O quarto ano de Vikings, o épico nórdico do History Channel, trouxe desde o príncipio algumas decisões ousadas: não só era preciso dar sequência ao excelente terceiro ano como também refletir o impacto das traições e novas alianças nos personagens sem abrir mão de encenar a história real. Foram necessários dez episódios extras, mas o seriado novamente entregou uma aventura de peso - apesar de alguns tropeços no meio do caminho.
[Cuidado, possíveis spoilers abaixo!]
Após quase invadir a cidade de Paris, Ragnar Lothbrok (Travis Fimmel) é atingido por uma doença que coloca sua vida em risco. A saúde problemática do guerreiro dá o tom do restante dos episódios, que narram o início de sua decadência até seu eventual fim. Cada derrota afeta profundamente a opinião do povo sobre o herói, que passa a ter sua sanidade constantemente questionada por família, colegas e até mesmo pelo público. Acompanhar o desenvolvimento de Ragnar é um dos fatores que torna Vikings tão interessante. O conflito que se desenvolve na mente dos espectadores ao gradualmente perceber que o nórdico talvez tenha se deixado afetar pelas suas glórias e traumas é uma prova do quão efetiva e bem feita a caracterização do personagem é.
Por três temporadas Lothbrok carregou o seriado nas costas com sua sabedoria, fúria e espírito aventureiro, e é justamente o contraste de vê-lo como um problemático e egocêntrico velho que deixou de estar no ápice de sua mente e corpo que torna a primeira metade tão marcante. A parte dois também não deixa a desejar ao focar-se na redenção antes do fim, que é realizada como um grande fan service à todos que acompanharam Vikings desde o início ao revisitar relacionamentos e decisões do passado na esperança de deixar tudo certo antes de sua despedida. Felizmente, alguns personagens secundários ganharam os holofotes para compensar a perda.
Por mais que Rollo (Clive Staden) tenha saído da sombra do irmão e Lagertha (Katheryn Winnick) conquistado independência e poder, o verdadeiro destaque fica por conta dos descendentes de Ragnar, especialmente Ivar (Alex Hogh Andersen) e Bjorn (Alexander Ludwig). Com uma estranha viagem de superação, Bjorn começou a quarta temporada deixando para trás seu papel secundário para assumir a responsabilidade de ser um homem adulto, recuperando sua mulher Torvi (Georgia Hirst) das mãos de um Conde rival e liderando uma incursão por terras inexploradas até então. É impossível não ver muito do pai no descendente Lothbrok, que resgata o espírito aventureiro e sabedoria do recém-falecido protagonista.
Já Ivar é um caso interessante de uma infância mimada que resultou em um perigoso adulto, incapaz de controlar sua fúria e disposto a destruir o mundo apenas para provar que é tão capaz de fazê-lo como qualquer outra pessoa que não disponha das mesmas limitações físicas que ele. Seus ataques raivosos combinados com uma mente brilhante para estratégias o tornam em um personagem imprevisível e ameaçador sem deixar de esbanjar carisma. Se Bjorn remete à Ragnar, Ivar parece ter sido criado por Rollo em razão de sua ambição e raiva incontrolável.
Com personalidades fortes estabelecidas, o futuro da série pode ser muito proveitoso com um novo conflito entre irmãos. O problema é que nem todos receberam o mesmo tratamento: Ubbe (Jordan Patrick Smith), Hvitserk (Marco Islo) e Sigurd (David Lindstron) não só tiveram pouco tempo de tela como também, nos raros momentos em que ganham algum destaque, não exibem motivações próprias ou individualidade. Se o confronto fraternal for o foco da quinta temporada, algumas mudanças significativas terão que acontecer.
Essas inconsistências parecem pequenas comparadas com os acertos dessa temporada. O seriado não só trouxe uma perspectiva inédita sob seu protagonista como também demonstrou ter um universo rico e interessante o suficiente para funcionar sem ele. Ainda falta melhorar algumas tramas secundárias e tratá-las com a mesma atenção que os núcleos principais, mas do jeito que está Vikings tem um futuro bem interessante pela frente.