Cristin Milioti em cena de Pinguim (Reprodução)

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Pinguim fala de abuso institucionalizado em 4º episódio sufocante

Série da DC muda de tom - mas não abandona o operático - ao fazer flashback de Sofia

13.10.2024, às 23H30.
Atualizada em 14.10.2024, ÀS 10H04

ATENÇÃO: Spoilers de Pinguim a seguir!

Saber quando trocar de diretor é uma virtude essencial e rara para séries de TV contemporâneas - especialmente diante da forma como tantas produções televisivas, na ânsia de se aproximar do cinematográfico, abraçam a ideia da unificação sob uma visão estética singular. Mas TV não é cinema, não importa o quanto você tentar fazê-la parecer, e no decorrer de oito, dez, vinte horas de história, qualquer série vai se estrangulando na repetição de ideias e cacoetes de um único diretor. Pinguim, nesse sentido, mostrou timing impecável ao trocar (o excelente) Craig Zobel por Helen Shaver no quarto capítulo.

Shaver, veterana da televisão (Station Eleven, Vikings, Lovecraft Country, Westworld, Anne with an E estão entre seus créditos mais recentes), traz para o episódio, batizado de “Cent’Anni”, uma urgência e um senso de espaço que faltava às aspirações estetizantes mais elevadas de Zobel. Ela usa muito mais câmera na mão do que seu colega, por exemplo, por vezes escondendo a lente por trás de paredes e objetos de cena para transmitir a sensação de que estamos espiando um momento talvez íntimo demais, que não deveria ser registrado dessa forma. Funciona, principalmente, porque “Cent’Anni” é um exercício em sufocamento dramático.

O roteiro de John McCutcheon (A Roda do Tempo) se concentra em contar a passagem de Sofia Falcone (Cristin Milioti) pelo Asilo Arkham, em formato de um longo flashback que ocupa mais da metade do episódio, a fim de que entendamos melhor as atitudes drásticas que ela toma no presente - a saber: Sofia decide matar quase toda a família Falcone e começar um novo império do crime com o nome de solteira da sua mãe, Gigante. De concreto para o plot criminal da temporada de Pinguim, o episódio tem muito pouco, mas o trabalho que ele faz de fundação de personagem e aprofundamento temático é inestimável, o que significa que muito do seu fator de entretenimento depende mesmo da direção.

Conforme mergulha em mais uma versão dos abusos institucionalizados do Asilo Arkham, a série se esquiva da tentação de repetir o exagero gótico de outros retratos do local no cinema e na TV, optando por um equilíbrio mais fino entre o operático que definiu sua adaptação do universo Batman (Shaver ainda arranca takes quadrinescos das sessões de eletrochoque de Sofia, por exemplo) e uma denúncia contundente dessa situação que, de fantasiosa, tem muito pouco. E Milioti, é claro, ajuda a sustentar ambos os lados dessa balança, esticando os músculos para além da fragilidade rígida na qual fundou sua Sofia e desenhando um arco muito claro de sua transformação trágica em algo parecido com uma supervilã.

Nesse pique de história de origem com respaldo dramático, “Cent’Anni” prova que Pinguim sabe quando mudar de tom, como manter a coerência entre suas partes, e que consegue segurar o público mesmo quando chega a hora de apertar o pause e considerar algumas coisinhas importantes - ou seja, prova que ela é uma ótima série de TV.