Séries e TV

Crítica

Game of Thrones - 8ª temporada

Série termina sem a grandiosidade esperada, se perdendo em sua própria narrativa

20.05.2019, às 00H01.
Atualizada em 22.05.2019, ÀS 11H53

É um sintoma comum entre séries que se tornam grandes e longas demais não terminar bem. Isso aconteceu com Lost, o grande exemplo de seriado que se perdeu em sua própria narrativa, e também em Dexter, que começou incrível e terminou decepcionante. Embora seja difícil de admitir, este é o sentimento com o final de Game of Thrones, transmitido neste domingo (19) pela HBO. Embora o episódio tenha conclusões interessantes para alguns personagens, o sentimento geral é que o que foi apresentado em tela não foi construído de forma satisfatória.

Após o ataque de Daenerys a Porto Real, Tyrion caminha pelos escombros e chega até os corpos dos irmãos mortos. A cena é importante, primeiro, para confirmar a morte de Cersei e Jaime (algumas teorias diziam que um deles poderia estar vivo), e também para dar uma grande cena a Peter Dinklage, tão perdido nas últimas temporadas. É poderoso ver sua tristeza frente à morte dos irmãos, mesmo com tanto ódio que existia em Cersei. No fim das contas, o personagem deixa claro que tal sentimento não era recíproco e que, no fim das contas, ele só queria ver sua família bem.

O capítulo continua e há uma grande apreensão pela presença de Daenerys. A última cena com o rosto da personagem tinha sido pouco antes da destruição de Porto Real e ainda restava dúvidas sobre sua sanidade. Exatamente por isso foi curioso encontrar uma Daenerys visualmente lúcida, feliz com sua vitória e comemorando com seus exércitos. Quando a rainha entra na sala do trono e é confrontada por Jon Snow, ela está confiante de que fez a coisa certa. Em sua próprias palavras, Cersei “usou a inocência” do povo contra ela e havia apenas uma escolha para conseguir o poder.

Dessa forma, Game of Thrones entrega sim uma “rainha louca”, mas não do modo tradicional como era esperado. Daenerys não se tornou paranoica como seu pai e queria “queimar todos”. O seu delírio, na verdade, veio do poder, que ela deixa muito claro que gostaria de levar para todos os locais do mundo. Inclusive, no extenso diálogo entre Tyrion e Jon quando o primeiro é preso por traição, o Lannister faz as vezes do público ao listar todos os momentos em que Daenerys foi cruel, de certa forma, e como o encorajamento daqueles que o seguiam a fizeram se sentir poderosa. É quase como se o roteiro culpasse o público por ter seguido uma líder tão cruel.

E esse é um dos pontos que mais incomoda no texto de Game of Thrones, especialmente neste final. Há uma sensação de que nada considerado importante durante as temporadas tem realmente sentido: a história do Rei da Noite não foi contada; a ressurreição de Jon e até mesmo a busca pelo Trono de Ferro, que deixa de existir. A série criou sua narrativa em torno de pontos considerados cruciais, apenas para depois dizer que nada disso é o foco. Há uma certa arrogância em tal conceito, já visto em outras atrações.

Ao fazer isso, produtores e roteiristas brincam com a percepção do público, talvez querendo mostrar que a história é mais simples do que se poderia imaginar, mas não há evitar a sensação de ter sido enganado por tantos anos. Especialmente porque as grandes reviravoltas deste finale simplesmente não fazem sentido. Daenerys é traída pela última vez e morre nos braços de Jon Snow, um final completamente amargo para uma construção tão forte durante tanto tempo. Novamente, parece que a série culpa o público por amar uma personagem que eles ensinaram a amar. Se Daenerys foi traída na frente do trono com o qual sonhou por tantos anos, os fãs também foram traídos na conclusão que esperaram por anos.

Entre os pontos positivos, há várias rimas narrativas com episódios passados. O discurso que Daenerys faz aos Dothraki retoma a fala dela para eles na sexta temporada; a independência do Reino do Norte, agora comandado pela Rainha Sansa; a ida, ainda que amarga, dos Imaculados para a Ilha de Naath; o livro das Crônicas de Gelo e Fogo entregue por Sam. Todos esses pequenos momentos relembram os fãs mais assíduos dos motivos para amar Game of Thrones, mas não são suficientes para apagar as cenas confusas e desnecessárias do episódio - sim, reunião do Rei Bran com seu conselho, estamos olhando para você.

E aqui fica a questão: será que o final apresentado hoje será o mesmo dos livros? Será que Martin realmente construiu sua narrativa durante tantas décadas para colocar alguém totalmente improvável no “trono” e, acima de tudo, não concluir narrativas importantes? Aos fãs só resta esperar e torcer para que, qualquer que seja o encerramento, ele seja melhor construído do que foi aqui. Game of Thrones chega ao final melancólica para os personagens e fãs. E não por não ter entregado um final "felizes para sempre", mas sim por ter deixado de lado coisas citadas como importantes anteriormente. A série que conquistou multidões pelo mundo se perdeu em sua própria grandeza, ironicamente, da mesma forma que Daenerys se perdeu ao alcançar seu objetivo.

Nota do Crítico
Bom