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Séries e TV

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Lembra desse? Batman, a série de TV

Tudo sobre o seriado da década de 60

27.02.2003, às 00H00.
Atualizada em 30.03.2019, ÀS 15H14

Adorada por muitos e execrada por indignados fãs do Cavaleiro das Trevas que não entenderam a piada, a série cômica do Batman realmente não é um prato de fácil digestão. Ou você embarca no espírito anárquico que ela impõe ou muda de canal. Os perigos absurdos são tantos e a bondade dos heróis é tamanha que chega a ser irritante. Todavia, embalado pela singela música-tema composta por Neil Hefti e executada pelo grupo The Ventures (cuja única palavra era o nome do herói), o seriado esbanjava charme: Ta-na-na-na-na....Batman!!!!

No Brasil, a série chegou pela TV Paulista, canal 5. A dublagem, nas duas primeiras temporadas, ficou a cargo dos estúdios AIC São Paulo, com os heróis a cargo de Gervásio Marques e Rodney Gomes. No último ano, a dupla receberia as vozes de Newton da Matta e Luís Manoel, do estúdio TV Cine-Som.

O programa é resultado dos delírios do produtor William Dolzier. Até se envolver no projeto, ele nunca havia lido gibis. Ao se interar do conteúdo sombrio das histórias do Batman, tomou uma decisão radical: só faria a série se fosse uma comédia. Misturando os clichês dos antigos seriados de aventura (daí o final gancho em que os heróis sempre estavam prestes a morrer diante alguma arapuca doentia), a linguagem dos quadrinhos e a estética do Pop Art, a série tornou-se um fenômeno. Quando estreou em 12 de janeiro de 1966, foi vista por 49,5% dos televisores norte-americanos.

Travestida de comédia camp (algo que, de tão artificial, chega a ser divertido) a série era uma crítica ácida à sociedade americana e sua necessidade de heróis mascarados e imaculados, onde os vilões não tinham freio moral algum e a policia era completamente inútil. Assim, os ilustres desconhecidos Adam West (Batman) e Burt Ward (Robin) tornaram-se celebridades.

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O sucesso foi tanto que os astros da época disputavam a tapa uma oportunidade de aparecer na série; senão como vilão especialmente convidado ou na janela de um prédio que a dupla estivesse a escalar. Deram as caras, nesse quadro, grandes nomes da época como Sammy Davis Jr, Jerry Lewis e, pasme, até Papai Noel.

Outros ilustres a aparecer no seriado foram O Besouro Verde e seu auxiliar Kato (vivido pelo lendário Bruce Lee). Nesse episódio duplo, os defensores de Gotham acreditam que os convidados são os vilões da história. Na verdade, esse crossover era uma jogada de Dolzier, a fim de impulsionar a série do Besouro, também produzida por ele. Valeu só pela oportunidade de vermos Robin encarando rapidamente Bruce Lee num mano a mano... Os cachês pagos aos convidados eram bem maiores do que os salários dos heróis; em especial o de Ward, que recebia menos do que o mínimo da época. Até seu dublê, que mal era usado, recebia maior valor. O resultado eram constantes acidentes com o ajudante do Morcego. Outro problema de azarado Robin era a Liga Católica de Decência, grupo que reclamava que seu calção deixava por demais proeminente seu órgão sexual. Para diminuir o problema foi obrigado até mesmo a tomar remédios.

SERÁ QUE ELES ERAM?

O que mais indigna os fãs radicais da dupla é o estranho relacionamento dos heróis. Se os dois eram ou não, isso era problema deles. No entanto, é difícil não olhar maliciosamente para a dupla diante das cenas em que Batman se desesperava ao saber que Robin estava em perigo, ou quando este atrapalhava o flerte do Morcegão com a Mulher-Gato. Mais de uma vez, o sedutor paladino levou a tigresa (na verdade, Lee Meriwether, que fez a vilã no piloto, agora no papel de uma milionária) para a cama, isso sim ele levou. Com a desculpa de que ia comer leite com biscoitos, Bruce Wayne adentra o quarto dela e volta-se para a câmera: Não posso viver somente na luta contra o crime!

