Ver Chris Pratt como um herói de ação está longe de ser uma novidade a essa altura do campeonato. Até os mais saudosistas dos fãs de Parks and Recreation já se acostumaram a ver o preguiçoso e atrapalhado Andy Dwyer com um olhar mais nobre, encarando todo tipo de criatura, de dinossauros a aliens fortemente armados. Até porque, de uma forma ou de outra, seu afiado (e por vezes bobo) timing cômico sempre encontrava uma brecha para se manifestar. Logo, era de se esperar que A Guerra do Amanhã, produção da Paramount que o Amazon Prime Video comprou na pandemia para lançar direto no streaming, não fosse ser um ponto fora da curva no currículo do ator. Contudo, ao transformar Pratt num clichê de protagonista de filme de ação, nem mesmo as suas numerosas tentativas de piada salvam a trama do seu caminhar tedioso.
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Na trama, ele é o biólogo e militar Dan Forester, um homem que acredita estar destinado a grandes feitos, mas que não encontra meios de realizar seus sonhos, apesar da sua determinação e dos incentivos otimistas da sua filha Muri (Ryan Kiera Armstrong). Sua frustração com o mundo real perde o protagonismo quando viajantes do futuro pedem ajuda para lutar em uma guerra contra alienígenas letais, chamados de garras brancas. Em um misto de teimosia e busca por propósito, ele deixa sua família para trás e viaja para 2051 para tentar impedir a extinção da humanidade, sem qualquer garantia de retorno.
Não se pode dizer que o diretor Chris McKay e o roteirista Zach Dean estavam indiferentes ao quanto seu herói estava escorado num lugar-comum. Eles tinham plena consciência disso, a ponto de colocar o protagonista para rir da sua própria estereotipação em um breve momento no embate final. Entretanto, o escárnio é pontual, de modo que não dá para olhar para A Guerra do Amanhã como uma paródia. Quando Pratt aperta o olho, encara o horizonte e diz uma frase como "não deixamos nenhum homem para trás", mesmo sabendo que isso significa sacrificar 10 dos seus, não há humor, somente uma hiperdramatização intencional. É a construção da figura do herói óbvio e de moral inabalável que está em curso.
Ainda assim, não se pode negar que há momentos engraçados -- talvez não todos deliberados, mas há. Por exemplo, é difícil não encarar com alguma ironia quando Pratt, assistindo à final da Copa do Mundo de 2022, olha para a seleção brasileira e diz, em tom elogioso, “dá para acreditar que esses são os melhores?”. Mas, para além desta piscadela aos boleiros de plantão, o personagem de Sam Richardson também tem seus momentos. Seu medo ao encontrar um garra branca é muito relacionável e, por isso mesmo, cômico. Quem não gritaria palavrões enquanto atira nessas criaturas de outro mundo? Ainda mais alguém que, como ele e tantos outros soldados, não está familiarizado com armas, nem qualquer elemento da carreira militar. No geral, porém, os momentos de alívio cômico sempre parecem fora do lugar, de modo a não amenizar a tensão, mas torná-la menos tolerável e instigante.
É fato que o foco de McKay não é estreitar a relação entre a ação e a comédia, mas sobretudo inserir este combo num drama familiar. Afinal, a família Forester encara a guerra contra os aliens na sombra de conflitos entre pais e filhos. Enquanto Dan sente muito ressentimento pelo abandono de seu pai, o engenheiro parrudo James Forester (J.K. Simmons), ele se depara com os deslizes da sua paternidade no futuro. Mas, mais uma vez, os clichês tomam conta. As cenas mais emocionantes, embora tenham performances boas, com destaque para Yvonne Strahovski, são desinteressantes. A maioria ventila de forma barata e falsa um discurso motivacional para ora saciar a frustração do seu protagonista, ora frisar a grande moral da história.
A Guerra do Amanhã fica mais divertida quando parte para a ação. As criaturas metem medo e as revelações das suas habilidades são de fato surpreendentes. Infelizmente, os momentos de explosão e pancadaria são sacrificados para lidar com o fator humano, e se tem uma coisa que aprendemos com a ficção científica é que a humanidade tende a ser o maior vilão da história. Nesse caso, foi o sentimentalismo de seus personagens que levou à aventura para esse esvaziamento, e nem o carisma de Chris Pratt pode salvá-la desse fim.