Apontar a década de 1990 como a Renascença das comédias românticas não exige muitos argumentos. Na realidade, basta observar alguns dos filmes desse período: Uma Linda Mulher, Um Lugar Chamado Notting Hill, 10 Coisas que Eu Odeio em Você, Mens@gem Para Você, O Casamento do Meu Melhor Amigo... Quer dizer, alguns dos grandes clássicos do gênero chegaram aos cinemas justamente nessa época.
Infelizmente, embora a boa fase tenha durado até meados dos anos 2000, as rom-coms gradualmente foram perdendo seu espaço — mas só o espaço, porque o apelo de uma boa história de amor nunca se foi. Afinal, mesmo que os lançamentos tenham ficado escassos e, convenhamos, a régua de qualidade tenha caído um pouco, só nos últimos 10 anos temos longas românticos e divertidos que botam em dúvida a ideia de que “não fazem mais rom-coms como antigamente”.
Por isso, nesse Dia dos Namorados, nossa dica é deixar a nostalgia de lado e dar uma chance para ao menos um desses filmes:
DESCOMPENSADA (2015)
Descompensada/Universal Pictures/Reprodução
Disponível apenas para compra/aluguel nas plataformas digitais.
Começar recomendando um filme da Amy Schumer é ousado, e acredite: eu entendo. Porém, Descompensada envelopa o humor particular da comediante de um modo surpreendentemente doce e acolhedor. Aqui, ela interpreta uma mulher que desde pequena não vê por que alguém seria monogâmico. Na realidade, não só ela se sente confortável em falar e buscar seu prazer, indo de um cara para o outro, como ela é genuinamente feliz sozinha. Porém, suas crenças são colocadas à prova quando ela conhece o médico esportivo Aaron (Bill Hader), um galã no melhor sentido da expressão, que pela primeira vez rouba da boêmia todo seu charme.
Com ótimas participações, como um dos primeiros papéis de John Cena no cinema e LeBron James fazendo as vezes de melhor amigo do mocinho, Descompensada traz ingredientes bastante tradicionais das rom-coms, mas com um toque de irreverência. E, eu prometo, você também vai se apaixonar pelo Bill Hader — se é que você já não é!
DORMINDO COM AS OUTRAS PESSOAS (2015)
Dormindo com as Outras Pessoas/IFC Films/Reprodução
Disponível para stream no Pluto TV.
Algumas dinâmicas foram, são e sempre serão irresistíveis em qualquer comédia romântica. Então, Dormindo com as Outras Pessoas larga já com a vantagem de ter no seu cerne dois amigos resistentes à ideia de se tornarem um casal. No entanto, aqui não se trata tanto de capricho ou o clássico medo de "estragar a amizade". Na verdade, tanto Jake (Jason Sudeikis), quanto Lainey (Alison Brie) têm bons motivos para sua hesitação: à sua maneira, eles são pessoas complicadas e pouco confiáveis quando o assunto é relacionamento. Curiosamente, é essa inaptidão de ambos que cria a oportunidade perfeita para que aprendam juntos.
Bem longe da persona idealizada de Ted Lasso, Sudeikis estabelece com Brie um magnetismo que é difícil de colocar em palavras. Na troca de olhares, entre mancadas e lampejos de romantismo, ambos demonstram o quão especial pode ser acompanhar duas pessoas tão caóticas, específicas e borbulhantes se encontrarem.
DOENTES DE AMOR (2017)
Doentes de Amor/Amazon Studios/Reprodução
Disponível para stream no Prime Video.
Transformar a sua própria história de amor em uma comédia romântica seria uma ideia tosca e desinteressante se os roteiristas Emily V. Gordon e Kumail Nanjiani revisitassem seu passado munidos dos bons e velhos clichês. Isso porque, por mais que as tropas sejam populares por uma razão, não há meet-cute capaz de competir com a voz sensível, afiada e original do casal, conforme narram um dos momentos mais dramáticos do seu relacionamento.
