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Séries e TV

Crítica

Daisy Jones & The Six faz boa adaptação, ainda que se sustente no melodrama

Adaptação da obra de Taylor Jenkins Reid dosou bem quando ser fiel à fábula roqueira setentista original

28.03.2023, às 19H00.
Atualizada em 17.08.2023, ÀS 09H04

A escritora Taylor Jenkins Reid sabe criar famosos fictícios que beiram ao verídico: o primeiro sucesso foi em 2017, com Os Sete Maridos de Evelyn Hugo, sobre uma atriz que brilhou na Hollywood do século passado; dois anos depois, ela atingiu um novo patamar com Daisy Jones and The Six: Uma História de Amor e Música. Com uma adaptação realizada pela Amazon Studios e a produção sob a chefia de Reese Whiterspoon, a série fidelizou o universo do livro, sem se amarrar aos mínimos detalhes, ainda que sob uma ótica limpa do caótico mundo dos rockstars.

A fábula roqueira não poderia ter uma trama mais instigante: no auge da carreira, uma banda acabou da noite para o dia, durante o conturbado período dos anos 70 regado a sexo, drogas e rock’n roll. Após duas décadas, um documentário é feito entrevistando os membros para revelar os segredos de seu passado. A minissérie é estrelada por Riley Keough, neta do músico Elvis Presley, que dá vida à personagem-título e contracena com Sam Claflin, Camila Morrone, Suki Waterhouse, Will Harrison e Josh Whitehouse.

Em uma mistura de entrevistas e flashbacks, acompanhamos a trajetória dos músicos até seus respectivos encontros para se tornarem o grupo que iria ser um sucesso. Parte da trama central são as idas e vindas do triângulo amoroso entre Daisy, o vocalista Billy (Clafin) e sua esposa Camila (Morrone), que gera o sucesso do álbum Aurora (que está disponível para ouvir nas plataformas digitais) e um dos motivos para o rompimento do grupo.

A adaptação conseguiu fidelizar o universo criado por Reids, como a customização dos personagens e a química entre eles. Porém, houve uma liberdade criativa bem trabalhada para enriquecer uma trama mais palpável com novos detalhes, sem ficar tão presa quanto The Last of Us. Um exemplo ficou a cantora e melhor amiga de Daisy Simone, interpretada por Nabiyah Be, que na tela engata um romance queer e expõe a diferença de tratamento entre músicos brancos e negros em início de carreira, sendo além de uma personagem suporte.

A obra escrita por Reid é carregada de personagens femininas fortes que saem dos tropos que geralmente essas produções reservam às mulheres que estavam no ambiente musical, seja como a groupie que só pensa em dormir com os músicos ou a cantora com pose de rebelde. Tanto Daisy como Simone e Karen (Waterhouse) vivem na pele os abusos que mulheres sofriam no meio artístico e deixam claro que não aceitam tal violência para alavancar na carreira. A série conseguiu adaptar das páginas e foi além para reforçar de maneira singela a amizade entre elas, seja entre Camila e Karen, ou a tecladista e Daisy, ou Camila e Daisy – mesmo tendo o conflito amoroso, a interação é bem trabalhada, sem parecer forçada.

Outro ponto positivo da minissérie foi deixar de lado o clima de tensão entre os personagens principais, que faz sucesso no livro, para relações mais explosivas e com atitudes que se encaixam no formato televisivo. Enquanto no livro paira a dúvida se rolou ou não um caso entre Billy e Daisy, a adaptação optou por ser mais “rock and roll” e mostrar os afetos e as desavenças. É inegável que Keough e Clafin possuem uma boa química, desde as batalhas de egos até os momentos de composição ajudam o espectador a sentir esse relacionamento conflitante. E Camila Marrone não fica devendo no papel da esposa que luta para manter a família unida, mesmo com a rotina e as tentações que Billy é cercado, e com muito mais pulso comparada à do livro, que se mantém na postura de dona de casa.

Daisy Jones and The Six teria de tudo para ser a próxima série de sucesso: um elenco renomado, músicas compostas por nomes da indústria musical como Phoebe Bridgers, Marcus Mumford (da banda Mumford & Sons), Madison Cunningham e Jackson Browne, mas derrapa ao querer adaptar e mudar elementos em direção ao trio do conflito principal. Quem esperava um Quase Famosos pode se sentir desapontado pela série focar mais nos relacionamentos entre Daisy-Billy-Camila do que explorar esse universo setentista criado por Reid.

Aliás, mesmo com as composições e a ambientação da história, a série não consegue quebrar essa barreira de parecer uma reprodução dos anos 70. As drogas, os fãs e o rock estão em cena, mas parecem muito distantes, e só estão sob os holofotes os personagens da trama principal. Com exceção de Graham e Karen, que possuem uma trama romântica, os outros membros como Eddie e Warren ficam mais de lado e seus minutos de deslumbre só aparecem no episódio final da série.

Outro ponto que deixa a desejar é a caracterização precária dos personagens quando estão em 1997, vinte anos depois dos acontecimentos. É plausível a série diminuir esse tempo – no livro são quarenta anos – para usar os mesmos atores, mas a falta de detalhamento com envelhecimento dos personagens destoa da narrativa. É imperceptível a diferença entre Daisy, Simone, Camila e Billy do passado e presente.

Apesar dos deslizes, Daisy Jones and The Six consegue trazer uma boa adaptação da obra original e sua construção consegue atrair tanto os fãs dos livros quanto novos com gosto do rock à la Fleetwood Mac. Agora é tempo se a Amazon pretende capitalizar mais a franquia com a ideia de turnê e/ou uma segunda temporada.

Nota do Crítico
Ótimo