Mesmo cientes da quinta e última temporada, não pudemos nos preparar completamente para a despedida de The Marvelous Mrs. Maisel. Após a sucessão de revezes na vida de Midge no ano anterior, a série ousa com novos recursos narrativos para alinhar seus personagens e, mesmo com imperfeições, traz um encerramento digno para a série estrelada por Rachel Brosnahan.
Depois de negar a oferta quase irrecusável de Lenny Bruce (Luke Kirby), Midge começa os novos episódios entre a vida e a morte, por conta da nevasca da temporada anterior. Ao ser resgata mentalmente pela empresária e amiga Susie (Alex Borstein) e se ver em esgotamento, a comediante coloca um ultimato para si mesma: investir na carreira por mais seis meses. Com seus esforços, Midge sai do cabaré onde fazia shows para ser a única roteirista mulher do The Gordon Ford Show, o talk show mais badalado da época e também o programa com o qual ela havia tido uma epifania sobre o seu sucesso na penúltima temporada.
Logo de início, são perceptíveis as mudanças da série ao trazer novos ares para a história, como os saltos temporais entre o passado e o futuro. O recurso funciona como uma recompensa ao espectador, que finalmente tem um vislumbre do sucesso que a protagonista conquista e suas consequências na vida pessoal, como esposa e como mãe. Embora seja novidade na estrutura de The Marvelous Mrs. Maisel, acelerar o tempo com os saltos de “destino final” é a maneira encontrada para tornar a despedida mais conclusiva em séries muito diversas, como no time lapse frenético de A Sete Palmos, e há poucas semanas Barry também usou a ferramenta para recontextualizar sua narrativa e apontar para a reta final.
Mesmo com a mudança, The Marvelous Mrs. Maisel mantém a essência que cativou os fãs, a mistura de diálogos ágeis, situações inusitadas, personagens interessantes e, claro, os monólogos de stand-up de Midge. É reflexo de um trabalho árduo dos criadores Amy Sherman-Palladino e Daniel Palladino, que se mantiveram constantes ao longo de seis anos, mesmo com uma pandemia paralisando as produções.
Apesar da saída conclusiva dos saltos ao futuro, a temporada deixa pontas soltas, como as participações superficiais de Milo Ventimiglia e a ausência de Sophie Lennon (Jane Lynch). O foco permanece no clima agridoce do triângulo amoroso entre Midge, Joel e Lenny, os conflitos entre Susie e seu relacionamento conturbado com a máfia, e as atrapalhadas de Rose e Abe (Tony Shalhoub) lidando com os netos. Com estes últimos, a série se supera ao apresentar um arco tão bem amarrado e desenvolto para os pais da protagonista que eles já merecem um derivado próprio.
Se os saltos futuros denotam uma certa acomodação da série em si mesma, isso fica mais demarcado na homenagem que The Marvelous Mrs. Maisel faz ao seu legado no episódio “Zombenagem”. A narrativa presta um emocionante tributo à jornada de Midge e Susie, e também cita Jackie, dono do Gaslight, interpretado por Brian Tarantina, ator que morreu em 2019. Cuidado similar não é visto ao longo das cinco temporadas em relação às tramas queers. Após a narrativa tímida (sem trocadilho) sobre Shy Baldwin (Leroy McClain), e sua jornada como negro e gay nos Estados Unidos da década de 60, o casal Palladino adiciona um novo conflito revelando que Susie teve um romance curto e intenso com a esposa de Gordon, Hedy (Nina Arianda). A ideia poderia servir de aceno de representatividade, mas se presta apenas a impulsionar o crescimento de Midge, no contexto dos erros da terceira temporada.
Por falar em relacionamentos, a última parte trabalha bem a ideia de que, apesar dos romances passageiros de Midge, a verdadeira dupla sempre foi com Susie, que esteve ao seu lado desde o início do stand-up. Assim, The Marvelous Mrs. Maisel se mantém fiel a si mesma ao preservar a mensagem empoderadora, bem apresentada pelas atuações de Brosnahan e Borstein. No fim, faz sentido que a série escolha nesta temporada o caminho conclusivo e seguro para sua narrativa: o universo reconfortante de suas jornadas motivacionais, bem lapidado ao longo de cinco temporadas, não pedia um desfecho muito distinto disso.