Autor de alguns dos maiores clássicos dos quadrinhos, Mark Waid é especialmente lembrado por suas histórias com Superman e Capitão América, dois dos maiores heróis das HQs. Mais de uma década após deixar a DC Comics, o autor voltará ao universo da editora em dezembro na HQ Dark Nights: Death Metal: The Last Stories of the DC Universe, antologia que terá sua primeira história do Homem de Aço em 15 anos. E o roteirista acredita que sua volta acontece no momento em personagens como esse se fazem ainda mais necessários: “Acho que eles são mais importantes do que nunca. Nós desesperadamente precisamos de esperança neste mundo”, disse em entrevista ao Omelete.
O premiado roteirista usou como exemplo a eleição presidencial norte-americana de 2020, que se encerra nesta terça (3), a qual descreveu como “a mais importante em 250 anos”, justamente pelo momento de tensão e polarização que os país passa. “As pessoas estão com medo porque estamos à beira do fascismo e de um período muito sombrio e feio. Temos que sair e votar para nos certificarmos que o tirano que esteve no poder nos últimos quatro anos saia. Mas não consigo colocar em palavras o tamanho dessa tensão e desespero”.
Para Waid, o clima de apreensão que toma conta da sociedade, somado à pandemia do novo coronavírus, deixou as pessoas estressadas e em pânico. E é aí que os heróis, mesmo que ficcionais, se fazem mais necessários: “Precisamos de esperança e personagens como o Superman e o Capitão América, que resolvem problemas não à força, mas servindo de inspiração para os outros. Precisamos mais disso”.
Não que a vasta bibliografia de Mark Waid seja limitada a esses dois personagens. Vencedor de numerosos prêmios Eisner e Harvey, o autor deixou sua marca tanto na Marvel, em grandiosas fases de personagens como Demolidor e Quarteto Fantástico, quanto na DC, onde revitalizou a Liga da Justiça e estabeleceu um recorde de oito anos à frente da revista do Flash.
Ainda assim, ligar o roteirista aos principais “escoteiros” dos quadrinhos norte-americanos é inevitável graças à forma única com que lidou com esses ícones.
A fórmula secreta de Mark Waid para o Superman
Entre os dois heróis que vestem as cores da bandeira norte-americana, é por Superman que Mark Waid é mais lembrado. Com clássicos como Reino do Amanhã, ao lado de Alex Ross, e Legado das Estrelas, com Leinil Francis Yu, o roteirista se tornou um dos grandes autores do kryptoniano, que nos últimos anos ganhou a fama de ser um personagem difícil de se escrever. Para Waid, essa dificuldade não se justifica: “Essa é a coisa mais fácil do mundo, poderia escrever Superman todos os dias pelo resto da vida”, ri.
O autor explica que muitos roteiristas encontram dificuldade em achar fraquezas no personagem, que é fisicamente invulnerável. A resposta, para ele, é explorar outros pontos fracos do Homem de Aço. “Você machuca o Superman ao colocá-lo em dilemas éticos e morais que são difíceis de resolver, você ameaça seus entes queridos. Ele está sempre com o coração na mão, por ser tão empático e gentil. Se você quer machucar o Superman, explore sua empatia e sua bondade. Para mim, essa é a fórmula secreta para escrever o Superman”.
Dentre os dilemas que mais podem “ferir” o Superman, Waid cita a solidão de Kal-El. Com exceção de poucos kryptonianos do Universo DC, ele é o último sobrevivente de um planeta inteiro, e sua natureza singular o deixa à parte das pessoas que ama e jurou proteger. “Se você é o Superman, o modo como você pode se misturar é colocando um par de óculos e fingindo ser outra pessoa. Caso contrário, vão te olhar como um salvador ou uma besta alienígena assustadora que pode ameaçar a humanidade. Então, a tragédia desse homem é que ele é único”.
Superman violento? Waid discorda
Nos últimos tempos, uma das formas encontradas para tornar o Superman “interessante” foi a violência. Levar o herói ao limite a ponto de deixar para trás seu inquebravel código moral vem se tornando cada vez mais comum, mesmo que a custo de suas principais características. Questionado sobre o motivo de nunca tornar o herói agressivo, Mark Waid foi categórico: “se você for o homem mais poderoso do mundo, não há motivo para ser violento, a não ser que você seja só mais um valentão. Pessoas ficam raivosas e violentas quando se sentem indefesas, ameaçadas, ou quando estão em perigo, e Superman geralmente não se sente assim”.
Vale notar que Mark Waid já se aproveitou dessa premissa na HQ Imperdoável, que mostra o maior herói desse universo (chamado Plutoniano) massacrando a indefesa população da Terra. Porém, o autor nunca chegou perto de fazer algo assim com o kryptoniano em si. A razão para não adicionar crueldade ao herói da DC está no fato de que seria uma escolha criativa pouco desafiadora. “É a coisa mais fácil do mundo. Qualquer um pode fazer isso, e eu escolho não fazê-lo. Prefiro me concentrar em personagens que não são violentos por natureza, porque isso não te deixa enxergá-los direito”.