A edição número 20 do Big Brother Brasil tem chamado a atenção do país de uma maneira que já não acontecia há muito tempo. Com anônimos misturados a um time de famosos e influenciadores, o programa provocou uma polarização de opiniões que muda a cada semana, numa dinâmica de adoração e repúdio pelos confinados que reflete e leva à discussão todo o excesso e extremismo que circulam pelas redes disfarçados de “personalidade forte”. Com tanta gente que trabalha com mídias digitais na casa, também era de se esperar que o apelo do programa entre os internautas fosse maior que em qualquer outra edição da história.
Babu Santana, cria do Morro do Vidigal, foi escolhido para integrar o elenco de famosos, composto, essencialmente, por influenciadores e YouTubers. O ator chegou, inclusive, para servir ao contraste. Sua história em nada se equiparava a de outros participantes, que enriqueceram com seus perfis. Dentro do BBB, os responsáveis pela seleção são calculistas e a inserção de Babu nesse contexto era, de certa forma, uma armadilha. A mesma que colocou negros e ativistas na edição 2019 para que se chocassem com participantes conservadores e privilegiados. O resultado foi a vitória de Paula, apontada como racista pela internet, mas vencedora aos olhos dos votantes.
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Como aconteceu muitas vezes nessa temporada, Babu foi um dos participantes que oscilou entre favoritismo e rejeição, primeiro confrontando os homens acusados de machismo e depois, unindo-se ao último deles ao constatar uma tentativa clara dos presentes em segregar o remanescente. Ao lado de Felipe Prior, Babu em alguns dias é celebrado por conta de sua história de vida e por conta do enfrentamento com colegas de confinamento que não enxergam as próprias incoerências. Em outros dias, é criticado por seu temperamento controlador e arredio. Exposto aos métodos do programa, ele é cheio de complexidades e representa, enfim, uma voz que arranca dos adversários preconceitos estruturais que são justamente desmascarados.
A carreira de Babu (que adotou esse nome em protesto ao apelido de “babuíno” na infância) tem mais de 40 filmes e mais de 30 produções televisivas, incluindo séries e novelas. Mas, como seria impossível falar de todos eles, selecionamos alguns dos principais títulos entre cinema e TV. Títulos que ajudam não só a percebermos como funciona a engrenagem da indústria acerca de pessoas negras, mas também a apreciar uma faceta de Babu que o BBB não nos dá a oportunidade de conhecer.
A edição número 20 do Big Brother Brasil tem chamado a atenção do país de uma maneira que já não acontecia há muito tempo. Com anônimos misturados a um time de famosos e influenciadores, o programa provocou uma polarização de opiniões que muda a cada semana, numa dinâmica de adoração e repúdio pelos confinados que reflete e leva à discussão todo o excesso e extremismo que circulam pelas redes disfarçados de “personalidade forte”. Com tanta gente que trabalha com mídias digitais na casa, também era de se esperar que o apelo do programa entre os internautas fosse maior que em qualquer outra edição da história.
Cinema: Uma Onda no Ar (2002)
Um dos primeiros filmes da carreira de Babu foi Uma Onda No Ar, dirigido por Helvécio Ratton. O longa conta a história real de uma rádio comunitária perserguida pela polícia enquanto quatro amigos lutam para mantê-la viva. Babu interpreta um desses amigos. Após passar pelo Nós do Morro, o ator foi escolhido numa seleção de elenco para os protagonistas que testou mais de 3 mil candidatos.
Esse início também anunciou uma carreira de confrontos com o racismo estrutural que sempre retrata negros grandalhões a como o bandido, o favelado e a autoridade truculenta. “Porque eles acham que o criminoso ou policial precisam ser retratados como esse cara negro grande e agressivo”, disse o ator em uma das suas entrevistas. Curiosamente, o status de truculento e grosseiro também faz parte da imagem que lhe foi atribuída no BBB.
Cinema: Estômago (2007)
Estômago, de Marcos Jorge, foi o filme que deu a Babu seus primeiros prêmios de Melhor Ator. Ele venceu como Coadjuvante no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, no Cineport - Festival de Cinema de Países de Língua Portuguesa e no Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro.
Na história do imigrante nordestino que muda os hábitos alimentares de um presídio, Babu vive o colega de cela Bujiú. Apesar de ainda estar vivendo um personagem que se espera de um ator com seu porte e sua origem, Babu teve a chance de colorir Bujiú com doses de humor que impediram sua atuação de cair no lugar comum. Foi uma grande oportunidade de mostrar que ele sabia fazer mais que só cara feia.
Cinema: Julio Sumiu (2014)
Embora o trabalho de Babu em Julio Sumiu tenha sido notado a ponto de lhe render uma indicação como ator coadjuvante no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, seu nome não é nem mesmo creditado no trailer do longa.
O longa não é das grandes peças do cinema nacional, tem uma série de equívocos de construção e constrange mais do que faz rir. Porém, Babu, vivendo o outro lado da lei dessa vez, se destaca como o policial Caolha, salvando o filme da completa irrelevância graças a suas cenas.
Cinema: Mundo Cão (2016)
A problemática que contrata negros para interpretar bandidos ou brutamontes corruptos esbarra na incapacidade da indústria em oferecer aos mesmos atores oportunidades de fazer personagens fora dessa curva.