Chega a ser impressionante que, mesmo dando o peso devido para cada uma das turbulências que encontram pelo caminho — seja as causadas pela quebra de expectativas de suas famílias, seja pelo risco inegável que Emily correu —, Doentes de Amor seja capaz de um riso tão leve. É lindo ver como, no filme, Kumail coloca o término prematuro em perspectiva através de uma espécie de cortejo atrapalhado aos pais da ex-namorada. Ou, ainda, como finalmente se questiona sobre onde se encaixa na tradição. E tudo isso sem desperdiçar a chance de uma boa piada. É apaixonante justamente por ser tão real.
PARA TODOS OS GAROTOS QUE JÁ AMEI (2018)
Para Todos os Garotos que Já Amei/Netflix/Reprodução
Disponível para stream na Netflix.
O primeiro filme da trilogia Para Todos os Garotos talvez seja o mais próximo de uma interpretação literal da expressão "como antigamente" do título desta lista. Afinal, ele toma emprestado o clima das obras de John Hughes para contar a fofa história de Lara Jean (Lana Condor), uma adolescente apaixonada por romances que adoraria ter um para chamar de seu. É verdade que o fato de um punhado de cartas ser o gatilho para esta aventura já traria um charme particular, que só o analógico é capaz de dar. Mas Condor é uma presença carismática, que colore os dilemas teens clássicos e serve como um bom contraponto à energia de labrador de Noah Centineo. Por isso, mesmo que o restante da série tenha sido frustrante, o longa que a inaugurou ainda é bastante adorável.
CASAL IMPROVÁVEL (2019)
Casal Improvável/Summit Entertainment/Reprodução
Disponível para stream na Globoplay.
Outra convenção clássica e apaixonante das rom-coms é unir duas pessoas que, à primeira vista, não poderiam parecer mais diferentes, e Casal Improvável sabe muito bem disso. No entanto, como se a ideia de ver Charlize Theron e Seth Rogen como um casal já não fosse curiosa o suficiente, o filme dá um passo além e os coloca interpretando uma candidata à Presidência dos Estados Unidos e um jornalista desempregado, que não se viam desde que ela parou de trabalhar como a babá dele.
A premissa pode soar exagerada e, talvez, até arriscada. Afinal, em qualquer outra situação, as chances da história descambar seriam grandes. Felizmente, porém, tudo estava muito alinhado aqui. Não só os dois protagonistas estavam em perfeita sintonia — Theron com um timing cômico notável, e Rogen com uma ternura até então pouco explorada nas suas comédias —, como o absurdo da trama, com atentados e negociações sob efeito de substância, só tornaram tudo melhor. Em resumo, por mais adorável que Casal Improvável possa ser, nada supera seu humor. Sem exageros, é de chorar de rir.
CONVIDADO VITALÍCIO (2019)
Convidado Vitalício/RLJE Films/Reprodução
Disponível para stream na HBO Max.
Mais cedo ou mais tarde, o solteiro passará por aquela fase em que todos seus amigos estão se casando e será preciso responder: você vai sozinho ou acompanhado? Para a sorte de Ben (Jack Quaid) e Alice (Maya Erskine), dois antigos colegas de faculdade, eles têm um ao outro para enfrentar a maratona de festas e, quem sabe, até agitar um novo crush. Porém, o que parecia um acordo prático, dado o grau de intimidade e honestidade entre os dois, vai ficando mais turvo a cada novo casório. Seria possível rolar entre eles outro sentimento além do companheirismo?
Já era esperado que Quaid trouxesse charme para a rom-com. Agora, é realmente notável como Erskine transborda carisma e rouba a cena. Juntos, a dinâmica de amigos a amantes fica irresistível e torna Convidado Vitalício, no mínimo, uma grata surpresa. Vale conferir!
PALM SPRINGS (2020)
Palm Springs/Hulu/Reprodução
Disponível para stream no Star+.
