The Good Doctor/ABC/Divulgação

Séries e TV

Crítica

The Good Doctor - 2ª temporada

Série se debate para ser menos procedural, mas segundo ano se mantém mediano

12.04.2019, às 08H53.

Os procedurais foram, por anos, a galinha dos ovos de ouro da televisão americana. Eles eram confortáveis, acessíveis, podiam ser vistos fora de ordem porque a trama central era mínima, possibilitando a liberdade do espectador de não se envolver tanto assim. O formato tinha leveza, mas também não tinha complexidade. Arquivo X, de Chris Carter, foi o primeiro fenômeno procedural que transformou esse sub-gênero em algo mais, apoiado em mitologia, provocando a necessidade de fidelidade, evidência de que o espectador estava pronto para o apego.

Séries médicas são clássicas nessa área. ER - Plantão Médico tinha uma pitada de trama central na vida dramática de seus médicos e residentes, o que se repetiu em outros títulos, geralmente replicando as mesmas fórmulas: relacionamentos frustrados, flertes, alguém com câncer, alguém recebendo um parente complicado, alguém cometendo um grande erro profissional... Não eram necessariamente tramas que faziam parte do conceito da produção, mas tramas que preenchiam episódios ou davam aos atores oportunidades de saírem do lugar-comum. O que explicava, por exemplo, a capacidade que essas séries tinham de continuar no ar mesmo que muitas mudanças de elenco acontecessem no decorrer dos anos.

O sucesso também é um problema na hora de ser um procedural médico na era pós Grey’s Anatomy e pós House. Com relação a The Good Doctor o caso é mais grave porque seu criador também é o criador de um desses sucessos. Esse tema retorna porque a cada semana em que The Good Doctor deveria se afastar de House, ela se aproxima. Na primeira temporada, todos os episódios se construíram seguindo a mesma dinâmica (e muitas vezes os mesmos casos) da primeira série de David Shore. Agora, na segunda temporada, ele chega a preterir seu protagonista a uma posição de patologista, um cargo que repete de forma absurda a engrenagem de diagnósticos que ficou famosa em House. Fica difícil entender e aceitar esses novos caminhos para o futuro da série.

The Good Confort

Durante a primeira parte dessa segunda temporada, The Good Doctor estava confortável e preferiu não fazer movimentos muito eloquentes. A volta de Lea (Paige Spara) deveria ser a grande chamada para a temporada, mas sua saída e seu retorno continuam sem contexto e sem relevância. A personagem foi uma interlocutora de Shaun (Freddie Highmore) em inícios e fins de episódio, não servindo, em momento algum, como elemento essencial dos eventos. Tanto que esse papel de coajuvante feminina oscila a ponto de uma simples participação (como a de Jasika Nicole), já conseguir desviar as atenções de Shaun quase imediatamente. O autismo do protagonista é uma ferramenta para as sequências médicas, mas os roteiros da série capengam na hora de transformá-lo em um indivíduo além da profissão.

Assim como Wilson era a âncora de House, Glassman (Richard Schiff) é a âncora de Shaun. Mas, para que o talento de Schiff não fosse "desperdiçado", um câncer foi providenciado para sensibilizar o espectador. Não funciona. A estrutura dos episódios é quase idêntica todas as semanas: Lea e Glassman começam os episódios, terminam os episódios, aconselham Shaun e fica tudo nessa zona de segurança. Nem mesmo o grande arco da contaminação no hospital conseguiu sair do óbvio, porque o extremo nunca promove o extremo de verdade. O conforto é a palavra de ordem em The Good Doctor.

A série sempre teve uma discussão interessante sobre como o autismo de Shaun não parecia compatível com uma profissão tão delicada. Com um time de coadjuvantes tão apáticos, a produção foi atrás de Daniel Dae Kin (que também é  produtor da série) para viver o novo chefe da cirurgia que voltaria a questionar esse lugar de Shaun na rotina hospitalar. Essas são colocações importantes, que enriquecem os roteiros. Freddie teve uma ótima oportunidade de aprofundar as respostas emocionais do personagem, mesmo enquanto já sabemos que tudo vai voltar ao mesmo lugar. Shaun é sempre infalível. Mas quando o episódio final da temporada chega, a tensão construída se destrói já que as decisões criativas protegem essa zona de segurança a todo custo. Está eliminada a possibilidade de diversificar a costura central.

Mesmo assim, a série segue sendo o "cantinho do coração" dos espectadores, que podem continuar assistindo sem medo de perder qualquer coisa no caminho. É uma série sobre um "bom doutor", com um bom potencial, um bom aspecto social, mas que não é tão boa assim.

Nota do Crítico
Bom