Se é verdade que o público LGBTQI+ tem demografias de mangás e animes dedicadas especialmente para a comunidade, isso não significa que personagens gays, lésbicos, trans e afins só apareçam nessas histórias. Há muito tempo que a diversidade de orientações dá as caras em séries dos mais variados temas.
Embora não se enquadre exatamente na demografia boys love, a série Yuri!! On Ice (disponível na Crunchyroll) tem todas as características de um boys love, com uma história emocionante de competição em patinação artística em meio a uma trama repleta de personagens gays e bi. O público torceu tanto pelo casal formado pelo protagonista Yuri com seu treinador Victor que as redes sociais foram inundadas por diversos fãs fazendo análises nível CSI para descobrir se os dois protagonistas haviam se beijado durante uma cena sugestiva.
Outro anime recente de bastante sucesso é My Next Life as a Villainess: All Routes Lead to Doom (disponível na Crunchyroll). Nessa história a protagonista é uma fã de otome games, aqueles jogos de namoro protagonizados por personagens femininas, e acaba sendo transportada para dentro de um desses games… só que no papel de vilã. Enquanto Catarina tenta usar seus conhecimentos sobre o jogo para evitar que sua vilã morra na história, algumas mulheres do anime vão se apaixonando pelo jeitinho da personagem.
Não podemos esquecer também das populares séries do tipo shonen que também introduzem alguns personagens LGBTQI+. My Hero Academia, por exemplo, tem dois casos de personagens trans, mesmo secundários: o musculoso Yawara é um exemplo de personagem que realizou uma cirurgia de transição por se identificar como homem, assim como Magne, uma das vilãs do arco do acampamento que prefere ser identificada como mulher.
Yawara em My Hero Academia
Mas um dos casos mais lembrados de diversidade em séries populares é o caso de One Piece. Um dos personagens mais fortes na primeira metade da série é o homossexual Bon Clay, um dos asseclas do vilão Crocodile. Mesmo sendo um vilão, Bon Clay forma um laço de amizade tão grande com o grupo de Luffy que chega a se sacrificar para conseguir proteger o bando durante a saga de Alabasta.
Mais pra frente na história, Luffy não só reencontra Bon Clay preso como também conhece um grupo inteiro formado por personagens gays e trans escondido em um andar secreto da prisão de Impel Down. E esqueça qualquer clichê de “fragilidade”, pois todos esses personagens são tão (ou mais) fortes que os piratas do bando do protagonista.
One Piece e Yu Yu Hakusho: da caricatura ao respeito
Há quem critique Eiichiro Oda pelo tom caricatural dos personagens LGBTQI+ em One Piece, às vezes mostrados com proporções disformes e características muito exageradas, mas é sempre bom lembrar que o mangá de piratas é publicado há muitas décadas. O próprio Bon Clay surgiu na história no começo dos anos 2000, quando a questão da diversidade ainda não era debatida com tanta seriedade no meio artístico, ainda mais em mangás.
Porém percebemos o esforço do autor em retratar minorias com mais seriedade e, no atual arco do País de Wano, somos apresentados à personagem O-Kiku, uma mulher trans. Dessa vez não há qualquer caricatura ou zombaria em seu design (embora ela tenha quase três metros de altura, mas até aí isso é esperado no mundo de One Piece) e os demais personagens respeitam o gênero no qual ela prefere ser identificada, deixando de lado qualquer olhar mais biológico.
Ainda nos bons exemplos de personagens LGBTQI+ está Hunter x Hunter, de Yoshihiro Togashi. Depois de uma representação bem ofensiva de transexuais em Yu Yu Hakusho (em que Yusuke apalpa uma mulher trans para ver se podia bater nela), o autor fez as pazes com o respeito à diversidade em seu sucesso posterior. Hunter x Hunter está repleto de personagens de várias minorias, inclusive é possível interpretar o sofrimento da Alluka (irmã do Killua) como uma não-aceitação de sua transexualidade por parte dos pais.
Com tanta produção de mangá e com animes sobre LGBTQI+ aos poucos surgindo em meio às temporadas japonesas, dá para imaginar que se trata de um nicho em expansão. E a introdução de personagens da sigla em séries populares mostra um esforço de realizar uma inclusão e debater sobre respeito nas obras. Que esse tipo de representação cresça cada vez mais!