Anime Under Ninja

Mangás e Animes

Crítica

Under Ninja encontra ordem no caos que seu próprio enredo criou

Primeiro ano do anime é marcado por aleatoriedade, mas as ideias estão no lugar certo

23.01.2024, às 13H40.

Sedutora e contemporânea, a primeira temporada de Under Ninja chama a atenção antes de tudo por sua premissa: os bastidores de um mundo onde ninjas ainda existem na atualidade e somam centenas de milhares espalhados pelo Japão — um deleite para os millennials otaku formados por Naruto. Divididos em duas organizações rivais, eles digladiam nas sombras, cumprindo missões tidas como impossíveis. Para além da premissa, o anime baseado na obra de Kengo Hanazawa não se conforma em tecer um trama simples de rivalidade e aborda conceitos mais sofisticados e eventualmente aleatórios, que levam alguns episódios para se encaixar.

Na série, conhecemos o misterioso protagonista Kuro Komogakure, um jovem de poucos amigos que não parece ter emoções. Quase tão calculista quanto um robô, o personagem é membro da organização NIN e recebe a missão de se infiltrar em um colégio onde estão membros da facção adversária, a Under Ninja. E assim, com rixas de escola e duelos mortais, o anime constrói uma jornada entre dois mundos, na qual o protagonista oscila entre a trivialidade cômica da vida colegial e a ferocidade angustiante da guerra ninja.

Esse esquema seria o bastante para elaborar situações capazes de sustentar uma narrativa cativante, mas Under Ninja vai além do humor do cotidiano e da ideia dos deslocamentos. O anime decide se levar mais a sério e parte então para juntar conceitos que, no acumulado, perigam soterrar a trama. Detalhes como a motivação das organizações ninja, bem como a extensão de seu poderio militar, não são aprofundados; no lugar dessas explicações, Under Ninja adiciona à receita flertes com o scifi, em elementos como a transferência de consciência humana para animais e bebês.

Ainda assim, o anime consegue minimizar algumas dessas pontas soltas ao longo de seus 12 episódios — enquanto cria outras menores e as descarta sem mais alardes. Detalhes como o subsolo do colégio sendo usado pelo crime organizado e o passado da personagem Mitsuki Yamada, que foi de it girl problemática a assassina profissional em um piscar de olhos, são meramente ilustrados por algumas rápidas cenas. Isso faz com que o anime dependa mais do arco narrativo do seu protagonista, e a temporada se mostra meio sem rumo quando se afasta demais de Komogakure.

Por outro lado, a temporada oferece boas reviravoltas dentro dessa multiplicidade de temas, e consegue fechar ciclos antes que eles se arrastem demais. Um exemplo são os momentos finais, quando o anime revela o parentesco entre o personagem Shion Hachiya e os chefões da NIN; outro, quando vemos personagens secundários serem descartados conforme perdiam seu propósito narrativo. Essas escolhas deixam na dúvida se os fatos são uma preparação para uma grande virada de chave futura ou se tudo não passa de distração.

Mas enquanto a trama parece se perder no roteiro, ela acha seu lugar na animação do estúdio Tezuka Productions. O trabalho do diretor Satoshi Kuwabara se destaca ao longo dos episódios, que destacam a trivialidade do mundo “real”, afinal transformado pelo âmbito fantástico da realidade dos ninjas. Com as cores de Yumi Aburaya, as casas, os personagens e até a cerveja ganham um toque mais realista e humano, fazendo do slice of life do anime um de seus trunfos. Beber com os vizinhos, colar nas provas, e arrumar briga com escolas rivais ganham mais importância a cada episódio graças ao trabalho dos animadores.

Em meio ao escopo superdimensionado e frequentemente aleatório do que pretendia abordar, o primeiro ano de Under Ninja é uma jornada intrigante e única. E mesmo concluindo sua temporada jogando novamente o espectador no escuro, o anime reforça a qualidade envolvente de sua premissa; é uma história que agora tem mais ainda uma responsabilidade de continuar sendo contada.

Nota do Crítico
Bom