Com a queda da audiência na segunda temporada, foi introduzida no último ano a Batgirl, como novo interesse romântico de Batman. Afinal, não era um bom exemplo que o correto herói se sentisse atraído por uma vilã. Entretanto, nem isso salvou a série, encerrada após 120 episódios.

ROUBANDO A CENA

Não é de hoje a tradição dos vilões ofuscarem o Morcegão. Todavia, aqui, pelo menos o elenco era de primeira e não fazia feio ao tentar desmoralizar o herói. Sem origens ou qualquer justificativa para seus atos eles simplesmente eram maus e deliciosamente insanos. Sinta só que seleção:

  • Pingüim (Burgess Meredith)

Qüem-qüem-qüem!!!

Por mais que parecesse a de um pato, essa era a risada do aristocrático vilão obcecado por peixes. Seus perigosos guarda-chuvas deram muito trabalho a Batman, principalmente quando de sua candidatura à prefeitura de Gotham; argumento emprestado ao longa Batman - O retorno, anos mais tarde.

  • Coringa (César Romero)

Se você prestar atenção nas aparições do palhaço do crime, perceberá que dificilmente era dado um grande close-up no dito cujo. Acontece que Romero usava um generoso bigode que, por mais que lhe pagassem bem, ele não raspava de modo algum. Pintada de branco, a pelagem quase não dava para ser vista. Quase...

  • Charada (Frank Gorshin)

O histriônico e magricela senhor dos enigmas competiu com o Coringa para ver quem era o vilão mais gargalhante da série. Gorshin ainda voltaria ao papel no infame Legends of Super-Heroes. Em alguns episódios, a personagem foi interpretada por John Astin (da série da Família Addams), mas sem o mesmo brilho.

  • Mulher-Gato (Lee Meriwether, Julie Newmar, Eartha Kitt )

A sedutora ladra foi vivida por três diferentes intérpretes. Lee Meriwether no piloto, Julie Newmar (nas duas primeiras temporadas) e Eartha Kitt, a mais bizarra de todas, no último ano. Num artifício de extremo mau-gosto, escolheram-na por ser negra e baixinha. Afinal, na preconceituosa cabeça dos produtores, Batman não correria o risco de apaixonar por uma vilã com tais características. Lamentável... mas, antes disso, nas duas primeiras temporadas ela (Julie) literalmente se jogava nos braços do morcego-baiaca. Este, no entanto, por mais tentado que estivesse, sempre abria mão do romance felino. O desespero da gatinha por ele era tamanho que certa vez ela disse: Você sabe que eu faria TUDO por você! É só pedir!! Claro que o panaca recusou e ... Afinal, quem em sã consciência abriria mão da Mulher-Gato para cuidar do mala do Robin?????

  • Rei Tut (Victor Buono)

Acredite, quase que Charlton Heston e Yul Brinner interpretaram o bonachão vilão obcecado pela cultura egípcia. E, realmente, nenhum deles cairia tão bem nesse papelão quanto Buono.

  • Senhor Frio

O gelado vilão teve três intérpretes: George Sanders, Elli Wallach e Otto Premingeri. Este último, diretor de cinema, pediu para entrar na série para agradar os netos. De tanto discutir com o diretor em cena, apareceu em apenas um episódio.

  • Cabeça de Ovo (Vincent Price)

Infame, talvez esta seja a melhor palavra para defini-lo. Não à toa, seu interprete detestava usar a maquiagem. De quem foi a idéia de colocar o grande Price num papel tão furreca?

Além desses, figuraram outros vilões menos expressivos como o Traça (Roddy MacDowell, o Cornélius do Planeta dos macacos), Menestrel, o Chapeleiro Louco , entre outros igualmente infames.

