Super Campeões | Aos trancos e barrancos, anime conquistou o Brasil três vezes

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Super Campeões | Aos trancos e barrancos, anime conquistou o Brasil três vezes

Com três séries diferentes lançadas por aqui, Captain Tsubasa repetiu o sucesso obtido em outros países

Omelete
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28.11.2022, às 09H00.

Você sabe o que Lionel Messi, Zinedine Zidane e Fernando Sanz têm em comum? Além de serem jogadores de futebol, todos eles foram motivados no esporte graças a um certo garoto japonês de sobrenome Tsubasa. A série de mangá e anime Captain Tsubasa é a maior franquia de futebol do mundo não apenas por ser pioneira no gênero, mas também por ter promovido mudanças na forma como o Japão se envolvia com a bola.

E além de toda essa influência a nível mundial, Captain Tsubasa tem um cantinho todo especial no coração dos brasileiros, afinal Super Campeões (o nome da série por aqui) encantou pelo menos três gerações diferentes com seus animes exibidos em décadas distintas.

O pai do futebol japonês

Shueisha/Reprodução

Como já contamos na matéria passada sobre os animes de futebol lançados em 2021 e 2022 (se não leu ainda, recomendamos dar uma olhada), o Japão é um apaixonado "recente" pelo esporte. O futebol foi introduzido no país durante o final do século XIX, mas só tornou-se popular a partir dos anos 1980 quando Yoichi Takahashi começou a lançar Captain Tsubasa nas páginas da Shonen Jump, a mesma revista que publicaria Dragon Ball e Naruto anos depois.

Embora o título seja o embaixador do futebol no Japão, seu autor não era alguém que acompanhava o esporte. Na verdade, Takahashi era fã de outra prática, o baseball! "No terceiro ano do ensino médio eu assisti à Copa do Mundo da Argentina na televisão e descobri o esporte. Fiquei curioso e pesquisei sobre futebol, descobri que na Europa era muito mais popular que o baseball, e o número de jogadores era muito maior. O futebol era o esporte número um do mundo, imaginei" comentou Takahashi em uma entrevista dada ao site Nippon.com.

O "ineditismo" serviu de combustível para o autor, pois embora existissem muitos mangás de esporte em publicação no Japão, não havia nada grande sobre futebol, apenas baseball, boxe e outros. E com a publicação na maior revista de mangás do país, Captain Tsubasa acabou se tornando uma “cartilha de futebol” para os japoneses. “Percebi que o futebol era interessante e queria que se tornasse um esporte popular no Japão. Dessa forma, escrevi esse mangá para o público japonês explicando o futebol em detalhes" explicou Takashi, dessa vez em entrevista à Aljazeera.

A história de Captain Tsubasa em si é bastante simples e segue todos os clichês comuns ao gênero esportivo. O protagonista é o jovem Ozora Tsubasa, um garoto de 11 anos de idade com uma paixão grande por futebol a ponto de ficar andando abraçado a uma bola. Ozora ama futebol e até consegue entrar no time local, o Nankatsu Futebol Clube, mas a equipe é considerada fraca. Lá dentro ele faz amizades com outros garotos como Ishizaki e Taro Misaki, nutre uma grande rivalidade como o goleiro Genzo Wakabayashi e o atacante Kojiro Hyuga e passa a ser treinado por Roberto Hongo, ex-jogador do Brasil. Nosso país inclusive é uma meta para o jovem Ozora, cujo sonho é jogar pelo time do São Paulo (ou Brancos, nome escolhido quando o autor precisou se preocupar com direitos autorais de times reais).

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Captain Tsubasa está em cima da linha tênue que separa a realidade e o absurdo. Embora todas as regras do esporte sejam respeitadas nas quatro linhas do campo, os garotos de Captain Tsubasa têm físico e técnicas dignas de um personagem de Dragon Ball Z. Seus chutes envolvem a bola com uma aura de energia, um único jogador pode atravessar de uma vez um campo quase infinito e um chute de bicicleta é a saída mais estilosa para fazer gols nos adversários. Os treinamentos também são bem pouco reais, como Kojiro que pratica seus chutes contra ondas de três metros de altura.

