No Cine 99 nós já recomendamos um filme que trouxe inovação de computação gráfica, como Matrix, e os filmes que falavam sobre o desconforto masculino, como Clube da Luta e Beleza Americana. Mas no mesmo ano, o público recebeu duas obras-primas do terror e do suspense no cinema: A Bruxa de Blair e O Sexto Sentido. Neste episódio de Cine 99, o foco será nestes dois clássicos e tudo que eles impactaram no cinema.
A Bruxa de Blair
Bruxa de Blair foi um fenômeno cultural definido como um divisor de águas em como passar credibilidade de uma história. Na época, a crítica considerava o filme um dos mais assustadores já feitos, de tanto que as imagens pareciam mesmo reais, e isso não foi sem querer. Os diretores Daniel Myrick e Eduardo Sánchez produziram o filme para que ele parecesse um apanhado de imagens verídicas de câmeras encontradas no meio de uma floresta, algo totalmente inovador para o mainstrem da época.
A inspiração de Myrick e Sánchez foi um incômodo sentido pela onda de CGI que invadia os anos 90 e, influenciada pela estética da série dos anos 70 In Search of…, a dupla produziu um teaser para convencer investidores a apostarem em uma produção que contasse a história de um grupo de documentaristas que se aventuravam na floresta para investigar uma lenda maligna. Um ano depois as câmeras são encontradas e suas imagens se tornam o que vemos em 81 minutos de filme.
Para convocar o elenco, os diretores publicaram um anúncio ousado, procurando atores que soubessem improvisar e estivessem dispostos a participar de "do mais desagradável projeto da sua carreira". Surpreendentemente, o trio Joshua Leonard, Heather Donahue e Michael Williams ficou interessado. O roteiro do filme não tinha diálogos e havia pistas espalhadas pela floresta indicando o que os atores deveriam fazer. Este tipo de atuação aumentou ainda mais a impressão de que Bruxa de Blair era um documentário real de pessoas que de fato desapareceram na floresta.
Por causa de A Bruxa de Blair, o found footage ("registro encontrado") se tornou popular, tanto pela veracidade e pelo baixo custo. Apesar de longas como Holocausto Canibal, que é de 1980, e até o desconhecido The Last Broadcast, de 1998, já terem juntado o terror com o pseudo-vídeo caseiro, A Bruxa de Blair precisou ser lançado para iniciar uma onda de filmes do estilo. Não apenas isso, o terror é considerado por críticos e pesquisadores como um dos primeiros - senão o primeiro - viral de toda a história.
Marketing digital e popularização do gênero found footage foram grandes legados de A Bruxa de Blair para o cinema do início do século 21. Um dos filmes que seguiram essa estética foi A Visita, lançado em 2015 por um diretor que deixou sua marca registrada em uma obra-prima do suspense de 1999: O Sexto Sentido.
O Sexto Sentido
Nascido na Índia e batizado de Manoj Nelliyattu Shyamalan, o futuro M. Night Shyamalan foi morar nos Estados Unidos com os pais ainda criança e gostava de gravar pequenas homenagens a Spielberg no quintal de casa. Inspirado por filmes como Tubarão, Alien e Duro de Matar, Shyamalan foi para a faculdade de cinema e, diferente de seus colegas que só falavam de Gordard e filmes cabeça, fazia questão de mostrar que curtia um bom blockbuster. Ele chegou a fazer dois filmes depois de se formar: o independente Praying with Anger, de 1992, e Olhos Abertos, de 1998, com produção problemática da Miramax.
Enquanto Shyamalan resolvia divergências com o execrado Harvey Weinstein, ele trabalhava em um novo filme inspirado em uma ideia que ele não tirava da cabeça: a visão de uma criança falando sozinha em um velório. Ele teve a sacada para o título - O Sexto Sentido - e criou um roteiro sobre um homem de meia idade e um garoto que tinha habilidade de ver os mortos.
A ideia foi um sucesso entre os investidores, e a Disney acabou fazendo a melhor oferta pelo filme: US$ 3 milhões de dólares. De quebra, o diretor ainda conseguiu se livrar da relação com a Miramax. Para Shyamalan, o ator ideal para fazer o papel do psicólogo Malcolm Crowe sempre esteve estampado no poster de Duro de Matar, pendurado na parede de seu quarto: Bruce Willis.
Em meados dos anos 90, o ator passava por problemas financeiros por causa do filme que produzia e estrelava, Broadway Brawler, que nunca foi finalizado. A proposta para fazer O Sexto Sentido veio como um acordo da Disney: o estúdio arcaria com todos os gastos de Broadway Brawler e Bruce Willis faria alguns filmes em troca. O primeiro foi Armageddon, de 1998. O segundo seria o projeto de Shyamalan.
A busca pelo garoto protagonista foi um pouco mais complicada. Foram várias crianças testadas e pesquisadas e Haley Joel Osment era só mais uma na fila. Só que no final do teste do garoto, que fez uma cena especialmente emocionante do roteiro, tanto ele quanto Shyamalan estavam em lágrimas. O diretor ligou para o produtor de casting e falou: "Se não for para fazer com esse menino, eu não quero fazer o filme."
A expectativa de Shyamalan era fazer 40 milhões de dólares com O Sexto Sentido. Em vez disso, o filme conseguiu US$ 27 milhões só nos primeiros três dias e ficou acima do hypado A Bruxa de Blair no final de semana de estreia. O Sexto Sentido se manteve em primeiro lugar por mais de um mês e meio e chegou a fazer 300 milhões de dólares nos Estados Unidos. Na lista das maiores bilheterias mundiais de 1999, O Sexto Sentido aparece na segunda colocação com US$ 672 milhões de dólares arrecadados. Só fica atrás de Star Wars: Episódio I, que conseguiu quase um bilhão de dólares em venda de ingressos naquele ano.