Ao fim da quinta temporada de Peaky Blinders, um Tommy Shelby (Cillian Murphy) desolado se perguntava: “Será que encontrei o único homem que não posso derrotar?”. O homem era o fascista Oswald Mosley (Sam Claflin), e a questão vinha após um grave revés nos planos do protagonista em assassinar o adversário. Era a maior derrota para Tommy e para a gangue Peaky Blinders desde o começo da série – e o seu peso, adequadamente, ainda é palpável na sexta e última temporada, que encerra a porção seriada da saga da família Shelby com um gosto de “quero mais”.
Os novos episódios começam de onde parou a temporada anterior e não demoram em estabelecer o destino de Polly, em face da morte de sua intérprete, Helen McCrory, em abril de 2021. A personagem, uma das mais queridas da série, segue uma presença forte até o capítulo final, permeando a rivalidade pré-existente entre Tommy e Michael (Finn Cole), o filho da matriarca.
A ação logo salta para 1933 – mas, aqui, o tempo não fez muito pelos traumas dos Shelbys. Tommy parou de beber para manter a mente mais lúcida, mas ainda é assombrado pelo passado; já Arthur (Paul Anderson), entregue ao vício, é uma sombra do homem que já foi. Ada (Sophie Rundle), por sua vez, enfrenta dificuldades ao tentar manter a família nos trilhos.
Neste contexto, Tommy ganha um rival a mais personificado em Jack Nelson (James Frecheville), tio de Gina (Anya Taylor-Joy) e gângster americano que não só controla boa parte de Boston como ainda ascendeu a uma posição de proximidade ao presidente Franklin Roosevelt. Seguindo nos passos da temporada anterior, o crime organizado e a política se misturam ainda com mais intensidade nessa reta final da série, com Nelson imiscuído com figuras como o próprio Mosley e sua amante, Lady Diana Mitford (Amber Anderson), também uma figura real usada para escancarar, sem quaisquer pudores, a mentalidade da elite simpática a Hitler e ao nazismo.
O texto do criador Steven Knight continua brilhante, mas nunca foi particularmente sutil, o que acaba por servir especialmente bem à série ao ilustrar as intensas maquinações dos grupos políticos que tentaram ampliar a frente fascista na Europa, e também o total desprezo desses mesmos grupos por aqueles que consideravam inferiores.
O real centro da temporada, no entanto, está na jornada de Tommy. O líder dos Peaky Blinders passou por grandes tribulações desde que começou a mudar a cara dos negócios da família, e não só começa a questionar qual será seu legado, como também busca com mais intensidade a sua redenção, uma forma de expiar os pecados já cometidos por ele – isso, claro, sem abrir mão de seus planos ambiciosos e de sua liderança. A combinação é, mais uma vez, retratada com louvor por Cillian Murphy, que entrega nesta temporada alguns de seus melhores momentos na série.
Como um todo, a produção, que reinventou os dramas de gângsteres na TV, segue em alto nível: cenários, figurinos, trilha sonora e elenco continuam afiadíssimos, com destaque, neste último, para Natasha O'Keeffe, que entrega momentos comoventes e dolorosos como Lizzie, a esposa de Tommy. Os fãs de longa data ainda são recompensados com sequências de ação espetaculares, dirigidas com segurança pelo diretor Anthony Birde.
A despedida da série, porém, deixa algumas pontas soltas, muito provavelmente para serem resolvidas no vindouro filme da produção, que começa a ser gravado em 2023. Uma trama em particular é desenhada muito rapidamente no último episódio, deixando a sensação de que poderia render muito mais. Nada disso chega a desabonar a série, uma joia que demorou a ganhar o reconhecimento merecido em meio ao amplo catálogo dos streamings. A sexta temporada é mais um “até logo” do que um “adeus” -- mas não deixa de ser um alento saber que em breve reencontraremos os Shelbys.