O sucesso de Captain Tsubasa nos quadrinhos levou a produção de um anime de sucesso em 1983. Embora a versão televisiva adapte apenas 25 dos 36 volumes desenhados por Takahashi, a história foi concluída posteriormente com alguns filmes animados e também uma série de episódios lançados direto para vídeo (OVA) com o nome de Shin Captain Tsubasa.

A chegada dos Super Campeões

A história do capitão Tsubasa no Brasil começou no final dos anos 1990, quando uma distribuidora queria aproveitar o clima da Copa do Mundo de 1998 para trazer para nós um anime de muito sucesso em países como França, México e Itália. Ao contrário do que muitos imaginam, a série exibida na Rede Manchete não é o anime produzido nos anos 1980 logo após a criação do mangá, e sim uma outra série produzida em meados de 1994 quando o Japão conseguiu classificar sua seleção na Copa do Mundo. No original o anime se chamava Captain Tsubasa J e era uma espécie de “resumão” da história anterior com o acréscimo da continuação World Youth criada pelo autor Yoichi Takahashi alguns anos antes.

Por ser mais recente e por contar “toda” a história (na verdade o anime foi encerrado sem um final, por isso as aspas), a produção foi um sucesso em muitos países e parecia um prato cheio para o Brasil, afinal aqui amávamos animes e também o futebol. Porém, mesmo em condições pouco propícias o anime conseguiu conquistar o público que buscava um anime sem foco em batalhas corpo a corpo.

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Para facilitar o sucesso da série no ocidente, decidiram adaptar boa parte dos nomes e diálogos, inclusive mudando o nome do protagonista de Ozora para Oliver Tsubasa. No meio das mudanças o Brasil ousou e improvisou um pouco a mais, trocando Taro por Carlos Misaki e o jogador Roberto Hongo que por aqui se popularizou como Roberto Maravilha.

Infelizmente Super Campeões chegou em um timing péssimo, pois a Rede Manchete já estava em seus últimos momentos, perdendo várias retransmissoras pelo país e também com dificuldade de pagar seus funcionários, o que levava a greves e interrupções na programação. Com o fim da emissora, logo Super Campeões evaporou da televisão brasileira. Não foi reprisado por outros canais, não se tornou um marco como Os Cavaleiros do Zodíaco ou Yu Yu Hakusho e a única memória palpável que temos é um CD com músicas originais lançado durante a exibição do anime.

A nova chance dos Super Campeões

Alguns anos se passaram e novamente o Japão foi se animando com o clima de Copa do Mundo. Como a competição de 2002 seria sediada no próprio país (e também na Coreia do Sul) e uma onda de novas produções temáticas de futebol chegava ao Japão, Yoichi Takahashi percebeu o interesse pelo tema e começou a lançar em 2001 o mangá Captain Tsubasa: ROAD TO 2002, uma continuação das aventuras de Ozora Tsubasa, dessa vez a caminho da tal Copa do Mundo.

O quadrinho acendeu o olho do estúdio Group TAC (o mesmo dos animes de Street Fighter), que estreou em outubro de 2001 um novo anime para a franquia. Captain Tsubasa: Road to 2002 (ou apenas Captain Tsubasa 2002) é uma mistura maluca de continuação e reboot. Os primeiros episódios do anime pegam os acontecimentos do anime original da franquia e da continuação lançada no final dos anos 1980, e logo depois ele adapta o conteúdo do novo mangá de Takahashi, mas sem mostrar o final (!?).

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Essa série também foi lançada no Brasil, mas aos trancos e barrancos. Em meados de 2002 o Studio Gabia teve a ideia de lançar DVDs de animes nas bancas de jornais, uma alternativa mais viável do que disponibilizar em lojas especializadas. Depois de lançar alguns episódios de Vampire Princess Miyu, a distribuidora se animou a licenciar esse anime recente e o lançou com o nome de Super Campeões. Fazia sentido a aposta, afinal a série tinha algum valor nostálgico e estávamos em ano de Copa do Mundo. Além de usarem os nomes adaptados, a dublagem da nova série ainda teve o cuidado de escalar os mesmos dubladores do Super Campeões da Manchete, como Márcio Araújo (o James de Pokémon) no papel de Oliver Tsubasa e Marcelo Campos (o Yugi de Yu-Gi-Oh!) fazendo o Benji Wakabayashi. Mas após dois volumes sem tanta repercussão no meio otaku, a distribuidora interrompeu o lançamento e Super Campeões 2002 ficou no banco dos reservas por uns anos.

