Desde o sucesso de O Arremesso Final, que contou a história de Michael Jordan em 2020, a Netflix encontrou um nicho nas séries documentais de grandes nomes do esporte e não abriu mais mão dele. O formato é basicamente o mesmo toda vez: imagens exclusivas de arquivo, entrevistas com todos os personagens principais e close-ups — ou silêncios conceituais — para dar peso dramático. E, por mais que soe repetitivo, Beckham é a prova de que mais uma vez a fórmula dá certo.
A produção oferece um olhar íntimo e por vezes fascinante sobre a vida do ex-jogador de futebol inglês David Beckham e sua esposa, a estrela pop Victoria Beckham. Dividida em quatro episódios de pouco mais de 1h cada, a série oscila entre o brilho dos holofotes e a humanidade por trás da fama, em uma tentativa de desconstruir o mito dos super-heróis que o casal muitas vezes pareceu ser.
No entanto, paralelamente, ela também revela a própria persona cuidadosamente gerenciada dos dois. Beckham deixa claro em vários momentos que a produção também é uma peça de relações públicas (ou assessoria de imprensa), destacando principalmente as versões idealizadas de David e Victoria, o que eles estão dispostos a compartilhar. Assuntos espinhosos, como os rumores de infidelidade de David, não são aprofundados, deixando uma lacuna na narrativa e levantando questões sobre a autenticidade do retrato pintado.
Ainda assim, a série serve como uma crônica fascinante do momento em que os jogadores de futebol transcenderam os gramados e se tornaram verdadeiras estrelas globais entre o final dos anos 1990 e início dos 2000. Com Beckham na vanguarda desse movimento, a produção oferece uma visão valiosa de como a cultura do futebol e a cultura das celebridades se entrelaçaram nas últimas décadas.
Beckham segue a fórmula já estabelecida pela Netflix em seus documentários de personagens vivos, aproveitando ao máximo o acesso sem precedentes aos arquivos pessoais e familiares do casal. As imagens raras e entrevistas de peso com figuras cruciais em sua carreira, incluindo os técnicos Alex Ferguson e Fabio Capello, bem como ex-colegas de equipe como Ronaldo, Roberto Carlos, Eric Cantona e Luis Figo, adicionam profundidade à narrativa e oferecem aos espectadores um vislumbre do mundo privado dos Beckham — e do próprio futebol
No entanto, Beckham também revela uma hesitação em mergulhar completamente na complexidade dos personagens e de seu relacionamento. Em vez de explorar completamente as nuances de suas personalidades, a série parece, em alguns momentos, seguir um roteiro já conhecido desse tipo de produção, criando uma sensação de déjà-vu para os espectadores familiarizados com o gênero.
Agora, para o espectador de fora dessa bolha que for fisgado pela série, Beckham vai entregar uma narrativa bem redonda de um personagem — na verdade dois, pois Victoria está lá o tempo todo — que até hoje povoa o imaginário dessa amálgama entre esporte e cultura pop. Para os iniciados, o sabor está nos detalhes. Para os iniciantes, será uma interessante jornada do herói.