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Crítica

Cobra Kai solta a mão da nostalgia para se reinventar, mas vê fôlego se exaurir

Mesmo com carisma inabalável, série tropeça ao implodir desenvolvimento de personagens

18.07.2024, às 06H00.
Atualizada em 18.07.2024, ÀS 17H42

Que Cobra Kai nunca almejou renegar sua relação de nostalgia com os fãs não é segredo para ninguém. A série encontrou sucesso ao abraçar a galhofa e a memória afetiva, e saber se reinventar entre cada temporada sempre foi um dos grandes méritos do derivado de Karatê Kid. A insistência em repetir subtramas surgiam como obstáculos constantes, porém, e esse se torna o principal tropeço na Parte 1 da sexta temporada.

O quinto ano, um dos melhores da série, foi extremamente competente ao colocar um ponto final em arcos longos e preparar o terreno para o embate final. Com Terry Silver (Thomas Ian Griffith) derrotado e o Cobra Kai fora de cena, Daniel LaRusso (Ralph Macchio) e Johnny Lawrence (William Zabka) pareciam finalmente ter deixado a rivalidade para trás com a união dos dojos Miyagi-Do e Presa de Águia. O mesmo vale para o núcleo jovem, já que o conflito do quadrado amoroso entre Tory (Peyton List), Samantha (Mary Mouser), Robby (Tyler Buchanan) e Miguel (Xolo Maridueña) se arrastava há um bom tempo.

Ao entrar em sua sexta temporada, Cobra Kai parecia ter superado todos estes conflitos e estava pronta para olhar para o futuro. O amadurecimento de seus personagens, mesmo que conquistado a passos lentos, estava consolidado, como bem mostrado na cena de lavação de roupa suja entre Tory e Sam. O problema surge quando este desenvolvimento é implodido para gerar novas crises que justifiquem a extensão do novo ano em 3 partes de cinco episódios - um preço alto que nem mesmo o carisma inabalável da série consegue equilibrar.

Quem mais sofre com essa "reciclagem" de arcos é Johnny Lawrence, que volta a ganhar ares de protagonista no novo ano. O personagem que começou como um fracassado preso às glórias da juventude e ao rancor de sua derrota para Daniel havia encontrado o caminho para finalmente se tornar um adulto do qual sua família pudesseode se orgulhar. Desta forma, é quase injustificável que sua eterna implicância com LaRusso e o estilo Miyagi-Do continue ressurgindo, apenas para que as duas principais figuras da série voltem a ficar em lados opostos.

O problema dessa escolha não é criar novos conflitos entre os dois. Algumas cicatrizes levam tempo para curar e um acerto de contas não é uma declaração de paz definitivaatemporal. Pessoas têm dias ruins e é mais do que natural que recaídas aconteçam em Cobra Kai, afinal, a humanidade de seus personagens também é um dos principais atributos da série. Mas é difícil de engolir que o desenvolvimento de cinco temporadas vá por água abaixo com brigas e picuinhas tão pequenas como as mostradas no novo ano.

Quem também sofre com escolhas equivocadas é John Kreese (Martin Kove). De volta ao posto de principal antagonista da franquia, o vilão ganha um arco pouco crível mesmo para uma série sem vergonha de ser cafona - quem acreditaria que um senhor de 70 anos conseguiria passear pela selva para lutar com uma cobra em uma caverna no interior da Coreia do Sul? Sorte para nós que a figura do antigo mestre de Johnny é tão ameaçadora e intrigante que nos faz aceitar até as mais delirantes apostas de roteiro.

Apesar dos tropeços, a série fez a escolha certa ao soltar a mão da nostalgia para mais uma vez se reinventar. Daniel descobre segredos do passado de Sr. Miyagi (Pat Morita) que abalam a sua fé nos ensinamentos de seu antigo sensei, enquanto a seleção para escolher a equipe que representará o dojo no Sekai Taikai cria dinâmicas interessantes e ótimas cenas de luta. Até mesmo o retorno de Mike Barnes (Sean Kanan) é justificado de forma natural sem cair na armadilha do fan-service gratuito, que ainda surge na empolgante porém absurda luta entre bad boys contra Johnny.

Cobra Kai já mostrou mais de uma vez ser capaz de superar adversidades para entregar um final que faça jus à empolgação dos fãs. A chegada do Sekai Taikai e a introdução de novas rivalidades promete oxigenar a Parte 2 de sua última temporada, mas os tropeços do início da jornada ligam um sinal de alerta para uma série que parece ver seu fôlego se exaurir estando tão próxima de seu canto do cisne.

Nota do Crítico
Bom