A série live-action de Cowboy Bebop, da Netflix, estreou na última sexta-feira (19) após uma semana dividindo a crítica. A produção que adapta a obra de Shinichiro Watanabe para a telinha falha em manter a essência do anime e em reproduzir os aspectos que o tornam tão especial. Como exemplos do que faltou no live-action, podemos citar desenvolvimento dos personagens e o jeito único de cada um deles. A produção apresenta uma história com bastante mudanças, resgatando momentos épicos do anime de forma tão tímida que, no fim, mais parecem easter eggs.
Essas falhas de Cowboy Bebop fizeram muito fã roer as unhas, já que na fila de adaptações da Netflix estão live-actions de One Piece, Yu Yu Hakusho e Avatar. Esses clássicos carregam multidões, e a paixão desses fãs é tão grande que, se transformada em raiva, pode causar estragos. Sabendo disso, precisamos falar do elefante na sala: as próximas adaptações serão iguais a Bebop?
Antes de mais nada, é preciso lembrar que adaptações, especialmente de anime, são muito difíceis de se fazer. As animações japonesas possuem códigos muito específicos e, em geral, aspectos propositalmente exagerados, como personagens que falam gritando, habilidades esteticamente ridículas/engraçadas, e trejeitos que só fazem sentido naquela situação. Ignorar tudo isso ao levar uma obra para a versão real é uma decisão muito complicada, mas que às vezes pode ser a melhor saída. Além de tudo isso, não dá para esperar que uma adaptação entregue a mesma coisa que o original. A Netflix costuma trabalhar com episódios de 40 minutos a uma hora e muitas vezes um episódio de anime rende mais tempo de tela, mas isso exige muita criação por parte dos roteiristas — o que leva tempo.
No caso de One Piece, a primeira temporada, de 10 episódios, terá Marc Jobst como diretor. O cineasta tem um longo histórico com a Netflix e já dirigiu episódios de O Legado de Júpiter, The Witcher, Demolidor e Luke Cage. Não sabemos o quão Jobst é ligado ao universo dos animes, mas quando o assunto é fantasia, ele tem um currículo que pode servir de alento para os fãs. Se pudermos considerar este o primeiro ponto positivo da série, o segundo seria o elenco. Os atores Iñaki Godoy (Luffy), Mackenyu (Zoro), Jacob Romero Gibson (Usopp), Emily Rudd (Nami) e Taz Skylar (Sanji) vêm mostrando desde o anúncio do elenco que estão 100% conectados com seus personagens e o mangá de Eiichiro Oda. Esse carinho deve fazer uma enorme diferença na conexão que vamos criar com os Chapéus de Palha da série. Entretanto, One Piece ainda será uma produção ocidentalizada e as chances de se tornar um novo Legado de Júpiter existem, considerando o exemplo que tivemos com Bebop. A melhor saída talvez seja entender algumas críticas recorrentes das adaptações e tentar consertá-las.
Já Yu Yu Hakusho tem a vantagem temporal de estrear um bom tempo depois de Cowboy Bebop. A série baseada na obra do mangaká Yoshihiro Togashi tem previsão para dezembro de 2023. O tempo extra para desviar dos erros de suas antecessoras está alinhado com outro aspecto que talvez seja vantajoso: até o momento, todas as informações divulgadas indicam uma produção orientalizada. Kaata Sakamoto e Akira Morii, dupla de Alice in Borderland, são responsáveis pela produção, e o ator japonês Takumi Kitamura já foi clicado caracterizado para a série. Talvez Yu Yu Hakusho não seja tão fácil de se adaptar quanto Bebop, mas não deve dar tanto trabalho quanto One Piece.
Quando o assunto é Avatar, entramos em um terreno ainda mais delicado, já que muitos fãs da obra ainda são atormentados pela primeira adaptação, de 2010. O filme americano trouxe mudanças na trama original e um elenco que não agradou parte do público. Dessa vez, sob comando do streaming, a história do Último Mestre do Ar será contada no formato seriado. O elenco é composto por Gordon Cormier (The Stand) como Aang, Ian Ousley (13 Reasons Why) como Sokka, e Dallas Liu (PEN15) como Zuko. Apesar de não ser uma produção japonesa, Avatar carrega vários aspectos estilísticos de um anime e adaptá-lo não será muito mais fácil. Em compensação, temos um longa-metragem de quase duas horas cheio de lições do que fazer ou não na série. As chances de acerto parecem ser bem mais sólidas que nos demais, mas ainda é cedo para afirmar qualquer coisa.
Fora da Netflix, temos o caso de Cavaleiros do Zodíaco, que é um pouco diferente das produções do streaming. A produção final será um longa-metragem, não uma série. Todo o universo criado por Masami Kurumada possibilita uma infinidade de narrativas possíveis para o filme e o roteiro não precisa, necessariamente, se prender a nenhum arco específico, afinal, será uma adaptação. Tudo isso será feito sob o olhar cuidadoso de uma parceria entre Sony Pictures e Toei. Apesar de não termos muitas notícias sobre o filme, as poucas informações são favoráveis. O longa será comandado por Tomasz Baginski e terá lutas coreografadas por Andy Cheng, que trabalhou em Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis. Além disso, Josh Campbell e Matt Stuecken assinam a versão mais recente do roteiro. O elenco conta com Mackenyu, Madison Iseman (Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado), Sean Bean (Game of Thrones), Nick Stahl (Fear The Walking Dead), Diego Tinoco (On My Block) e Mark Dacascos (John Wick 3: Parabellum). Ou seja, um gostinho de “vem aí” que supera todos os outros concorrentes.
O catálogo da Netflix é recheado de live-actions de diferentes qualidades. Temos desde os criticados Death Note e Attack on Titan até os aclamados Bleach e Samurai X. É preciso de mais algum tempo para cravar em qual das listas Cowboy Bebop vai entrar, mas com o que foi anunciado até agora, temos muitos motivos para esperar que as próximas aventuras da Netflix tenham potencial para abrilhantar o seleto clube dos live-actions elogiados.
O fato é que cada obra tem suas necessidades específicas para ser adaptada, mas isso não significa que os estúdios não possam aprender com erros do passado e encontrar formatos que funcionem para cada uma delas. A série Cowboy Bebop está longe de ser a pior adaptação de anime que vemos e os investimentos na produção provam que existe uma preocupação em trazer o produto com a qualidade que os fãs merecem. O desafio dos próximos live-actions será encontrar o equilíbrio entre o peculiar e o genérico para entregar algo que faça sentido tanto para os fãs quanto para quem nunca tocou no anime. Com um pouquinho de esforço extra, One Piece, Yu Yu Hakusho e Avatar podem superar os erros dos demais.