Embora tenha uma taxa de aprovação relativamente alta entre os espectadores da Netflix, é justo dizer que a versão televisiva de O Legado de Júpiter decepcionou a grande maioria dos críticos, especialmente os mais acostumados com o trabalho do quadrinista Mark Millar, mente por trás da HQ que deu origem à série. A obra original, publicada em 2013, traz um olhar crítico para a popularidade cada vez maior de anti-heróis violentos e sanguinários, com a narrativa dinâmica característica do roteirista.
O que se viu na produção da Netflix, no entanto, não condiz nem um pouco com o material original. Além de transformar os diálogos ácidos dos gibis em discursos truncados e rasos, a trama chocante criada por Millar foi deixada de escanteio até basicamente o último segundo da primeira temporada. afetando o desenvolvimento de personagens e privando o público de alguns dos momentos mais emocionantes da história da família Sampson.
Abaixo, listamos alguns dos pontos que mais incomodaram fãs dos gibis em O Legado de Júpiter da Netflix - confira [contém spoilers dos quadrinhos e provavelmente das próximas temporadas da série]
- Tudo o que você precisa saber sobre O Legado de Júpiter
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A trama
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Logo na primeira edição de O Legado de Júpiter, os planos de Walter para substituir Sheldon como principal nome da União da Justiça são colocados em prática. O Onda-Cerebral usa seus poderes para manipular vários heróis da nova geração, incluindo Brandon, seu sobrinho e filho do Utópico. Essa "tramóia" atinge seu ápice já na terceira edição, quando o vilão, aliado aos seus parceiros mais jovens, assassinam Sheldon e Grace a sangue-frio, com Brandon dando o golpe final no pai.
Não que fosse necessário recriar cada quadro das HQs, mas a maneira como a produção da Netflix fugiu desta trama principal surpreendeu da pior maneira possível. Na série, o único indício de que esse plano existe está nos últimos segundos da primeira temporada, que usa flashbacks para revelar que o personagem de Ben Daniels estava por trás de todo o infortúnio que caiu sobre os heróis.
A história de Chloe e Hutch também foi muito prejudicada. Se na série o casal se junta de maneira relativamente forçada e apressada, os super-pombinhos já estão em um estágio bem mais avançado de seu relacionamento nas primeiras páginas de O Legado de Júpiter. O namoro dos dois é bem mais orgânico e crível na HQ, em que os dois passam a criar um filho superpoderoso.
A história desnecessária nos anos 1930
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Millar nunca revelou completamente o que aconteceu na misteriosa ilha que concedeu poderes aos heróis originais, preferindo manter o segredo que envolve a jornada dos personagens. O Círculo de Júpiter, livro prelúdio de Legado de Júpiter, aliás, tinha como objetivo ressaltar as diferenças entre as duas gerações de heróis e explorar o racha que levou Skyfox a se tornar “o maior vilão da história”. Enquanto as peças de divulgação da série já haviam adiantado que a primeira temporada alternaria flashbacks e trama presente, os acontecimentos do passado não só removeram o suspense da história, mas também criaram uma barriga desnecessária que deixou a primeira temporada cansativa, repetitiva e incômoda.
Personagens estagnados
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Uma das maiores qualidades do trabalho de Mark Millar é sua capacidade de construir personagens. Kick-Ass, Entre a Foice e o Martelo, Velho Logan e Os Supremos mostram como acontecimentos cruéis podem desequilibrar até o maior super-herói de todos os tempos. O Legado de Júpiter não é exceção. Embora aconteça de forma ágil, a transformação de Chloe em uma dedicada mãe e heroína ou de Walter de um super-herói em um ditador impiedoso são realistas e condizem com uma construção cuidadosa feita por Millar e pelo artista Frank Quitely.
Embora foque mais nos personagens do que na ação, a versão da Netflix paradoxalmente não desenvolve de verdade a história de nenhum deles e poucos são aqueles que terminam o primeiro ano diferente do que começaram. Brandon e Chloe, protagonistas do quadrinho, são o principal exemplo desse problema, já que nenhum dos dois irmãos chega ao capítulo final realmente diferente de como eram no começo da temporada.
A representação do Código
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Nas páginas, o Código criado pela primeira geração da União aborda uma variedade de dilemas recorrentes na vida dos super-heróis. Além do uso da força letal, usar a influência para conseguir favores sexuais, namorar civis e influenciar na política local e internacional também são ações condenáveis de acordo com o Código. Embora a série trate brevemente da limitação política, ela foca demais no uso da força letal, como se esta fosse a única regra que os heróis realmente devessem seguir. Para piorar, a justificativa para que ela seja quebrada é problemática.
Diferentemente dos quadrinhos, em que os grandes vilões estão mortos, presos ou aposentados, permitindo que os jovens superpoderosos aproveitem suas habilidades para ganhar fama, O Legado de Júpiter da Netflix traz antagonistas cada vez mais brutais e impiedosos, implicando em uma perigosa filosofia de revanchismo na segunda geração da União.
Diálogos tediosos e repetitivos
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Outra frustração na maneira como O Legado de Júpiter foi adaptado pela Netflix está nos diálogos. Se o quadrinho usa e abusa de ironia, dinamismo e troca de farpas entre personagens, a série se prende a discussões repetitivas, com falas que tentam ser muito mais profundas do que realmente são. Os oito episódios abordam praticamente da mesma forma como o Código limita as ações dos heróis, colocando-os em risco, com personagens insistindo nos mesmos argumentos durante toda a temporada.
Essa constante repetição ao mesmo tempo verborrágica e simplista faz com que acompanhar o primeiro ano de O Legado de Júpiter se torne uma tarefa tediosa e ingrata. O foco nesse problema único cria uma obviedade na série que em momento algum se faz presente no quadrinho, que trazia praticamente uma grande reviravolta por edição.