ATENÇÃO: Spoilers de Os Anéis de Poder a seguir!
A diretora Sanaa Hamri é uma escolha interessante para a segunda temporada de O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder. Conhecida no cinema por assinar comédias românticas elogiadas pela crítica, como Jogada Certa e Quatro Amigas e um Jeans Viajantes 2, ela fez a transição para a TV em meados dos anos 2010, e passeou por produções contemporâneas polidas, mas não exatamente prestigiadas ou dadas ao gênero (Nashville, Glee, Shameless), antes de cair de paraquedas em A Roda do Tempo e Gen V, em 2023. Por lá, ela provou que o seu toque leve e o seu senso de espaço realista cabiam bem em cenários mais ambiciosos, até como um elemento estabilizador das aspirações fantásticas das tramas.
No quarto capítulo de Os Anéis de Poder, é exatamente essa a função que ela desempenha. A pouco mais de 1h do episódio é bastante concentrada em três subtramas: na primeira, Nori (Markella Kavenagh) e Poppy (Megan Richards) encontram uma nova subespécie de hobbits, descobrindo mais sobre o equilíbrio de poder em Rhûn, enquanto o Estranho (Daniel Weyman) acha em Tom Bombadil (Rory Kinnear) um conselheiro valioso para a sua busca por identidade; na segunda, Galadriel (Morfydd Clark) e Elrond (Robert Aramayo) atravessam um caminho traiçoeiro na sua jornada para Eregion - e, chegando lá, encontram um exército de orcs prestes a invadir a fortaleza, o que necessita um sacrifício impetuoso por parte da ex-comandante; na terceira, Arondir (Ismael Cruz Cordova) e Isildur (Maxim Baldry) procuram pelo desaparecido Theo (Tyroe Muhafidin), abrindo caminho para a chegada dos ents na série.
Como já tinha ficado claro na semana passada, com os três capítulos iniciais da temporada, esta nova Os Anéis de Poder escolhe se mover muito mais rápido do que sua antecessora, e abordar uma quantidade muito maior de conceitos fantásticos de uma vez só. Daí que não só os ents são introduzidos com tato, mas sem muita cerimônia, como também o Estranho se vê engolido quase imediatamente pelo mundo de mística natural representado por Bombadil. O personagem, inclusive, é uma presença energética no universo da série quando traduzido pelas escolhas equilibradamente excêntricas de Rory Kinnear, que nos últimos anos tem de provado de novo (Men) e de novo (Penny Dreadful) e de novo (Years & Years) um dos melhores e mais consistentes atores de sua geração.
Por outro lado, Hamri é excelente em injetar o espírito de aventura na trilha cheia de disputas de poder e encontros perigosos que se estende diante de Galadriel, Elrond e seus correligionários. O roteiro mantém a rixa entre os dois grandes amigos, causada pelo Anel de Poder usado por Galadriel, em mente - mas a câmera de Hamri trata de nos lembrar que esta é também uma expedição por terrenos sombrios no melhor estilo Tolkien. E ela é eclética: quando as criaturas tumulares aparecem, conduz a sequência em ritmo de suspense, sem se render ao frenetismo; já no confronto final de Galadriel com os orcs, deixa os feitos atléticos da elfa (e a coreografia criativa do time de dublês) tomarem a frente em uma bela sequência iluminada em laranja pelas tochas dos inimigos.
O resultado é um capítulo dinâmico, estruturalmente bem resolvido, que até por isso passa voando - e deixa um gostinho de “quero mais”. Prova que essa Os Anéis de Poder, que caminha pela Terra Média em passos muito mais leves do que fazia antes, é uma presença para lá de bem-vinda no cenário da fantasia contemporânea.