Kang Daniel, Joy do Red Velvet e Taeyeon (Reprodução/Montagem Omelete)

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Os 10 melhores álbuns de k-pop de 2022

Kang Daniel, Dreamcatcher e Red Velvet estiveram entre nossos favoritos do ano

22.12.2022, às 16H11.
Atualizada em 12.06.2023, ÀS 09H17

Mais um ano, mais uma vez em que a indústria musical sul-coreana deu aula de como fazer pop para nós, ocidentais. Não que 2022 tenha sido particularmente brilhante para os padrões do k-pop: a dominação da tendência emo-rock atingiu o ponto de saturação muito antes de os produtores coreanos perceberem; o sumiço de artistas importantes como o Everglow, o SHINee e o EXO deixou um buraco que foi pouco preenchido; e favoritos como Purple Kiss, TWICE e Tomorrow X Together tiveram anos, digamos… de altos e baixos.

Mesmo assim, a prolixidade dos coreanos se provou frutífera como sempre - se você faz tanta música, com certeza vai fazer muita música boa. Diante de um ano frio no pop cantado em inglês, fica o convite: venha se aconchegar no abraço quentinho e familiar dos 10 melhores álbuns de k-pop de 2022, conforme escolhidos pelo Omelete.

10. Chung Ha - Bare & Rare Pt. 1

Em 2021, Chung Ha lançou Querencia, um megalomaníaco projeto de 21 faixas e 1h de duração, que construía a sua musicalidade em um pêndulo constante entre hip hop desavergonhadamente plastificado e dance music de produção audaciosa. Era um disco com muitos pontos brilhantes, mas inevitavelmente inconstante - e é por isso mesmo que Bare & Rare foi uma surpresa tão positiva em 2022. Com suas oito faixas (para ser justo, ele vem com um Pt. 1 colado ao título, o que significa que devemos esperar continuações no futuro), ele é preciso, consistente e tão deliciosamente expressivo quanto o predecessor.

O rap comercial continua sendo parte integral da identidade de Chung Ha como artista, encontrando sua melhor expressão na climática parceria com BIBI em “Crazy Like You”, com sua batida calibrada à perfeição para as vozes das duas artistas. Ela estende suas garras, no entanto, para lugares até então inéditos: o single “Sparkling” é um épico dançante de verão, completo com um gancho melódico (literalmente) refrescante; “Love me Out Loud”, enquanto isso, mostra que Chung Ha sabe criar - e produzir, com suas batuques apoteóticos e guitarras sintetizadas - música para a pista de dança com peso emocional.

O melhor de tudo: a faixa final do disco, “Nuh-Uh”, deixa aquele gostinho de quero mais com sua melodia flutuante indefectível, percussões e estalos de dedo que remetem ao R&B contemporâneo ocidental. Nada como uma boa auto edição.

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9. Ha Sungwoon - Strange World

Após alguns álbuns esbarrando em ideias interessantes (“Strawberry Gum”, “Electrified”), mas tropeçando para encontrar a sua identidade, Ha Sungwoon parece ter decidido jogar todas as suas fichas em Strange World, um disco muito mais representativo do seu talento e carisma. Pudera: este foi o último lançamento do solista antes de se alistar no serviço militar sul-coreano, e o impulso de deixar uma impressão forte no público (falar de “legado” é complicado para um artista que fez sua estreia solo em 2019) parece ter alimentado a criatividade dele e de seus colaboradores.

Strange World tem de tudo: um pouco do Sungwoon que embarca no groove das linhas de baixo e constrói melodias pop perfeitinhas por cima delas, especificamente no single “Focus”, complementado por um gancho assobiado; um pouco do Sungwoon que deixa o seu timbre suave voar por cima de batidas R&B calculadas, na excelente “Baby Blue”; um pouco do Sungwoon sorridente e sonhador de “Sneakers”, na simpática “Say Yes”; e até um pouco do Sungwoon influenciado pelo mambo em “Too Little Too Late”, parceria com Jamie.

A abordagem caleidoscópica funciona. Nos lembrando da desenvoltura de cada uma dessas facetas, Sungwoon dá as costas para a primeira fase da carreira deixando os fãs com saudades de todas elas.

