Música

Crítica

David Gilmour - Rattle That Lock | Crítica

Álbum mostra guitarrista livre, maduro e orgulhoso de si mesmo

04.10.2015, às 18H06.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H44

Quando David Gilmour e Nick Mason se reuniram no ano passado para compilar o material que acabou se transformando no disco The Endless River, eles escreveram o último capítulo na história de uma das bandas mais importantes do mundo. Agora, sem o Pink Floyd, Gilmour parece mais livre para embarcar em outra jornada.

Curiosamente, Rattle That Lock tem muito mais de Pink Floyd do que o próprio The Endless River. Algumas passagens parecem vindas do Division Bell, como "5 AM" – abertura quase progressiva que retoma uma tradição floydiana de primeiro pavimentar o caminho para depois deixar as músicas passarem – e a lindíssima e surpreendente "A Boat Lies Waiting", na qual Gilmour esbanja um tino inabalado para grandes melodias.

E, claro, os solos magníficos também estão lá. O guitarrista reforça sua marca registrada e prova ainda estar em plena forma quando seu timbre inconfundível explode na caixa de som. São aquelas notas mágicas que arrepiam nossa espinha e fazem a gente se lembrar de um dos motivos pelos quais o Pink Floyd se tornou uma banda com tanta personalidade. É emocionante ouvi-lo solar com a mesma paixão de 40 anos atrás, com o mesmo feeling que torna seus solos precisos e perfeitos, mas nunca técnicos ou frios. E essa é a maior virtude de David Gilmour.

Contudo, o mais legal de Rattle That Lock é que Gilmour não força a barra para soar como Pink Floyd. Apesar dos momentos em que a semelhança acontece, aqui a gente ouve um deus da guitarra curioso para explorar novos territórios, e sentindo prazer com isso. A deliciosa "Dancing Right In Front Of Me" é quase um tango, e "Faces Of Stone" traz o andamento de uma valsa. Mas não se assuste: nada é caricato e estas são, provavelmente, as duas músicas mais elegantes que você vai ouvir este ano.

É notável o amadurecimento de Gilmour como compositor em relação a seus outros discos solo. On An Island, de 2006, é um álbum ótimo, mas em Rattle That Lock ele parece ter lapidado qualquer tipo de excesso em prol da unidade do disco. É um álbum mais coeso, onde passagens mais pop coexistem em total harmonia com seus instrumentais mais experimentais, como "And Then", talvez um de seus momentos mais inspirados como instrumentista em muitos anos.

Outros destaques são "Today", com uma das melhores linhas de baixo do disco, e a densa "In Any Tongue", onde o músico projeta um futuro catastrófico para a humanidade numa atmosfera sonora que remete aos tempos de The Wall. É um dos melhores arranjos do disco, onde por cima do tapete sonoro do piano acontecem reviravoltas surpreendentes dos outros instrumentos, até a música desembocar num solo de guitarra magistral.

Dá gosto de ouvir. Rattle That Lock mostra David Gilmour empolgado consigo mesmo, orgulhoso de seu novo material. Quem esperar um novo Dark Side Of The Moon pode se frustrar, mas quem estiver disposto a descobrir novos e instigantes caminhos musicais certamente vai sentir a mesma empolgação. "Rattle That Lock and lose those chains".

David Gilmour se apresenta no Brasil em dezembro, com shows em São Paulo, Curitiba e Porto Alegre - saiba mais.

Nota do Crítico
Ótimo