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Entrevista

Omelete Entrevista: Neil Gaiman

Autor de Coraline fala sobre a adaptação ao cinema do livro, Batman, sua carreira...

25.01.2009, às 15H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H44

Neil Gaiman entrou na sala do hotel em Los Angeles com sua habitual jaqueta preta e segurando nas mãos um Google Phone. Fanático por tecnologia e interação online com seus fãs como é, antes de sentar-se na mesa em que os jornalistas o esperavam para conversar sobre Coraline e o Mundo Secreto, quis tirar uma foto. Na hora a colocou no Twitter, em twitter.com/neilhimself (aqui o link direto para a foto - eu, para quem não assiste à OmeleTV, sou o quarto da esquerda para a direita). Satisfeito, enfim começamos a conversa - a quarta entrevista do Omelete com ele! - sobre a adaptação do livro Coraline pelo genial cineasta Henry Selick. Confira!

Coraline

Neil Gaiman

Whatever Happened to the Cape Crusader

Graveyard Book

Coraline

Coraline

Coraline começou como um livro, aí virou uma peça de teatro, uma história em quadrinhos e agora um filme e um videogame...

E um musical! E uma peça de marionetes!

Caramba... Bom, eu sei que você não planeja essas coisas, mas está ficando difícil escrever sabendo que seu trabalho será recriado em tantas mídias diferentes?

Não penso assim. Quando estou escrevendo nunca me passa pela cabeça que meu trabalho será transformado posteriormente. Você pensa: "O que estou fazendo nesta página?" ou "como vou terminar este parágrafo?" São esses pequenos problemas que o mantêm são. Se alguém me dissesse antes "Neil, quero que você escreva um livro que vai virar três peças de teatro, uma história em quadrinhos e um longa-metragem de 70 milhões de dólares", eu ficaria aterrorizado.

É exatamente isso que acontece quando alguém é contratado para escrever uma continuação...

Eu nunca escrevi uma. Bom, pelo menos por enquanto. The Graveyard Book, meu novo livro, deve ganhar uma. É muito estranho isso... tenho trocado idéias a respeito com o diretor e roteirista da adaptação. É bem complicado.

Esse aqui é meu quinto filme, acho, e cada um tem um pouquinho mais de sucesso que o anterior. Mas eu escrevo há 25 anos... é como alimento minha família. Demorou muito pra chegar a esse ponto. Então, o cinema é meio irrelevante na minha carreira. The Graveyard Book está há 16 semanas na lista dos mais vendidos do New York Times. É na literatura que coloco meu esforço, meu trabalho. No caso de filmes como Coraline o que eu tento fazer é encontrar pessoas de quem eu gosto e confio, e entrego meu bebê a elas, para que elas cuidem dele.

O sucesso está dando a você a chance de controlar melhor seu trabalho então?

Como autor eu sempre tive esse poder - e o exerci desde sempre. Não se comenta por aí sobre todas as vezes quando eu disse "não" a uma proposta porque esses projetos não são realizados. Onze anos atrás eu recusei uma proposta da Miramax de 3 milhões de dólares pelos direitos de adaptação de todas as minhas histórias curtas. Na época esse dinheiro era ainda mais expressivo e teria mudado muito a minha vida. Mas eu não teria controle algum e eles teriam direito de adaptar cada história que eu já escrevi. Pensei a respeito por duas ou três semanas e finalmente resolvi não fazer.

Como foi esse processo de aceitação com Coraline?

Coraline foi muito fácil. Partiu de mim. O que eu fiz foi terminar um primeiro rascunho do livro em 2000 e antes de mais nada pedi para o meu agente que o entregasse a Henry Selick. Eu tinha visto O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas) e apesar do filme ter o nome de Tim Burton enorme no topo eu sabia que Selick era o responsável pela direção. Depois eu vi James e o Pêssego Gigante (James and the Giant Peach) e também adorei. Henry tem algo especial, ninguém se compara a ele em stop-motion - o cara é o melhor que existe. E também amo a maneira como ele é capaz de mostrar bravura colocando seus personagens dentro da escuridão. A luz às vezes brilha mais forte em lugares escuros. Então Henry tinha o livro 18 meses antes de sua publicação. Um mês depois ele comprou os direitos e resolveu escrever também o roteiro. Eu o apoiei o tempo todo - e quando ele me mostrou o primeiro rascunho lembro de ter dito que era literal demais, que ele precisava ampliá-lo, torná-lo mais dele. Também me lembro de momentos como o dia em que o livro saiu. Eu fui ler em uma livraria para os fãs e Henry estava lá na platéia. Outro momento foi quando o contrato expirou e Henry e Bill Mechanic [o produtor] não tinham dinheiro para comprar outra vez, então me pediram pra renovar o contrato de graça. Sabe, isso não é algo que se faça nessa indústria. Ninguém faz isso. Ninguém. Mas eu fiz. Eu queria que Henry fizesse esse filme e sabia que se os direitos ficassem com ele o filme um dia sairia. E saiu! Foi assim que esse filme aconteceu... e em diversos momentos outras pessoas me procuraram querendo adaptá-lo, querendo saber quando os direitos iam expirar - e dispostas a pagar muito mais dinheiro do que Henry.