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8. Kang Daniel - The Story

2022 marcou a estreia de Kang Daniel como ator, na série Rookie Cops (inclusive, disponível no Brasil pelo Star+), e é curioso observar como essa nova ambição de carreira de um dos maiores astros solo do k-pop atual se traduz no álbum que ele lançou no mesmo ano, The Story. É verdade que a música de Daniel sempre teve um quê de teatral - “Paranoia” não nos deixa mentir, né? -, mas a preocupação do novo disco com a dramaticidade das composições, videoclipes e coreografias eleva essa característica do artista a outro nível.

Daniel está sempre em busca de criar um mood no The Story. Na espetacular “Parade”, niilismo e ressentimento geracional se unem em uma elegia melodicamente hipnotizante ao vai-e-vem esmagador dos dias úteis. Em “Nirvana”, os sintetizadores ricamente texturizados, que fazem a canção de Daniel se aproximar da deep house dos colegas de k-pop SHINee, evocam um romance urbano intoxicante. A canção-título, “The Story”, emprega violões por cima da produção computadorizada para aproximar Daniel da figura do trovador pop, abrindo o seu coração e as suas angústias para o ouvinte.

Dono da própria gravadora e voz ativa na composição de seus discos, ele sabe muito bem como construir sua imagem - o trunfo de Daniel, além da voz expressiva e da presença indelével nos palcos, é saber equilibrar ambição artística e mercadológica. É uma história e tanto para se contar.

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7. ONF - Storage of ONF

Nem durante o serviço militar obrigatório de cinco de seus seis integrantes (o único poupado foi U, de nacionalidade japonesa) o ONF deixou de ser um dos grupos de k-pop mais inovadores, interessantes e surpreendentes da indústria. A começar pela própria existência de Storage of ONF, lançado mais de oito meses depois do alistamento dos membros, um período em que a maioria dos grupos fica totalmente inativo - saber que os cantores deixaram material pronto para lançamento neste momento sublinha a inteligência com a qual o ONF conduz a carreira.

Mais do que isso, no entanto, o Storage of ONF chegou para nos lembrar da versatilidade e excelência dos artistas que compõem o grupo. Vide os pacotes de cordas de “Runaway”, o melhor épico disco de um ano que deixou um pouco o subgênero de lado; os vocais sentidos da balada bossa nova “Traveler” (o tom esganiçado de MK brilha mais uma vez); a paulada eletropop de “Gucci”, com seu refrão atrevido levado pelos rappers do grupo; o piano-voz-e-cordas à la Broadway de “Your Song”, que inclui uma queda de ritmo audaciosa para a entrada de versos de hip hop.

Que saudades do ONF, e da energia caótica temperada com competência que eles trazem para o k-pop - ainda bem que não precisamos passar o ano sem ela.

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6. Brave Girls - Thank You

Desde os primeiros segundos de Thank You, com aquela virada de baixo que abre a faixa-título, as Brave Girls mostraram que estão aqui para se solidificar como a resposta coreana para Kylie Minogue. O que elas fazem é simples - mas, paradoxalmente, poucos conseguem fazer tão bem: música pop divertida e otimista, com sensibilidade camp afinadíssima ao público millennial (e além)nostálgico, feita para rasgar as pistas por aí com os passos de dança mais ultrapassados que você conseguir conjurar.

Nesse sentido, Thank You é até melhor do que a investida anterior do quarteto, Summer Queen (que apareceu na nossa lista de 2021), substituindo a evocação praiana dele por uma paisagem francamente noturna e por um som tão sofisticado quanto variado. É tudo disco music, é claro, mas as Brave Girls modulam o subgênero a várias influências analógicas: do flamenco de “Love is Gone” (a “Don’t Let Me Be Misunderstood” delas) ao kitsch mais tradicionalmente asiático de “Can I Love You”, uma balada de karaokê turbinada por sintetizadores e bateria eletrônica. 

Thank You é um disco vívido, irresistível justamente por ser feito com cuidado, talento e jubilação deliciosamente óbvios.

