Minissérie enxuta, com apenas seis episódios, Expatriadas tinha tudo para ser uma obra coesa e potente. Seu enredo tem drama, um certo mistério e abre espaço para interessantes comentários sociais; a ambientação em Hong Kong é uma novidade bem-vinda para uma produção americana; seu elenco entrega boas performances; e a direção da criadora Lulu Wang mostra um olhar atento e sensível sobre os personagens. Entretanto, o todo é maior do que a soma das partes, e o resultado é irregular e um tanto decepcionante.
Isso acontece devido a algumas escolhas criativas na própria concepção do projeto, uma adaptação do livro The Expatriates, de Janice Y. K. Lee. A primeira diz respeito ao tom da série do Prime Video, que pode ou não ter sido motivada por razões comerciais, mas que acaba criando falsas expectativas e, portanto, alguma frustração. A construção de um início intrigante parece um aceno a outras produções do gênero, como Big Little Lies e The Undoing -- que contam com a presença de Nicole Kidman no elenco e na produção. Não à toa, isso também revela que a atriz, embora talentosa, vem se repetindo em seus papéis na TV e no streaming.
Os dois primeiros episódios de Expatriadas são focados em um incidente trágico que conecta a vida de três mulheres americanas radicadas em Hong Kong. Desde o início somos informados de que a família Woo sofreu uma perda devastadora no último ano e que eles estão tentando, como podem, seguir em frente. O assunto ainda é doloroso para Margaret (Kidman) e um tabu, tanto em um bate-papo informal com estranhos quanto na falta de conversas honestas com o marido, Clarke (Brian Tee), e os próprios filhos.
Durante todo o piloto, o evento em si não é mencionado explicitamente, um recurso que atiça a curiosidade do espectador e nos leva a crer que estamos acompanhando uma típica história de crime, na qual devemos prestar atenção aos detalhes para tentar desvendar um enigma. Mas isso dura apenas até o episódio seguinte, que é um grande flashback que mostra exatamente o que aconteceu e qual é o papel da jovem Mercy (Ji-young Yoo) nisso tudo. A jovem, de ascendência coreana, vive mergulhada na culpa desde então, e o breve reencontro dela e Margaret na festa de 50 anos de Clarke causa em ambas um tremendo mal-estar.
A partir daí, no entanto, a minissérie segue outro caminho, que nada tem a ver com uma trama de investigação. Essa virada de chave influencia bastante a fruição do que vem a seguir, e isso não se resume ao desfecho - que não traz muitas respostas, é verdade, mas que faz muito sentido para um drama que se debruça sobre os traumas e dores de suas personagens. Por outro lado, para uma trama que aparentemente aposta tanto no suspense, pode soar apenas anticlimático.
Além disso, a decisão de dar tanto destaque ao incidente da família de Margaret nesse primeiro momento causa um certo desequilíbrio entre suas protagonistas, já que deixa sua amiga e vizinha Hillary (Sarayu Blue) em uma posição de coadjuvante durante boa parte da série. Seu casamento em crise com David (Jack Huston) e a pressão que sente para engravidar, ao mesmo tempo em que não deseja ter um filho, ficam em primeiro plano por muito tempo, e o interesse em torno disso se esgota rápido. Enquanto isso, suas questões familiares mais profundas, que vêm à tona em boas cenas intimistas com a mãe, os meios-irmãos e o pai, só ganham importância na reta final.
Curiosamente, outra escolha de Expatriadas que evidencia uma das fraquezas da produção surge em seu melhor episódio: o quinto, que gira em torno de personagens periféricos, como as empregadas de Margaret, Essie (Ruby Ruiz), e de Hillary, Puri (Amelyn Pardenilla). Nascidas nas Filipinas, as duas também são expatriadas e contam com bem menos privilégios, mesmo sendo consideradas “amigas” ou “da família”. No fim das contas, seus sonhos e seus desejos ficam à mercê dos caprichos ou do humor das suas patroas.
Essie e Puri trazem um colorido inédito à série, assim como outras tramas secundárias tratadas nesse episódio de 1h40 de duração, como o desenrolar de manifestações políticas em Hong Kong, vistas tanto sob a perspectiva dos jovens que participam dos atos quanto a de uma mãe preocupada com a segurança do filho diante das repressões violentas. Como capítulo isolado, Central é muito bem construído, mas parece um corpo estranho no conjunto da minissérie. Caso essas histórias costurassem a estrutura da temporada, a série teria muito mais a ganhar em camadas de significados e discussões sobre raça, classe e política, entre outros temas.
É uma pena ver essa oportunidade desperdiçada, porque Expatriadas se sai muito bem ao explorar os detalhes das relações e das dinâmicas sociais, como o fato de Mercy precisar lembrar o tempo todo que é de origem coreana e não fala cantonês ou de Margaret tratar um cidadão local como funcionário do mercado apenas por sua aparência. Da mesma forma, as imagens de Hong Kong que vemos na ficção têm sempre algo a dizer, seja no movimento frenético ou no vazio de suas ruas, seja nas imponentes construções de luxo ou na simplicidade do atrativo comércio de rua. Ao tentar parecer algo que não é, a minissérie perde força justamente no que a torna única.