Muitos quilos mais magro e usando uma desgastada touca vermelha, o Bradley Cooper da entrevista coletiva de Sniper Americano em Nova York pouco lembra o atirador de elite vivido por ele no filme de Clint Eastwood. Acompanhado de Sienna Miller, do roteirista Jason Hall e de Taya Kyle, a viúva do biografado Chris Kyle, o ator falou sobre transformações físicas e psicológicas, a importância do longa e sobre como foi trabalhar com uma das maiores lendas vivas do cinema. Ausente no evento, Eastwood marcou presença sendo o tema de constantes referências e imitações.
Envolvido no projeto desde o princípio, Cooper, que também produz o longa, relembrou Os Imperdoáveis (1992), Cartas de Iwo Jima (2006) e Gran Torino (2008) como exemplos da capacidade de Eastwood de mostrar os diferentes lados de seus protagonistas: "Ele era o diretor perfeito para esse filme, que é um estudo de personagem e pensado como um western", assegurou. O próprio Kyle, o mais letal atirador da história do exército dos EUA, morto no Texas em 2013, teria apontado Eastwood como seu diretor dos sonhos nas primeiras etapas da produção. "Você fica tão empolgado em trabalhar pois Clint Eastwood está lá. Isso nunca perde a graça. É a coisa mais empolgante. Nós nos tornamos amigos e como produtor também pude conviver com o longa, acompanhar a edição e ajudá-lo a configurar o filme", continuou Cooper.
Nos três meses de treinamento militar, o ator ganhou quase 20Kg e se concentrou na sua familiarização com os instrumentos de trabalho de Kyle - os rifles .338 Lapua, .300 Win Mag e MK11. Apesar da sua relação com as armas parecer natural no filme, o ator conta que não conseguiu gravar uma cena em que seus alvos realmente apareciam no visor. "Era a primeira vez que olhava pela arma sem ser no treinamento de tiro, que era com munição de verdade. Quando vi os dois atore fiquei enjoado, afastei a arma e disse: 'não podemos gravar com eles lá'. Eu simplesmente não podia fazer isso. Mesmo a arma não estando carregada. Foi aí que tive um pequeno vislumbre do que os soldados passam", explicou.
Assumindo o filme como uma espécie de legado do marido para os seus filhos, Taya Kyle esteve intimamente envolvida na criação do longa. Vivida no longa por Sienna Miller, a viúva acompanhou de perto a preparação da atriz e compartilhou vídeos e e-mails para compor um retrato fiel da sua relação: "Isso é realmente pessoal e incrivelmente íntimo, mas isso permite que você tenha uma base extremamente honesta e sólida para construir a sua atuação. Queríamos nos concentrar o máximo em como essas pessoas se amavam, pois é muito difícil para um casamento sobreviver à guerra, a quatro idas ao Iraque, e o deles sobreviveu", explica Miller. "Quando você quer saber tudo sobre um homem você não pergunta para ele, mas para a sua esposa", brincou Hall sobre a importância da contribuição.
"Não é um filme sobre a Guerra do Iraque. Não é um filme político, é um filme sobre o que alguém como Chris, um soldado, enfrenta. Os dilemas e os horrores, a batalha psicológica e com a família. O que esperamos é abrir os olhos do público sobre os dramas do soldado, não sobre detalhes da guerra", explicou Cooper sobre motivações panfletárias. Emocinada, Taya Kyle complementou a explicação, dizendo que se tratava de uma oportunidade de fugir do estereótipo de que os militares amam a guerra. "Trata-se de assumir uma responsabilidade. Eles amam essa luta, seja por justiça ou de uns pelos outros". A viúva então relembrou um dos primeiros alvos do atirador: uma mulher e uma criança. "Chris disse que não sabia se conseguiria dar o seu primeiro tiro. Ele disse que não havia como saber até estar com a arma em mãos. Conheço meu marido, sei que ele era um homem com um coração enorme e sei que ele não queria dar aquele primeiro tiro. Ele estava mentalmente preparado para atirar em outro homem, mas ele estava em uma situação em que tinha um grupo de soldados e essa mulher com uma bomba. Ela o forçou em uma situação em que ele precisou fazer uma escolha: ou deixava esses soldados morrerem, ou engolia em seco e atirava para que outro não precisassem carregar esse fardo", justificou.
Voltando o assunto mais uma vez para Eastwood, Cooper contou que o veterano é como uma criança, sempre curioso sobre tudo. Imitando a icônica voz sussurrada/gutural do diretor, o ator falou emocionado sobre o seu "momento pessoal" com o ícone durante um café da manhã com a família de Kyle e elogiou a capacidade de Eastwood em observar "pequenos detalhes preciosos". Segundo o elenco, isso aparece especialmente nas cenas que mostram a relação entre Taya e Chris.
Sobre a fama do diretor de não exigir muitas tomadas, Miller e Cooper afirmaram que isso faz com que o elenco chegue ao set preparado, mas que Eastwood sempre garante que seus atores se sintam livres e seguros. "É quase como teatro", explicou Cooper citando a definição de Kevin Bacon sobre o trabalho com o diretor em Sobre Meninos e Lobos (2003). "Isso faz com que você não fique se aquecendo. Você precisa estar pronto. O trabalho com David O. Russell em O Lado Bom da Vida (2012) e Trapaça (2013) certamente também me preparou para isso. Se algum dia dirigir um filme é assim que pretendo trabalhar."
As homenagens também se voltaram para o próprio Cooper, que ganhou uma mistura de elogio e cutucada de Miller: "Conheci Bradley como Chris muito antes de conhecer Bradley mesmo, para ver o quanto ele estava envolvido com o personagem. Agora, acabo de ver a atuação dele em Sniper Americano [e na peça] O Homem Elefante e não dá para acreditar que é o mesmo cara de Se Beber, Não Case". Mais séria, Taya complementou o discurso de aprovação dizendo que o ator conseguiu trazer seu marido de volta à vida.
Leia a crítica e assista ao trailer legendado de Sniper Americano, que estreia no Brasil em 19 de fevereiro: