Uma reportagem divulgada hoje (23) pelo Repórter Brasil revelou que o Lollapalooza foi flagrado submetendo trabalhadores a condições análogas à escravidão. Cinco profissionais que atuavam na preparação do evento foram resgatados na terça-feira (21), no autódromo de Interlagos, em São Paulo, onde os shows acontecem a partir de sexta-feira (24).
Os funcionários, que trabalhavam como carregadores de bebidas, atuavam na informalidade, sem os devidos registros trabalhistas, como manda a lei. “Com idade entre 22 e 29 anos, eles não tinham dignidade alguma, dormiam dentro de uma tenda de lona aberta e se acomodavam no chão. Não recebiam papel higiênico, colchão, equipamento de proteção, nada”, afirmou Rafael Brisque Neiva, auditor fiscal do Trabalho que participou da operação de resgate, efetuada pela Superintendência Regional do Trabalho no Estado de São Paulo, ligada ao Ministério do Trabalho e Emprego.
“Depois de levar engradados e caixas pra lá e pra cá, a gente ainda era obrigado pela chefia a ficar na tenda de depósito, dormindo em cima de papelão e dos paletes, para vigiar a carga” disse J.R, um dos resgatados que tinham 12 horas de jornada diárias.
Os cinco resgatados prestavam serviços para a empresa Yellow Stripe, uma terceirizada contratada pela Time 4 Fun, conhecida como T4F, dona do Lollapalooza no Brasil. Ambas empresas foram notificadas pelas autoridades do trabalho e serão responsabilizadas diretamente pela situação dos cinco trabalhadores escravizados, de acordo com Neiva.
Após o resgate, as empresas foram obrigadas a ressarcir cada um dos trabalhadores em aproximadamente R$ 10 mil pelos salários devidos, verbas rescisórias e horas extras. O valor ainda pode aumentar, caso o Ministério Público do Trabalho entre com pedido de verbas indenizatórias, o que não tem prazo para ocorrer.
Os trabalhadores resgatados relataram que eram ameaçados com a perda do emprego caso tentassem deixar o local após o expediente. “Um dos chefes falou: ‘se você for pra casa, nem volta’. Um outro disse: ‘quem precisa [de dinheiro], fica [a noite toda no autódromo]”, afirma M.S, outro resgatado. “Eu, com aluguel atrasado, desempregado, cheio de conta pra pagar e uma filha de 9 meses em casa, vou fazer o quê? Viver uma situação como essa em um festival desse tamanho é triste."
O Lollapalooza informou ao veículo que mais de 9 mil pessoas trabalham no local do evento e que a prioridade é garantir “as devidas condições de trabalho”. Segundo o comunicado, “é terminantemente proibido pela T4F” que trabalhadores durmam no local, fato que fez com que fosse encerrada “imediatamente a relação jurídica estabelecida com a Yellow Stripe”. “A T4F considera este um fato isolado, o repudia veementemente e seguirá com uma postura forte diante de qualquer descumprimento de regras pelas empresas terceirizadas” (o posicionamento completo está ao final da reportagem do Repórter Brasil).
Já a Yellow Stripe informou que “cumpriu as determinações do Ministério do Trabalho, sendo que os empregados em questão foram devidamente contratados e remunerados”.
Não é a primeira vez que o Lollapalooza viola a dignidade dos trabalhadores. Em 2019, pessoas em situação de rua foram contratadas por R$ 50 para cumprir diárias de 12 horas para montar os palcos, segundo a Folha de S.Paulo. O advogado de Direitos Humanos Jeff Nascimento relembrou denúncias semelhantes em anos anteriores desde 2018.
O Lollapalooza acontecerá em 24, 25 e 26 de março de 2023, no Autódromo de Interlagos, em São Paulo.