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5. HYO - Deep

Se você tira prazer do que ama e do que é seu sem se importar com os padrões dos outros, o que você ama se torna o padrão do mundo. Este é o meu poder, que ninguém deveria subestimar”. A declaração estampada na capa do Deep, ainda que soe como regurgitação de refrões de autoajuda, descreve muito bem o charme idiossincrático do disco de HYO, a bem da verdade uma coleção de singles lançados entre 2018 e 2021, com a adição de duas músicas inéditas: as mega produzidas bombas eletro “Deep” e “Stupid”.

Já em trechos de “Stupid”, no entanto, a integrante do Girls’ Generation mostra outro lado de sua personalidade: a rapper gonzo à la Gwen Stefani, que sai para brincar em “Second” e “Dessert”, parcerias com BIBI e Soyeon, respectivamente - não por acaso, dois dos nomes mais destacados do hip hop coreano. Esses lados paralelos de HYO são conjugados com resultados espetaculares em “Punk Right Now”, que ainda adiciona um saborzinho tropical à batida para colocar a cereja no bolo de uma das receitas pop mais anárquicas e deliciosamente dançantes do ano.

Parece que ser genuína compensa, no fim das contas.

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4. Dreamcatcher - Apocalypse: Save Us

Na contramão dos álbuns enxutos e rápidos do k-pop contemporâneo, o Dreamcatcher fez do seu Apocalypse: Save Us uma obra robusta de 14 faixas e 44 minutos, o que deu espaço para as elaborações de gênero cuidadosas do grupo brilharem. E esta não é uma aposta segura, tampouco: conhecido por sua aproximação com o rock e frequentemente comparado com artistas ocidentais como o Nightwish e o Evanescence, o Dreamcatcher surpreende com um disco voltado mais para as sessões de sopro do jazz do que para as guitarras do metal.

Basta olhar para a primeira faixa completa do Apocalypse: Save Us, “Locked Inside a Door”, para entender como o grupo faz essa transição. Embora espertamente pontuada por viradas de guitarra e bateria, a canção é estruturada em torno de versos rápidos levados com fraseamento soul pelas integrantes, construindo uma mistura curiosa de swing e hardcore que cai muito bem aos ouvidos. O jazz volta à pauta na segunda metade do álbum, nos excelentes solos de Handong (“Winter”), Yooheon (“For”) e Gahyeon (“Playground”), enquanto o Dreamcatcher capitaliza de forma tipicamente certeira no revival do pop punk com o solo de Dami (a curiosamente otimista “Beauty Full”).

Neste álbum épico, digno dos hinos de arena do Dreamcatcher, ainda sobra espaço para fazer dançar (vide “Starlight” e “No Dot”, solo de Su A). Uma refeição completa servida por chefs de talento comprovado.

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3. Taeyeon - INVU

Nada como um aniversário de carreira para fazer um artista olhar para trás e avaliar o seu legado com outros olhos, não é mesmo? Assim como o grupo que lidera, o Girls’ Generation (que quase entrou nessa lista com “Forever 1”), Taeyeon completou 15 anos de estrada em 2022, comemorando com o lançamento do álbum INVU, uma obra surpreendentemente preocupada com sintetizar as influências e apelos da cantora em um pacote (relativamente) compacto de 13 canções.

As baladas pop rock melódicas como “Set Myself on Fire” e “No Love Again” estão aqui para lembrar o status de Taeyeon como rainha teen, emulando (as melhores) canções de Taylor Swift ou Demi Lovato. A faixa-título e a explosão disco “Weekend” a posicionam como hitmaker das pistas de dança, com os sintetizadores etéreos, aproximados do dream pop, como assinatura. “Toddler” e “Cold as Hell” lembram, com sensualidade e aspereza - respectivamente -, que Taeyeon cresceu nos holofotes e ganhou o direito de trazer ideias mais maduras para sua música.

Aos nossos olhos, enfim, INVU não é o melhor álbum do ano, mas o tempo pode muito bem provar que ele foi o mais historicamente significativo.