Um toque de ficção científica nunca fez mal a ninguém. Nem mesmo em uma comédia romântica como Palm Springs, que se propõe a brincar com a já tradicional dinâmica do Dia da Marmota. Aliás, pelo contrário: chega a ser louvável como até a repetição desse tropo ganha frescor na história de Nyles (Andy Samberg) e Sarah (Cristin Milioti), dois convidados de um casamento que se vêem revivendo o dia da cerimônia de novo e de novo. E, veja, isso acontece não só porque os protagonistas são perfeitamente cativantes nos seus papéis, mas porque a frustração do looping nunca cai no cinismo — fato especialmente importante se você lembrar que este é um lançamento da pandemia. O filme é, no pior, agridoce. Mas, no geral, trata-se de uma aventura engenhosa, engraçada e otimista sobre a natureza humana.
VOLTA PRA MIM (2022)
Volta Pra Mim/Prime Video/Reprodução
Disponível para stream no Prime Video.
Originalmente, Peter (Charlie Day) e Emma (Jenny Slate) recorreriam um ao outro para tentar superar seus respectivos términos. A ideia era que, em vez de perseguir e examinar minuciosamente os posts dos seus exs, eles pudessem ser maduros e seguir em frente depois de sucessivas sessões de desabafo um com o outro. Acontece que maturidade não era necessariamente o forte deles quando Volta Pra Mim começa. Por isso, tão logo formam seu singelo grupo de apoio, lhes ocorre o plano de ferrar os novos namoros dos seus antigos parceiros. Era, afinal de contas, o jeito perfeito de demonstrar como eles nunca deveriam ter terminado. Certo?
O esquema é mirabolante e, não à toa, um prato cheio para os atores carismáticos. Tanto Day, quanto Slate sabem tirar proveito dos altos e baixos dessa relação quase doentia, mas que no fundo conduz seus personagens pelas jornadas necessárias, que ambos negaram por anos. É bonita e reconfortante em todo seu caos, e é mais um exemplo de como mesmo as dinâmicas mais clássicas das rom-coms não precisam soar batidas.
FIRE ISLAND (2022)
Fire Island/Searchlight Pictures/Reprodução
Disponível para stream no Star+.
A menção a Jane Austen no início de Fire Island não é nada banal. Isso porque, mais do que pontuar o romantismo tímido do protagonista de Joel Kim Booster, a rom-com é, no fundo, uma releitura de Orgulho e Preconceito. A diferença é que em vez de ser ambientado na calmaria do sul da Inglaterra, a história transcorre em uma ilha conhecida por festas, bebidas e sexo. E em vez da dinâmica familiar mais convencional dos Bennets, aqui ela é trabalhada de forma adorável dentro do contexto LGBTQIA+.
Como outras comédias românticas que a antecederam — caso de 10 Coisas que eu Odeio em Você e As Patricinhas de Beverly Hills —, Fire Island sabe adaptar muitíssimo bem um clássico literário ao mundo contemporâneo. Ou seja, é um filme que mantém a essência do material-base, na mesma medida que adiciona camadas de especificidades que a tornam especial. E, se tratando de uma tradicional trama de inimigos a amantes, você sabe que vai assistir a uma ótima história de amor. Até porque Booster e Conrad Ricamora têm química de sobra!
FRESH (2022)
Fresh/Searchlight Pictures/Reprodução
Disponível para stream no Star+.
Eu sei, eu sei! Chamar Fresh de comédia romântica é alargar e muito a definição do gênero — e, pior, ignorar que esta não é uma história de amor, mas sim uma sucessão de crimes absurdos, em que mulheres são vitimadas por canibais. No entanto, a razão pela qual o filme funciona tão bem passa pela forma como a diretora Mimi Cave e roteirista Lauryn Kahn sabem brincar com as expectativas do público. Os primeiros 30 minutos pegam emprestados artifícios das rom-coms, como os adoráveis meet-cutes e as montagens de começo de relacionamento, para esconder à vista de todos o que está de fato por trás do relacionamento de Noa (Daisy Edgar-Jones) e Steve (Sebastian Stan) — tanto é assim que as linhas ficam tênues até para o vilão. Quer dizer, Fresh é um filme aterrorizante inclusive no seu charme. Quer jeito mais fora da curva de comemorar esse Dia dos Namorados?