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O que podemos esperar do revival de Sex and the City?

Nova leva de episódios terá que lidar com ausência de Samantha e equívocos do passado

11.01.2021, às 18H29.
Atualizada em 28.02.2024, ÀS 00H48

Para o mundo da cultura pop, a volta de Sex and the City anunciada pela HBO Max foi a primeira grande notícia de 2021, para o bem e para o mal. Existe uma grande parcela dos fãs que se jogarão sem medo nesse revival, chamado de And Just Like That..., mas uma outra parcela (provavelmente a maior) reagiu ao anúncio com muita hesitação. As protagonistas Sarah Jessica Parker, Cynthia Nixon e Kristin Davis divulgaram o retorno em suas redes, reforçando que serão apenas elas a voltar e sacramentando a ausência de Kim Catral depois de uma série de desentendimentos entre ela e Sarah Jessica. Isso levantou a grande pergunta: mas... e Samantha?

Sex And The City terminou em 2004 no seu auge. Foram seis temporadas (uma delas bem menor, por conta do 11 de Setembro) de muito sucesso, muitos prêmios e o reconhecimento de uma quebra de barreiras muito importante. Alguns anos depois veio o primeiro filme, que reforçou o quanto a série permanecia no imaginário das pessoas. O segundo longa, contudo, foi bem mais controverso. A viagem ao Oriente Médio ficou no limite do mau gosto, e mesmo que Michael Patrick King (o roteirista principal) tenha um talento inegável para contar histórias divertidas, o filme foi duramente criticado e parecia ter encerrado a carreira da franquia.

Sarah Jessica Parker e King queriam um terceiro filme para encerrar de vez a história das personagens, e começaram a negociar a produção. Aqui, então, acontece a ruptura definitiva. Kim Catral, que vivia Samantha, afirmou que nunca aceitou participar do terceiro longa. Já nomes envolvidos no elenco (como Willie Garson, que vivia Stanford) contavam outra história. Supostamente houve uma recepção positiva de Kim ao filme, mas que foi por água abaixo quando ela não conseguiu que seus projetos pessoais também fossem aprovados. Quando essas notas começaram a vazar, Kim acusou Sarah Jessica de difamação e cortou relações com ela publicamente por meio de uma postagem no Instagram, quando Sarah tentou lhe prestar condolências pela morte do irmão. 

Uma tensão entre Sarah e Kim já era notória desde quando a série estava no ar. Samantha era a personagem mais popular, mas Carrie era a protagonista. Isso, ao que parece, foi parte do que teria iniciado os problemas. De fato, a posição de Sarah como produtora também foi determinante para o aumento dessa tensão, já que Kim era cada vez mais exposta na série, enquanto Sarah tinha autoridade para se proteger. Na verdade, todas as outras atrizes fizeram, por exemplo, cenas de nu, enquanto Carrie nunca nem apareceu sem sutiã. O que antes eram só questões contratuais foi virando toxicidade (ao menos para uma das partes). Curiosamente, a imprensa abraçou a narrativa de Kim, ignorando que Cynthia e Kristin (junto com todo o resto do elenco coadjuvante) ficaram do lado de Parker.

Sex And The Others

A ideia de um terceiro filme ficou esquecida por um bom tempo. Sarah Jessica, contudo, disse no programa de Ellen Degeneres que havia um período de “luto” que precisava ser respeitado e então, se houvesse interesse da HBO, eles poderiam estudar a possibilidade. Houve muitas brincadeiras sobre quem poderia assumir o lugar de Kim, com a própria Kim declarando que talvez fosse a hora de Samantha ser vivida por outra pessoa, uma “atriz não branca”, por exemplo. O retorno da série poderia ser, enfim, uma incrível oportunidade para corrigir aspectos da própria dramaturgia que, olhando para trás, são tão problemáticos.

O primeiro filme, por exemplo, tentou melhorar a representatividade étnica trazendo para o elenco Jennifer Hudson. A personagem dela era carismática, tinha uma química ótima com Carrie, mas ainda era a “secretária da branca privilegiada”. Agora seria a oportunidade perfeita para trazer Louise de volta, se aproximando mais das outras meninas e, quem sabe, fazendo parte do quarteto. Não no lugar de Samantha, com a personalidade de Samantha, mas como um novo elemento, uma nova voz.

Quando Sex and The City estreou, em 1998, ela foi – junto com The Sopranos – a série que abriu as portas para a Terceira Era de Ouro da Televisão. Mesmo que hoje haja uma discussão legítima sobre muitos dos equívocos de abordagem que ela ainda não tinha maturidade para vislumbrar, a existência da série (mesmo ali, num canal a cabo, com protagonistas brancas e endinheiradas) apresentou uma abordagem da mulher em cena que nunca tinha sido trabalhada. Antes de Sex and the City, a personagem feminina na TV era a esposa dedicada ou a desajeitada cômica. Qualquer tentativa de contornar isso era proibida. Madonna, inclusive, estava sendo massacrada na mesma época por falar da mulher que abraçava e usava a própria sexualidade.

Mulheres não podiam falar de sexo abertamente e todas as acusações sobre a representação “fútil e superficial” do quarteto também acabam sempre esbarrando na proibição de uma figura feminina que possa ter força e vaidade, que possa ser independente e romântica, sem ser julgada por isso. Mas, ainda assim, houve equívocos, e um retorno pode significar a oportunidade para melhorar tópicos problemáticos que poderiam tornar a série anacrônica nos dias atuais, a despeito dos avanços que promoveu à época, mais de 20 anos atrás.

Samantha

Até que o revival seja colocado em prática, as perguntas sobre Samantha devem ser evitadas por todos os envolvidos. Logo depois do cancelamento do terceiro filme, um suposto roteiro foi vazado para a internet e nele, Mr Big (Chris Noth) morria, levando as personagens a discutirem o luto. Essa é, inclusive, a primeira e mais comentada opção para o futuro: matar Samantha. A personagem teve um câncer na sexta temporada e ele pode ser usado como um meio para esse desfecho.

De certa forma, assumir que a personagem estará ausente pode ser a alternativa menos prejudicial para o andamento da história. Desculpar essa ausência com uma viagem ou promover uma substituição da atriz pode provocar uma rejeição ainda maior (Samantha até já foi vivida por outra atriz, na série The Carrie Diaries, numa versão mais jovem feita com apuro por Lindsey Gort). O fato é que não importa o que aconteça, ninguém estará 100% satisfeito e os roteiros precisarão ser ainda melhores para que o público "esqueça" essa perda.

Se a saída de Kim não tivesse sido do jeito que foi, a recepção provavelmente seria outra. Na vida real, grupos de amigos sofrem perdas o tempo todo, e isso é completamente natural. O problema é que haverá sempre uma associação inevitável com a polarização que a briga entre Sarah e Kim provocou. Samantha era a ousadia, a liberdade, e como fazer para evitar que a morte da personagem não soe como a morte de tudo que ela representava? Isso é um trabalho para Michael Patrick King. Se vai dar certo ou não, não importa. Sex And The City: And Just Like That..., será um dos grandes lançamentos de 2021, sem nenhuma sombra de dúvidas.