Mauricio Takara
Phoenix
Underground Resistance
Van She
Artificial
She Wants Revenge
A temperatura ajudou a deixar o clima do festival, com o perdão do trocadilho, bem morninho na sua média final. Em 2006, o evento levou com louvor o título de "festival com a melhor infra-estrutura do ano": tudo funcionava. Agora, a situação infelizmente mudou de figura.
A tenda, apesar de menor que no ano passado, ainda impressionava. A exposição de arte multimídia ajudava a distrair quem não estivesse interessado no show do momento, assim como o minidirigível que passeava por ali. Mas foi no decorrer das horas que os problemas apareceram: filas gigantes nos poucos banheiros químicos, "esperteza" nos bares (que só vendiam mínimo de R$ 10 de fichas) e a sauna seca que se formou no espaço, sem ventilação. Assim, nem a pontualidade dos shows salvou a boa moral do festival.
Abafado foi também o som durante a apresentação da australiana Van She, a primeira atração internacional da noite. O quarteto entrou empolgado no palco, com vontade de enfrentar uma platéia pequena e desconhecida. Mas a caixa de som mal equalizada não deixava diferenciar os instrumentos da voz de Nick Routledge, transformando tudo em barulho. Uma pena para o repertório dos guris (baseado em um EP de seis faixas, lançado em 2005), que conseguem reler Phil Collins sem parecer pentelhos. O hit máximo "Kelly" e o teclado de Michael Di Francesco mereciam chance melhor.
Efeito parecido teve a apresentação do Artificial, projeto de eletrônica lo-fi do músico e produtor Kassin. Então o rubor era de vergonha, pelo bando de amigos que dançava no palco, em performance nonsense. A música produzida por Kassin é vigorosa e dói no ouvido, além de interessar pelo aspecto bugiganga, já que parte dos sons é retirada e filtrada através de um Gameboy. Mas a platéia não parecia muito interessada pelas experimentações, e o carioca soou deslocado na escalação.
Mauricio Takara teve melhor sorte, recrutado para intervir entre os shows maiores, tocando em um espaço secundário ao lado do palco principal (boa sacada da organização, que fugiu do clichê "DJ de intervalo" e não deixou o festival parado em um momento sequer). Improvisando em jam sessions ao lado de convidados, que foram do jazz ao hip hop, o multi-instrumentista Takara provou aquilo que quem acompanha sua carreira dentro da banda Hurtmold (e em tantos outros projetos) já sabe: é um dos mais prolíficos músicos da sua geração, em São Paulo.
No meio da noite, a vez coube aos veteranos do festival, a banda/coletivo/manifesto Underground Resistance, veteranos do techno de Detroit, vindos diretamente dos anos 90. Apesar da militância política, marca do bando, a apresentação do Nokia Trends foi na base da festa. Com oito músicos no palco, liderados pelo ícone Mad Mike, o UR foi do techno ao free jazz passando por latinidades, com faixas clássicas para quem acompanha o movimento (à la "Starlights", "Transition" e "Knights of the jaguar"). Foi show para fazer a cabeça da geração eletrônica-old-school, que invadiu a pista. Mas aos desavisados, que não faziam idéia da importância histórica que estava encarnada ali, não restou muita explicação enqüanto Mad Mike bailava rumba com uma fã da platéia.
O clima pop enferveceu mesmo na dobradinha final, com Phoenix e She Wants Revenge disputando a estrela de destaque do festival. A banda francesa, liderada por Thomas Mars (também conhecido como "o marido de Sophia Coppola"), já entrou gastando "Napoleon says" e "Consolation prizes", hits do seu último álbum, It's never been like that, de 2006.
Apesar de pouquíssimo conhecidos por aqui, os Phoenix agradaram um punhado de fãs, que declamavam as letras das "antigas" "Run run run" e "Too young". Ao vivo, os franceses fazem sua sonoridade de banda de estúdio crescer e preencher os olhos. São banda potente no palco, quase messiânica sem ser chata, e aumentam o volume do instrumental (que em disco é bem inofensivo) para entreter.
O resultado foi uma bela apresentação, apesar dos dispensáveis solos auto-referentes. O que se faz estranhar é a falta de entrosamento dos músicos, que não pareciam muito à vontade uns com os outros - ao ponto de o baterista atravessar o discurso de Mars para começar logo a próxima música.
Ficou difícil, assim, para os franceses baterem a sintonia do duo californiano. Tocando com músicos de apoio, o She Wants Revenge provou que pode sobreviver ao ar livre, sem toda a pesada produção de estúdio que circunda seus discos, com um show quase irretocável. Todos os elementos das gravações estavam ali, prontos para embalar dancinhas estranhas na platéia. Só fez falta o sintetizador de Adam 12, que apareceu pouco.
Felizmente, a banda deu preferência às músicas do primeiro disco, de 2005, que tem suas melhores faixas - como a combinação "Red flags and long nights" e "These things", que abrem o disco e iniciaram o show, e os hits "Tear us apart" e "Out of control".
O vocalista Justin Warfield é uma incógnita à parte. O ponto forte é que sua garganta funda consegue impressionar e dar conta dos bons momentos da banda. Mas a sua performance dá pane na cabeça de quem esperava um intérprete soturno, encaixado na sonoridade dark das músicas.
Com seus sorrisos e coreografias sexualmente ambíguas, Warfield esbanja simpatia até demais, chegando ao ponto de rebolar durante faixas como "Broken promises for broken hearts". É quase um Ian Curtis "on acid". Uma confusão de signos de fazer enfartar os mais puristas. Bobagem, mas faz pensar.