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Crítica

Quinta temporada de The Good Doctor encontra conforto no abandono da lógica

A vida no Hospital St. Bonaventure nunca foi tão agitada... e tão novelesca

19.05.2022, às 10H17.

Se tem uma coisa da qual The Good Doctor precisa se orgulhar é de oferecer ao seu espectador absolutamente tudo que ele espera de uma trama médica clássica. Não há absolutamente nada que você já tenha visto em alguma outra série hospitalar de sucesso que não tenha passado pelo universo genérico da criação de David Shore. O objetivo nunca foi a originalidade, embora, à primeira vista, a série tenha tentado nos convencer de que estava na grade para ser levada a sério.

De certa forma, olhar em retrospectiva como o autismo foi usado como escudo intelectual deixa a produção ainda mais enfraquecida. Tudo que ela poderia abordar com relação a Shaun (Freddie Highmore) se esgotou nos dois primeiros anos, o que entregou para a audiência um futuro pasteurizado. Os episódios de The Good Doctor são um eterno deja vu. Mas, é preciso reconhecer que existe uma parcela da audiência que está em busca exatamente dessa sensação de familiaridade. Uma vez bem feita, a roda não precisa ser reinventada.

Mesmo que em vários momentos de sua trajetória a atração tenha apelado para o eterno vai e vem de casais e trocas de posições de poder como recursos fundamentais, ela manteve sua estrutura dentro do mínimo exigido de lógica e elegância. A realidade daquele hospital ainda era completamente romântica, mas nada disso se difere do que outras produções do gênero já tinham estabelecido. Apesar de não oferecer muito, o que era oferecido estava dentro do esperado.

Até que, na quarta temporada, o gosto das reviravoltas foi se tornando um vício para os roteiros, levando tudo que conhecíamos sobre a série até “ousadias” que ela parecia não estar disposta a cometer. Nessa quinta temporada, as decisões narrativas jogaram pela janela a discrição e a lógica, produzindo enredos que nos mantiveram envolvidos na temporada, mesmo que às custas de qualquer dignidade. E foi com uma vilã chapada, com devaneios entorpecidos e até com um reality show, que The Good Doctor produziu seu ano menos sonolento (e mais absurdo).

Bruxa de Salen

Quando a quarta temporada terminou, o que foi prometido para a audiência pouco tinha a ver com o hospital. O casamento de Lea (Paige Spara) e Shaun, contudo, foi guardadinho numa gaveta, para que o enredo abrisse espaço para a promissora chegada de Salen (Rachel Bay Jones), a nova “dona” do pedaço, que veio de uma maneira até surpreendente e jogou com a ambiguidade até boa parte dos dez episódios em que sua participação foi o centro das atenções.

Plots de novas presidências também estão na cartilha dos dramas hospitalares, mas o começo da quinta temporada de The Good Doctor jogou bem com a possibilidade de que Salen não fosse uma vilã. O sistema de saúde americano chama pacientes de “clientes”, mas em vários momentos da personagem, ela era descrita com complexidade, sendo capaz de tomar decisões empresariais severas, mas também mantendo em pauta sua empatia. Era evidente que pairava sobre ela uma sombra de desconfiança, mas até isso funcionava bem para os objetivos do enredo.

Os problemas começaram quando Salen subiu para a superfície e após um erro grave envolvendo medicamentos vencidos, a vilania desenfreada foi colocando a coerência para escanteio. A partir do ponto em que tudo se torna um jogo de chantagens, The Good Doctor abre as porteiras do folhetim descarado. Daí para frente foi só ladeira abaixo... Mas, foi uma ladeira abaixo divertida. Traições, armações, frases de efeito.... Tudo acaba voltando para o mesmo lugar, como é bem de praxe nesse mundo das narrativas genéricas.

O apogeu do absurdo veio quando o casamento de Shaun voltou para a pauta através de um reality show. A ação final desse quinto ano se concentrou no casal principal usando a participação num reality de casamentos para que pudessem não precisar pensar em como organizariam o seu. Nada salva a série do ridículo dessa situação; nem o melhor caso da temporada (sobre o sujeito que doa um órgão para o amigo e acaba provocando um câncer no transplantado), nem a volta de Claire (Antonia Tomas), nem a simpatia da Dra. Jordan (Bria Samoné) e nem o bem-vindo romance de Asher (Noah Galvin) com um enfermeiro. A temporada termina ágil... e sacrificada.

O gancho do episódio final “homenageia” um momento do clássico ER, mas isso só confirma como tudo em The Good Doctor está ultrapassado. Todos os enredos são velhos, todas as soluções são previsíveis e agora, mais que nunca, todos os caminhos levam ao escárnio. 

Nota do Crítico
Regular