Marcos Jorge, mesmo diretor de Estômago, foi um dos nomes que ofereceram a Babu uma chance de construir um personagem que não fosse só o estereótipo da intimidação. Em Mundo Cão, o ator não tem uma alcunha de bandido e se chama Santana. É um pai de família comum, tem um emprego na prefeitura e é casado com Dilza, vivida por Adriana Esteves. A vida de Santana passa a ser perturbada quando ele cumpre seu papel de funcionário público e leva um “cãozinho” em sua carrocinha.
O problema é que esse cão é propriedade de um bandido; e ele quer vingança. Além de ser um filme cheio de tensão, a performance de Babu como um pai de família desesperado para conseguir proteger sua família é realmente impressionante.
Cinema: Café com Canela (2017)
Outra grande oportunidade de Babu no cinema que não se enquadra nas óbvias escalações estereotipadas está em Café com Canela. O primeiro longa nacional com uma mulher negra na direção (Glenda Nicário) é cheio de representatividades em seu elenco e produção. A história sobre perdas mostra Babu vivendo um homossexual completamente apaixonado por um homem mais velho. Esse é um dado importante para quem não conhece a trajetória do ator.
Recentemente, Babu fez comentários homofóbicos a respeito de outro participante do BBB e a defesa de seus fãs a respeito da não-intencionalidade desses comentários apontou na direção de outro preconceito estrutural: aquele contra os gays. A proximidade de Babu com as questões homoafetivas está comprovada não só pelo meio em que está inserido, mas também nas vidas que anima quando o diretor diz “ação”. Sua não-intencionalidade pode ser completamente genuína.
Mas, assim como ele tem desmascarado vários comportamentos condicionados condenáveis, esperamos que Ivan, seu personagem em Café com Canela, seja reacessado e que possa lhe ensinar mais algumas coisas sobre sensibilidade.
Cinema: Tim Maia (2014)
Tim Maia ficou por último porque esse talvez seja o título pelo qual a carreira de ator de Babu mais é reconhecida. Além de soltar o vozeirão, o ator entregou-se completamente a seu primeiro protagonista, vivendo Tim Maia na fase adulta, em seus últimos anos, quando as drogas o colocaram em notório declíneo artístico.
A performance de Babu acabou lhe rendendo seu primeiro troféu como melhor ator no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, uma vez que, até então, havia vencido apenas como Coadjuvante. O longa teve uma passagem muito positiva pelos cinemas, mas o personagem acabou ganhando mais projeção quando a Globo recontou a história no formato de minissérie, um ano depois.
Televisão: Cidade dos Homens (2002)
Imagem de Cidade dos Homens/Reprodução
Embora Babu só tenha feito um episódio da série sobre a rotina dos meninos Laranjinha e Acerola, ela aparece nessa lista porque essa foi a primeira série onde ele trabalhou. Antes, ele só tinha feito uma participação em Malhação. O episódio em que ele aparece, contudo, é um show a parte. Babu vive o chefe da boca no morro onde Acerola (Douglas Silva) vive.
Quando a comunidade inteira começa a reclamar que suas correspondências não estão chegando, o chefe da boca escolhe Acerola para cumprir a função, já que ele conhece as ruelas mais que o carteiro. O problema é que o chefe da boca exige que todos os dias não sobre nenhuma carta ou o menino sofrerá as consequências. Babu vive um personagem muito próximo de vários que já vivera e viveria dali por diante. Mas, o ótimo texto e direção valem uma reprise. Babu também esteve no filme baseado na série, produzido alguns anos depois.
Televisão: Mais X Favela (2011)
Multishow/Divulgação
Criada como uma adaptação de um filme dirigido por Cacá Diegues, Mais X Favela foi um projeto que não teve a popularidade necessária para passar da segunda temporada. Porém, mesmo com tantas limitações de produção, esse é um trabalho importante na carreira de Babu justamente ser um retrato da vida na favela que não privilegia a rotina do crime.
A série conta a história de uma família como qualquer outra, com a realidade da comunidade como parte de seu DNA. Boi, o personagem de Babu, luta para sustentar a família, mas sempre com leveza e afeto.
Televisão: Carcereiros (2019)
Depois de já ter ganhado tantos prêmios, reconhecimento da crítica e ter passado por personagens diferentes, era esperado que Babu não precisasse voltar ao estereótipo do bandido ou do policial corrupto.
Carcereiros foi seu último trabalho na Globo antes de entrar no Big Brother e embora seu personagem seja parte desse “mais do mesmo”, é sempre impressionante vê-lo em cena, mostrando verdades como nenhum outro.
Televisão: Novo Mundo (2017)
Mesmo que tenha feito algumas novelas, vamos citar nesse texto apenas Novo Mundo, de 2017. A razão disso é que, por causa das paralisações ocorridas na Globo como prevenção ao Coronavírus, novelas serão reprisadas nos horários das produções inéditas, numa decisão sem precedentes na nossa história. Como a próxima das 18h, Nos Tempos do Imperador, é uma continuação direta de Novo Mundo, a emissora resolveu colocar a última como reprise do horário, permitindo ao público acompanhar a primeira parte da história antes da estreia da continuação.
A novela, que conta as aventuras da vinda da família real para o Brasil, apresenta Babu vivendo um personagem que mais uma vez se vale de sua aparência como referência para tipos vilanescos. Ele vive Jacinto, um capataz que faz serviços sujos para os vilões. Mas, ao menos é um personagem com nome e não com uma alcunha. Com a reprise, todos terão chances de revê-lo em cena e ele deve ficar contente quando sair do BBB e souber dessa exibição inesperada e bem-vinda.