Agora que o filme está pronto, ele supriu suas expectativas?

É exatamente o filme que eu esperava que ele fizesse: um filme dele, ainda que um filme do meu livro. Ele tem trechos da história, mas foi expandido, já que não é um livro assim tão grande. E ele o fez com sua incrível imaginação, sem amainar nada. Eu adoro o fato de ele ter mantido as crianças fantasmas ou um rato tendo sua cabeça comida por um gato. É curioso, mas são os adultos que me falam que ficaram assustados com a história, que terminaram o livro de madrugada e saíram fechando as portas. As crianças simplesmente adoram.

Você escreveu em seu diário online que o último trailer de Coraline foi o primeiro de que você realmente gostou. Por quê?

Porque é o primeiro trailer que realmente parece o filme. O problema que eu tenho com os anteriores é que eles o faziam parecer Alice no País das Maravilhas. Faziam parecer "ei, um filme sobre uma garotinha que viaja para um lugar fofo!". Esse não é o livro que eu escrevi nem o filme que Henry dirigiu! As pessoas reclamavam pra mim com base neles que todo o lado sombrio do livro havia se perdido, o que não é verdade. O filme é muito fiel ao livro. Esse último trailer realmente parece o filme - se você não gosta dele talvez seja melhor não ir assistir. E se você gosta dele não sairá do cinema decepcionado.

Segundo a DC Comics, você escreveu a mais importante história do Batman da última década, "Whatever Happened to the Cape Crusader", uma que estabelecerá o tom das histórias do super-herói pelos próximos anos. Como você se sente a respeito?

Estou nervoso. E bem feliz. Tive a ajuda do melhor artista do mundo, Andy Kubert, e pude fazer exatamente o que eu queria. Eu não imagino outra maneira como eu teria aceitado fazer um arco de duas partes do Batman além de como aconteceu: Dan Didio [editor da DC] me ligou e disse que eles queriam que eu escrevesse a última história do Batman: "A última edição da revista Batman, a última edição da revista Detective Comics e você pode fazer o que bem entender, contanto que seja a última história dele". Então eu a escrevi e pude escolher Andy Kubert para desenhá-la. Foi glorioso. Mas estou nervoso que as pessoas queiram me matar depois dela.

O que aconteceu com a adaptação de Black Hole?

Roger Avary e eu entregamos a nossa segunda versão do roteiro logo depois da greve dos roteiristas. Mas aí David Ficher assumiu o projeto e nos disseram, basicamente, que éramos caros demais pra ele. O jeito de Fincher trabalhar é mexer muito nos roteiros - ele chega a pedir 15 versões do texto - e eles não poderiam nos pagar para escrever tanto. Então eles decidiram nos manter na reserva, para a última mexida no texto, e contratar jovens e entusiasmados roteiristas para mexer no que nós fizemos. Pode ser que voltemos no final, ou não... depende de como as coisas caminharem. Mas é assim que o cinema funciona. É esquisito. Quando estou escrevendo um romance ele é meu. Quando estou escrevendo um filme sempre tenho em mente que sou um contratado de outra pessoa - que me paga seguro-saúde. É assim que funciona e se a produção um dia fica pronta, pode ser que você sequer reconheça seu trabalho nela. Por outro lado, eles pagam milhões de dólares e o segura-saúde, então eu posso viver com isso.

Coraline conta a história de uma garotinha que vive com seus pais em um enorme e antigo casarão. Acostumada a explorar os vastos jardins e pátios, Coraline fica um dia trancada em casa por causa da chuva, aborrecida. Decide então contar as coisas azuis, as janelas e as portas - e atrás de uma delas acaba achando um universo alternativo, sombrio, estranho e aterrador, onde existem versões de seus pais com enormes botões no lugar dos olhos. O filme estreia aqui simultaneamente aos EUA, em 6 de fevereiro de 2009.

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