As produções que envolvem lutas em sua linha narrativa dificilmente conseguem fugir da história de superação, do jovem que começa aprender artes marciais sem querer e acaba encontrando o caminho das vitórias, mas não sem antes passar por todos os percalços da vida. A série biográfica sobre Anderson Silva - até hoje o maior campeão do UFC, principal evento de MMA do mundo - tem tudo isso, mas vai além. Na verdade, muito além. A luta, no final, é só o fio condutor, quase um detalhe em uma trama mais profunda.
Anderson Spider Silva, do Paramount+, não tenta contar a história do ex-lutador de uma forma estritamente cronológica. Ela escolhe momentos específicos da carreira de Anderson - deixando a série surpreendentemente episódica, algo raro em produções biográficas - para sempre puxar para algum ponto de sua juventude, em flashbacks que explicam sua formação como pessoa.
Não há uma grande preocupação em repassar as histórias já conhecidas pelo grande público ou as lutas que fizeram dele um ídolo do esporte nacional. Elas estão lá como um contexto sobre o que eles realmente querem falar.
Anderson Spider Silva fala, principalmente, sobre família, sobre como - mesmo com todas as adversidades que começaram com ele sendo abandonado pela mãe para ser criado pelos tios (vividos pelos ótimos Seu Jorge e Tatiana Tiburcio) - ela sempre foi a base do atleta, desde muito pequeno até depois, quando ele formou a sua própria, com esposa e muitos filhos.
E está aí a força da série: mostrar essas histórias de bastidores, que pouca gente conhece, os conflitos e escolhas que fizeram Anderson se tornar um astro mundial. O que nos prende é que mesmo os assuntos espinhosos estão ali, trazendo humanidade a um personagem que até então era quase um super-herói da vida real. Lá vemos a difícil relação com sua mãe biológica, os casos de racismo que sofreu e moldaram seu caráter, os problemas conjugais com a esposa e até mesmo seu caso de doping no final da carreira.
Mas não posso deixar de falar das partes de luta em si. O começo da história de Anderson como lutador tem um quê de Cobra Kai/Karate Kid e termina com ótimas cenas de combate, onde até podemos pensar que o ator William Nascimento (que vive o lutador adulto e na maior parte da produção) tinha alguma experiência anterior com artes marciais (spoiler: ele não tinha).
Por mais romanceadas que possam ter sido as histórias de vida de Anderson Silva, Spider entrega um produto muito consistente tanto para iniciantes e iniciados sobre a vida do ex-lutador, quanto quem procura dramas familiares ou cenas de ação. É um bom exemplo de como pode-se contar jornadas de herói sem soar (muito) piegas ou com (muitos) clichês.