“Rir é um ato de resistência.” Desde que ouvi a triste notícia da morte do ator, humorista e diretor Paulo Gustavo essa frase não sai da minha cabeça. Para mim, a comédia sempre foi um refúgio. Um lugar quentinho, sobretudo nos últimos tempos, quando a realidade é tão difícil de digerir, e a impotência é rotineira. Mas, antes dessa sensação de pequenez diante da pandemia e do desgoverno, é fato que fazer piada do absurdo cotidiano já era o modus operandi do brasileiro. E não necessariamente como fuga.
Na ironia, estivesse ela manifestada em uma charge, esquete, crônica, peça ou na espontaneidade (ou embriaguez) de uma mesa de bar, ela sempre foi a nossa ferramenta para seguir adiante. Às vezes com mais crítica ou, simplesmente, com o coração mais leve para aguentar mais um dia. No exagero de um humor gritado e escrachado, fomos e somos capazes de olhar para nós mesmos e enxergar a nossa realidade com uma clareza que só a piada pode nos proporcionar: rendidos. Porque, embora a dor e o drama do outro tenham sido simplificados como “mimimi”, a risada te obriga a baixar sua guarda e sentir no peito o peso do seu próprio escárnio. Quer você queira ou não.
Não precisa ser fã do Paulo Gustavo - nem descer mais de um degrau do pedestal do jornalista cultural encastelado, como bem apontou Guilherme Genestreti na Folha de S. Paulo - para ver como ele foi e sempre será importante para a cultura e para o povo brasileiro. Seus personagens ressoaram de tal maneira que, mesmo na crise de 2017, ele quebrou recorde de público e arrecadação nos cinemas com Minha Mãe é Uma Peça 2: R$ 124 milhões. Uma nova aventura da Dona Hermínia, a caricatura da sua mãe, foi ainda mais longe e fez mais de R$ 180 milhões no ano passado, a maior renda da história do cinema nacional.
Contudo, esse marco comercial é pequeno para quantificar as risadas causadas pelo divertidíssimo Valdomiro, do sucesso Vai que Cola, pela Senhora dos Absurdos, cuja insensatez cômica um dia pareceu mais distante - hoje, é até uma prévia das mensagens do grupo da família no whatsapp -, ou qualquer outro dos seus personagens. Muito menos mensurar o legado de um cara que, pelo humor, levou discussões ditas tabus para tantos lares brasileiros.
No 220 Volts, Paulo Gustavo chamou a risada de resistência para levar esperança para o brasileiro que, prestes a entrar em 2021, já não via muita razão para esperar pelo melhor. Hoje, novamente, está difícil esboçar um mero sorriso. Parece que só nos sobrou a indignação, a revolta, a raiva e, novamente, a nossa velha sensação de impotência diante do caos - pelo menos, aqui para mim. Como, então, resistir quando rir parece impossível?
1 - Atente-se à sua hipocrisia
Rir da hipocrisia alheia é gostoso, mas nunca é demais fazer um exercício de autocrítica. Se a retrospectiva da Blogueirinha do Fim do Mundo te lembrou muito o seu próprio 2020 não ironicamente, resista sendo diferente de agora em diante. Como bem colocou Tata Werneck em um de seus muitos posts homenageando Paulo Gustavo, não deixem a dor e o luto de 400 mil famílias serem em vão: "Entendam a gravidade dessa pandemia. Usem máscara. Álcool gel. Distanciamento social. Por favor".