Séries e TV

Crítica

FUBAR faz jus ao significado da palavra em alemão: terrível

Nova série da Netflix, estrelada por Arnold Schwarzenegger, só consegue acertar quando se livra das fórmulas e aposta nas relações humanas e no coração

30.05.2023, às 13H13.

Arnold Schwarzenegger está de volta. Depois de algum tempo afastado das câmeras, o astro é a estrela de FUBAR, série original da Netflix que teve a primeira temporada completa lançada. 

Na produção, Arnie é Luke Brunner - um agente secreto da CIA prestes a se aposentar. Ele, que sempre escondeu da família sua vida dupla se passando por um revendedor de equipamentos de musculação, aceita a contragosto uma última missão. Já em campo, o espião descobre que a tarefa é, na realidade, salvar a vida da própria filha, Emma (Monica Barbaro, de Top Gun: Maverick) - ela também uma agente secreta da agência, para a surpresa do pai. Ambos agora devem lidar com os sentimentos conflitantes causados por tantas mentiras e ausências, isso enquanto precisam ir atrás de um terrorista ligado ao passado de Brunner: Boro Polonia (Gabriel Luna), que quer vingança. 

A partir disso, constrói-se um roteiro que foi feito na medida para homenagear Schwarzenegger. Cada fala, cada referência, cada acontecimento, foram colocadas ali como uma piscada aos fãs do ator, em uma história claramente inspirada em True Lies - um dos maiores sucessos da carreira do austríaco. 

O que poderia dar errado, não é mesmo? Pois dá, sim.

FUBAR

O FUBAR do título é uma gíria militar e um acrônimo, que quer dizer “fucked up beyond all recognition”. Ou, em bom português, “fodido e mal pago”. A expressão foi cunhada ainda durante a Segunda Guerra Mundial, inspirada por uma outra palavra que os soldados americanos ouviam dos alemães quando a situação saia de controle: “furchtbar”. “Terrível”, em tradução literal.

Na nova série, o criador Nick Santora (de Prison Break) quis brincar com a ideia dentro da fórmula dos seriados de ação. Dessa forma, a maior parte dos episódios acaba com o chamado “cliffhanger”, aquele momento máximo de tensão que nos deixa sem saber o que vai acontecer a seguir - ou seja, o momento do “ferrou”. FUBAR.

A artimanha também cai como uma luva dentro da estratégia maior da Netflix, que é prender os seus olhos na tela, dentro do app deles, o máximo possível. Só que, por conta da piadinha conceitual (ou, talvez, para deixar o streaming contente), a série sacrifica totalmente o seu andamento. Trechos finais de alguns episódios são claramente acelerados, com eventos disparados à velocidade de metralhadora, simplesmente para se alcançar o cliffhanger. Pior: na maioria dos casos a situação é resolvida em poucos minutos do episódio seguinte, com uma solução baseada em uma pseudociência difícil de acreditar. Há limite para a suspensão de descrença. 

Isso faz com que a primeira metade da temporada seja difícil de digerir - e mesmo os clichês das produções de TV dos anos 1980 e 1990, que poderiam render alguns sorrisos, se esvaem. Há, ainda por cima, um sério comodismo visual, com os diretores e produtores preocupados apenas em entregar o que está no roteiro sem qualquer ambição imagética. Nem nas cenas de ação, muito menos nos trechos de humor. 

É a parte terrível, no pior sentido da expressão. 

Há coração, ao menos

FUBAR acerta de verdade quando percebe que não precisa ser um set up para um acontecimento de vida ou morte aos 45 do segundo tempo. Isso ocorre quando explora a interação entre os dois protagonistas. 

Apesar do espectador não ser um espião da CIA (eu acho…), é impossível não se relacionar com a dinâmica entre Emma e Luke. É por isso que a segunda metade da temporada ganha força. Não que seja perfeita - os planos de Boro e as maquinações para pará-lo são fraquíssimas -, mas a série abraça mais o coração dos personagens estabelecidos nos primeiros episódios. Ganha profundidade as relações entre o elenco secundário, que param de andar em círculos ou serem apenas escadas para as piadas. 

É possível também perceber o coração de Schwarzenegger em cena. Não que dizer isso seja surpreendente, mas a atuação nunca foi o seu forte. Porém, o astro sempre usou o seu famoso sotaque, tipo físico e cacoetes para contornar essa deficiência. Funciona. Contudo, há um peso diferente na voz de Arnie em FUBAR. 

O ex-governador da Califórnia se separou em 2021, após um casamento de 25 anos. Pelo que a imprensa noticiou na época, entre os motivos do divórcio está uma filha que o ator teve com uma ex-empregada da família, isso quando já estava casado. 

Coincidência ou não, há um paralelo entre ficção e vida real. Luke Brunner não só esconde da esposa a vida dupla, como assume também uma figura paterna para Boro – ajudando a criá-lo e se sentindo culpado pelo personagem de Gabriel Luna ter crescido sem o pai, morto pelo agente. 

“Não tenho orgulho dos erros que cometi e causaram dor à minha família e nos separaram”, disse Arnold em uma entrevista em 2014.

Pois é. FUBAR. 

Nota do Crítico
Regular