjuvante dessa fantasia black, capaz de fazer todo mundo sair cantarolando feliz do cinema. Como nos bons e velhos tempos.