A TURMINHA DO BEM

  • Alfred (Alan Napier)

O magérrimo mordomo, como sempre, era quem mantinha a ordem na Mansão Wayne. Apoteose era quando ele tinha que se fantasiar de Batman para proteger a identidade secreta do patrão. O legal era que, mesmo usando bigode, ele conseguia enganar a todos.

  • Tia Harriet (Madge Blake)

A tia de Dick Grayson era a ingenuidade em pessoa; tanto que nunca desconfiou do Batfone e muito menos da vida dupla dos Rapazes, que era como se referia aos nossos heróis. Sua personagem foi introduzida para amenizar um pouco mais a impressão de que eles eram ... você sabe. Não adiantou muito. Por motivos de saúde, sua personagem saiu do seriado no terceiro ano, onde apareceu em apenas dois episódios.

  • Comissário Gordon (Neil Hamilton)

Sua voz cavernosa e semblante austero podiam até passar a idéia de um tira durão, mas o fato era que o Comissário nada fazia a não ser chamar Batman para cuidar do vilão do momento. Interessante era que seu intérprete levava o papel tão a sério, que se irritava quando alguém mencionava o programa como sendo uma comédia. Brigou até mesmo com Adam West por este rir em cena.

  • Chefe O´Harra (Stafford Rep)

O abobalhado ajudante de Gordon pouco fazia além de caretas de bobo. Por ser brincalhão durante as filmagens, seu intérprete nunca se deu muito bem com o eterno e sisudo colega de cena Neil Hamilton.

  • Batgirl (Yvonne Craig)

Ela quase ganhou série própria, mas, como a audiência de Batman não ia bem, resolveram incluí-la na série para elevar a audiência. Suas curvas perigosas e motoca com babados não surtiram o efeito desejado.

BATMAN, A MORAL EM PESSOA

Correto até o DNA, era incapaz de ir contra os bons costumes e o civismo. Acreditando cegamente em seus princípios, não percebia o quanto suas atitudes eram contraditórias e até mesmo hipócritas. Uma bela crítica aos xerifes do mundo.

Um exemplo: Após o roubo do Batmóvel, ele relata do orelhão o ocorrido ao Comissário. Este gentilmente oferece uma viatura para conduzir o herói. Claro que a figura recusa, justificando que seria um gasto desnecessário do dinheiro público, ainda mais com as facilidades que o metrô de Gotham oferece. Todavia, como nenhuma linha de ônibus ou metrô passa pelas redondezas, é levado na garupa da bicicleta de Alfred.

DEPOIS DO FIM

Depois da série, ambos os protagonistas estagnaram. Por um bom tempo, a principal fonte de renda de ambos, foram convenções onde compareciam fantasiados. West protagonizou desde filmes B até fitas eróticas. Em 1977, ele retornaria ao papel que o consagrou no desastroso telefilme Legends of super-heroes (inédito aqui) onde, junto do inseparável Robin, unia-se a um grupo de super-heróis. O último trabalho da dupla foi dublar seus alter egos em desenhos animados. Depois disso, Ward largou a carreira de ator e passou a produzir vídeos educacionais. Nada mal para quem era famoso por proferir pérolas do tipo: Santo buraco na rosquinha!

Com o passar dos anos, finda a superexposição que, queimou o filme do Homem- Morcego até o lançamento do longa Batman - O Filme em 1989 (cujas continuações de Joel Schumacher, em homenagem à série sessentista, conseguiriam a proeza de queimar de novo o personagem), a série voltou a ser redescoberta e melhor compreendida dentro de seu contexto. Tornou-se referência e citação em inúmeras películas. Adam West, por sinal, já apareceu até mesmo nos Simpsons, no infame Space Ghost de Costa a Costa e dublou uma personagem baseada nele mesmo em um dos episódios do desenho animado do Batman. Além disso, não podemos deixar de citar os inúmeros livros destrinchando os segredos dos bastidores da série; inclusas aí as biografias dos protagonistas... assunto de discórdias entre ambos.