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2. Onew - Dice

No ano passado, Key traduziu o coração machucado da new wave para o século XXI com o insuperável Bad Love, nosso disco de k-pop favorito de 2021. Este ano foi a vez do colega de Key no SHINee, Onew, completar a dicotomia essencial da música pop oitentista com o seu Dice, uma explosão ensolarada e otimista de sintetizadores aéreos que casam perfeitamente com o timbre potente, expansivo e expressivo do cantor.

Do primeiro “tasty pronunciado por Onew no faixa-título, toda interpretada com o tom sonhador de um amor recém-nascido, Dice se recusa terminantemente a encarar qualquer realidade que deixe o seu astral cair. “Sunshine” cita drinques tropicais na letra e empresta seus sintetizadores analógicos de “Rio”, do Duran Duran; “On the Way” insere uma linha de baixo irresistível e toques de violão graciosos por baixo de uma melodia viajante; “Love Phobia” até passa mais perto de uma sensibilidade mais angustiada, mas seu R&B motivado e envolvente é balanceado por uma produção etérea; e até as baladas “Yeowoobi” e “In the Whale” evocam uma melancolia contemplativa, mas jamais amarga.

O resultado, claro, é uma obra muito coerente em si mesma, mas também uma obra que lança um feitiço no ouvinte que não se quebra durante preciosos 20 minutos de escapismo musical.

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1. Red Velvet - The ReVe Festival 2022: Birthday

Quando o k-pop acerta no nível de The ReVe Festival 2022: Birthday, só resta ao ouvinte reclinar na cadeira e abrir um sorriso - ou se jogar na pista de dança. Após fazerem acenos à música clássica e a uma sensibilidade melódica mais madura em “Feel My Rhythm”, as meninas Red Velvet parecem se lembrar do jogo que estão jogando: Birthday carrega o mesmo impulso, mas o aborda com muito mais energia e criatividade.

O single “Birthday” novamente traz um sample clássico (“Rhapsody in Blue”, de George Gershwin), mas pega pesado na batida soul e deixa as vocalistas mais fortes do grupo voarem por cima de uma produção de sintetizadores completa. Ela deságua na melodramática “Bye Bye”, que por sua vez leva à brincalhona “On a Ride”, depois à teatral “Zoom”, e por fim à simpática “Celebrate”. São canções que nunca perdem de vista a competência brutal das artistas, a sua capacidade adquirida de passear por melodias e gêneros sem tropeçar ou causar estranheza, mas são também pérolas de alquimia pop que funcionam para além do contexto da afirmação mercadológica.

Esse encontro de ambição artística, liberdade criativa e consciência comercial é o que faz do k-pop um universo tão fascinante para ouvintes letrados ou ocasionais. A ideia é sempre conhecer as regras do jogo para saber quando infringí-las - elemento de crime -, e o Red Velvet mostrou que lembra como fazer uma partidaça em Birthday.

Ouça completo.

Menções honrosas (música asiática)

Quem já mergulhou na cultura da música asiática sabe: é impossível parar só na indústria do k-pop. Embora as grandes gravadoras e suas contrapartes menores lancem uma enxurrada de boa música pop todos os anos, os outsiders da indústria (sem falar na efervescente cena hip-hop e R&B do país) também têm muito valor, e o impulso para ouvir produções japonesas, chinesas, tailandesas é irresistível uma vez que a “bolha” ocidental está furada. Por isso, aqui vão alguns destaques que não encaixam exatamente nessa lista, mas merecem ser lembrados.

Impossível não destacar, por exemplo, o trabalho sentido de Baek Yerin no folk-rock intrincadamente melódico de Pisces (o single e o disco); o retorno dos veteranos hip hop do Epik High com o belamente lírico Epik High is Here (Part 2); o jazzístico primeiro disco completo da talentosíssima rapper BIBI, Lowlife Princess: Noir; a ousadia dos japoneses do JO1 com o álbum Midnight Sun e o single “SuperCali”, baseado em um sample de Mary Poppins; e a narrativa envolvente e musicalmente eclética da chinesa G.E.M., com o seu álbum audiovisual Revelation (veja os clipes e ouça o disco).

Faixa bônus: Tudo em um só lugar ao mesmo tempo

Na playlist acima, você confere uma faixa destaque de cada um dos álbuns que selecionamos no nosso ranking - e mais alguns ainda. Divirta-se!