Há algumas semanas, no aquecimento para o lançamento de The Car, o Arctic Monkeys declarou em entrevista ao The Big Issues que seu sétimo álbum seria um retorno ao terreno em relação a seu antecessor, Tranquility Base Hotel & Casino: “Sci-fi está no passado, estamos definitivamente de volta à Terra”. Quem entendeu que isso significaria que The Car seria um resgate da sonoridade urbana característica do início de carreira - que durou cinco excelentes álbuns - se engana. O que Alex Turner quis dizer, e o que é comprovado agora no lançamento do novo disco, é que o tema espacial ficou para trás. Só isso. Porque o sétimo álbum do grupo é uma extensão da sonoridade de Tranquility Base, e uma que se distancia muito mais dos seus ouvintes.
Isso acontece porque Tranquility Base - um bom álbum, que inegavelmente cresce com o tempo - foi uma viagem intergalática que colocava os fãs de Arctic Monkeys para dentro da nave, junto com a banda. Era um convite, uma brisa que puxava o público com ganchos distintos e um conceito claro. The Car, por outro lado, tem som de isolamento terapêutico. Aqui, Turner fala consigo mesmo e se afasta ainda mais em sua jornada. Não há nada realmente alcançável. Turner veio para Terra, mas como a capa de The Car bem representa, ele está sozinho, ilhado em um topo intangível.
O movimento, pelo menos, parece consciente. Se com Tranquility Base o Arctic Monkeys se deslocou no tempo e no espaço por um interesse específico e conceitual, de exploração de novas temáticas acompanhadas por descobertas sonoras, The Car soa mais triste e lúcido. Sua melhor representação nesse sentido é “Big Ideas”, a faixa mais visivelmente biográfica. É aqui que Turner abre seu coração e revela sua incapacidade de retornar ao que foi antes. “A orquestra nos cercou completamente e eu não consigo, nem pela minha vida, lembrar como era”, ele diz, autorreflexivo. “Realmente, foi emocionante” são palavras difíceis de ouvir sem sentir o tom de despedida do que uma vez foi.
Mas se Turner se mostra inseguro em letra e flutua por melodias instáveis e difíceis, ao fundo o Arctic Monkeys está absolutamente confiante de sua competência sonora. Seguindo passos de seu líder, os músicos - e principalmente a produção de James Ford - em The Car desenrolam uma jornada admirável. Apertando ainda mais o anseio cinematográfico, o álbum passa por toques de espionagem, de magia, de faroeste, e tudo com absoluta convicção de quem se distancia de vez do pop por definição. O rock do Arctic Monkeys, que com o tempo se transforma em direção ao progressivo, aqui é também sereno e prolongado, passeando por influências de funk com segurança.
Mesmo assim, porque Alex está no comando do navio, é difícil não sentir um gosto amargo com o resultado de forma geral. Os três singles, revelados antes do lançamento, já haviam deixado claro o que viria, mas é difícil acreditar no que The Car entrega por completo. Muito mais interessadas no vocal afetado de Turner, e não em seu distinto apelo sombrio que sempre funcionou muito bem, as 10 faixas se desenvolvem sem nenhum interesse em trazer o público para dentro. É como testemunhar a crise de meia-idade de um dos mais talentosos compositores da atualidade, e ficar abismado pela precocidade do acontecimento.
No fim das contas, o que faz de The Car um disco coeso, além da temática reflexiva de Turner, é precisamente seu desprezo pelo pop, sem nenhuma vontade de entregar um hit. Se “Body Paint” cresce depois de algumas ouvidas e “Perfect Sense” fecha a obra com algum carisma, é muito porque o seguidor do Arctic Monkeys quer - e vai - dar a Turner quantas chances ele quiser. “Tendo tentado duas vezes, ambas incorretamente, a gente conseguiria uma terceira tentativa?”, ele pergunta em “Mrs. Schwartz”. Sim, Alex. Claro que sim.