A TV sempre foi um bom meio para se explorar as complicadas e longas histórias dos super-heróis vindos dos quadrinhos. Múltiplas linhas temporais, dimensões paralelas, várias encarnações diferentes de um mesmo herói... As possibilidades são infinitas. O problema até pouco tempo atrás, no entanto, era o formato a qual as produções estavam limitadas, com episódios independentes do resto da trama, produções longas e arrastadas e uma narrativa completamente irregular. The Flash começa seguindo essas diretrizes, mas evolui pouco a pouco para se tornar uma das mais divertidas e completas adaptações de HQ para a TV.
Em sua segunda encarnação nas telinhas (saiba mais sobre a primeira série, de 1990), o Velocista Escarlate chega personificado em Barry Allen (Grant Gustin). O jovem de 20 e poucos anos ganha superpoderes após a explosão do acelerador de partículas em Central City, deixando-o nove meses em coma. Depois da recuperação, Barry segue para ajudar sua cidade e protege-la dos vilões - que também ganharam poderes sobrenaturais com o acidente.
O formato a qual The Flash se propõe é curioso, mas compreende os estágios de amadurecimento de Barry com relação a seus poderes. A série pode ser dividida basicamente em duas partes: a primeira mostra o estudo, treino e aprimoramento de sua velocidade. Inicialmente, Barry ainda não sabe ao certo do que é capaz. O apoio e ajuda de Dr. Harrison Wells (Tom Cavanagh), Caitlin Snow (Danielle Panabaker), Cisco Ramon (Carlos Valdes) e Joe West (Jesse L. Martin) guiam Allen através de todas as dificuldades, ultrapassando obstáculos como medos e hesitações do recém-super-herói.
A partir do oitavo episódio ("Flash vs. Arrow", um excelente crossover entre as séries da CW), Barry já está estabelecido como herói - que é quando começa a segunda parte. Seus limites já foram testados e ele está pronto. É aí que The Flash dá um passo a frente e decide começar a explorar uma mitologia mais complexa e profunda, introduzindo o elemento da viagem no tempo. Dr. Wells, que era apenas um cientista solícito, despejando recursos em Barry e suas habilidades, vira Eobard Thawne, o viajante no tempo em busca de vingança.
Essa guinada transforma The Flash e introduz uma escalada de novos e complicados conceitos que não são comumente utilizados em uma série da TV aberta americana. O feito notável é que, mesmo tendo 23 episódios para contar essa complexa história, os roteiristas ainda conseguem explorar toda a transformação de um jovem comum em super-humano, além de deixar extremamente claro todas as propostas introduzidas sobre o multiverso. A série começou andando a passos lentos, estabelecendo delicadamente cada um de seus elementos e, ao final, já corria em velocidade Mach 2.
Outro grande feito foi utilizar Cisco como o principal veículo de easter eggs. O pupilo de Wells foi o alívio cômico em muitos momentos, soltando frases de efeito remetendo à cultura pop, além de ser um ótimo meio de introdução para os esquisitos nomes de personagens dos quadrinhos. Cisco, que começou insosso e sem graça, passou a ser um dos mais divertidos do programa, deixando o ar mais leve até em momentos de grande tensão.
Mas vale apontar também que em um mundo onde efeitos de computação gráfica são um recurso caro e para longo prazo, The Flash surpreende em se manter uma produção de relativo baixo orçamento e ainda sair bem-sucedida. Um bom exemplo é o gigantesco Gorila Grodd, que impressiona com sua veracidade mesmo em cenas bem iluminadas, provando que é possível fazer um pouco mais mesmo com um pouco menos. É improvável que Grodd venha a ser um vilão fixo na série devido ao custo de sua animação, mas aparições futuras são possíveis - e prováveis.
Enfim, The Flash peca no que parece ser um ponto fraco da DC em suas produções audiovisuais: mulheres. Não há ainda uma boa personagem feminina - e mesmo que Caitlin chegue bem próximo do que precisamos ver nas telas, Iris (Candice Patton) é o completo oposto. Mimada e enfadonha, ela por vezes chega a atrapalhar o desenvolvimento da trama, trazendo à tona seus insignificantes problemas e deixando de lado coisas mais interessantes a serem abordadas. Apesar dos últimos episódios da temporada terem mudado um pouco isso, ainda fica em falta a presença de uma força feminina nesse tipo de produção.
A primeira temporada foi mais um passo certo da CW no universo compartilhado que está sendo criado com Arrow e Legends of Tomorrow. Com um consistente episódio final, cheio de pistas sobre o que vem por aí no segundo ano, fica claro que os roteiristas sabem o que estão fazendo e têm grandes planos - possivelmente até um segundo Flash.