Dois anos depois da fracassada tentativa de vender DVDs de anime, a Televix licenciou a nova série de Super Campeões e a vendeu para o Cartoon Network, e dessa vez dublou o anime inteiro. Já em 2006 a distribuidora conseguiu colocar o anime do Tsubasa na grade da RedeTV!, a sucessora do sinal da Rede Manchete, e aí foi um sucesso inesperado. A emissora brasileira tentou criar um bloco de animes e até exibiu Fullmetal Alchemist e Hunter x Hunter, mas a repercussão e os números do Ibope vieram quando as novas aventuras de Oliver Tsubasa chegaram à telinha.

Até hoje é possível encontrar otakus que acompanharam com carinho essa exibição na televisão aberta, e o sucesso do anime de futebol serviu como incentivo para a RedeTV! apostar em outra série esportiva, Super Onze. Essa inclusive se tornou um fenômeno ainda maior que Super Campeões e é lembrada com carinho até hoje, mesmo sem ter todos os episódios lançados por aqui.

Vale comentar também que em 2002, ainda no clima de Copa do Mundo, Yoichi Takahashi começou a publicar um novo mangá de futebol intitulado Hungry Heart: Wild Striker. Sem as “doideiras” de Captain Tsubasa, o anime contava a história do estudante rebelde Kyosuke Kano cujo sonho era ser um jogador de futebol, mas o rapaz se sentia ofuscado pelo sucesso de seu irmão mais velho, um jogador profissional da seleção japonesa. No mesmo ano de 2002 o mangá foi adaptado para um anime de 52 episódios e ele chegou a ser exibido no Brasil no finado canal pago Animax. Caso esbarre com ele, dê uma chance porque é muito interessante.

Tsubasa no Brasil mais uma vez

Agora o ano é 2018 e o mundo estava novamente na expectativa por mais uma Copa do Mundo, dessa vez na Rússia. Mesmo sem um anime novo há quase 10 anos, a franquia Captain Tsubasa continuava forte no Japão e foi decidido que produziriam uma nova série, dessa vez pelas mãos do David Production. O estúdio, responsável por modernizar e popularizar a franquia Jojo’s Bizarre Adventure, parecia o ideal para Captain Tsubasa, afinal é sempre um desafio pegar uma história dos anos 1980 e adaptar para os fãs de anime do presente. E a história, como era de se imaginar, mais uma vez recontou a biografia de Tsubasa de sua infância até a fase adulta como jogador do Brancos.

Embora em 2018 já houvesse uma popularização dos streamings, não foi desta forma que acompanhamos Captain Tsubasa. A série foi adquirida pela VIZ Media, que preferiu licenciar para o Cartoon Network no lugar de lançá-la em alguma plataforma online. Na hora da dublagem, a série rompeu com toda a nostalgia das anteriores e escalou um novo elenco de vozes para os personagens, além de respeitar os nomes originais como Ozora e Genzo.

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O fato de ter ficado restrito à TV paga afetou o sucesso da nova série de Captain Tsubasa. Ao mesmo tempo, a falta de exibição simultânea em um streaming afetou as discussões online que poderiam também impulsionar o anime. Atualmente ele até está disponível na Crunchyroll, mas pouco se fala sobre essa adaptação competente.

Seja como Captain Tsubasa ou Super Campeões, o anime inspirado no original de Yoichi Takahashi ajudou a pavimentar o sucesso do futebol como um todo. Através de histórias com dribles às vezes absurdos, o autor conseguiu unir o mundo todo pelo amor à bola e incentivou que muitos craques da atualidade se empenhassem no esporte. Quando for curtir os episódios de Aoashi e Blue Lock, lembre que eles nem ao menos existiriam se não fosse o pontapé inicial dado pelo capitão Tsubasa e seu chute de trivela.

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