A popularidade mundial de The Witcher cresceu bastante nos últimos anos com a trilogia de jogos da CD Projekt RED e, agora, a série da Netflix, estrelada por Henry Cavill (Homem de Aço). Mas a franquia existe desde a metade da década de 1980, quando era publicada na Polônia em contos do autor Andrzej Sapkowski. O sucesso das histórias curtas, dos romances e até adaptações em HQ fez com que o bruxo Geralt de Rivia se tornasse um marco da cultura pop do país - e foi assim que a saga ganhou suas primeiras adaptações.
Em 2001, pouco após a publicação do livro final A Senhora do Lago, o diretor novato Marek Brodzki ficou encarregado de levar a obra para as telonas, com a promessa de que depois iria virar uma série de TV. Para ficar à altura da popularidade da franquia, o investimento foi igualmente alto: 19 milhões de zloty (algo em torno de 20 milhões de reais), o que era bastante incomum para produções polonesas da época. Mesmo com leitores fiéis, o longa não era só direcionado aos fãs de The Witcher ou da fantasia, mas sim queria entregar algo mais palatável ao grande público.Como esperado, o resultado não agradou ninguém.
Chamado apenas de Wiedzmin (no idioma original), o filme tenta combinar as várias histórias de Geralt e Ciri ao longo de duas horas, ao invés de se focar em criar uma narrativa única. Isso significa que a trama vai e volta de forma confusa, sem desenvolver seus personagens ou universo. Não ajuda que a qualidade da produção não é das melhores, com péssima direção e efeitos verdadeiramente lamentáveis. A passagem de tempo não melhorou o longa, mas só para ter uma ideia: durante a adaptação do conto “O Limite do Possível”, o dragão que é alvo da caça por Geralt e o grupo é feito em computação gráfica. Curiosamente esse era o ponto alto dos efeitos na época, como diz uma crítica de 2001 do site polonês FilmWeb. Veja abaixo, e imagine como devem ser os pontos baixos:
O filme foi o primeiro esforço de levar a saga para outros países, já que as aventuras de Geralt eram famosas apenas na Polônia e em alguns vizinhos, como a Rússia. Com isso o longa ficou internacionalmente conhecido como The Hexer - palavra alemã para “bruxo” -, mas não deu o resultado esperado. Muitas das reclamações giravam em torno de soar como um trailer de duas horas para a série de TV, o que não é impreciso. Sapkowski sequer gastou muitas palavras para reagir ao longa: “Posso responder com uma palavra curta e obscena, mas sou católico, e estamos na quaresma. Não posso falar palavrões.”
A adaptação televisiva, por sua vez, era a chance de Brodzki tentar novamente. O seriado só veio no ano seguinte, em 2002. O cineasta se preparou melhor para a ocasião, tendo se reunido com fãs para entender o que precisava ser corrigido. O resultado é levemente melhor sim, e faz bom uso da maior duração - 13 episódios de uma hora. Com o passar dos anos, o seriado até conquistou seu nicho, especialmente pelo charme de Filme B. Alguns elogios também são constantes entre as duas adaptações, como a trilha sonora de Grzegorz Ciechowski, e a atuação de Michał Żebrowski como Geralt.
The Hexer, mesmo com suas várias falhas, é um bom exemplo do amadurecer do audiovisual da Polônia. Por lá a indústria é relativamente nova, sem grandes produções durante a era do comunismo (nesse período, importações de conteúdo - como telenovelas brasileiras - eram mais comuns). Hoje o país está numa fase melhor, com o recente sucesso de crítica do drama Guerra Fria (2018), e Corpus Christi entre os pré-selecionados para disputar Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2020. The Witcher também evoluiu bastante nesse tempo: a trilogia da CD Projekt RED é vista com alguns dos melhores RPGs existentes, Sapkowski escreveu outro romance em 2013, e a série da Netflix é bastante antecipada. É tudo que isso que torna importante, e bastante divertido, voltar para ver as primeiras tentativas.