Dentro do gênero do suspense policial existe um ramo muito particular que costuma ser chamado de thriller sensual. Dele fazem parte Instinto Selvagem, Assédio Sexual, Desejos e correlatos. Não é sempre que acontece, mas de modo geral esses filmes se preocupam mais em descobrir maneiras de expor a atriz principal aos olhos dos personagens e dos espectadores do que no desenvolvimento da história. Com A Estranha Perfeita (Perfect Stranger) é assim.
Halle Berry (Mulher-Gato) vive Rowena, uma jornalista revoltada por ter seu furo de notícia boicotado dentro do próprio jornal. Atrás de uma nova polêmica, ela descobre que uma amiga morreu depois de manter um caso com um poderoso publicitário, Harrison Hill (Bruce Willis). Ajudada por um amigo expert em informática, Miles (Giovanni Ribisi), ela se aproxima de Harrison para provar que ele não é apenas suspeito como de fato cometeu o crime. Claro, Rowena se envolve com o cara além da conta.
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A câmera do diretor James Foley (Confidence - O golpe perfeito) não perde tempo. Gruda na volúpia de Halle Berry desde o primeiro momento - o raio-x da entrada do Congresso é como uma metáfora do que virá, uma exposição constante do corpo e dos jeitos da atriz. Em A Estranha Perfeita ela não fica nua como em A Senha ou A Última Ceia, mas a galeria de vestidos que enverga no filme força o público a despi-la com os olhos.
O subgênero é muito bem resolvido com essas regras de sedução. Astros e estrelas existem para serem devassados. Halle Berry bebe uma Heineken em trajes íntimos, Bruce Willis joga charme para cima da modelo da Victoria's Secret e luta para roubar a conta da Reebok da agência rival... É o jogo do troca-troca em sua plenitude: a produção faz de conta que os seus patrocinadores estão inseridos no filme por acaso (estúdios não arcam com possíveis fracassos; projetos só são realizados se alguém de fora pagar a fatura) e nós fingimos que acreditamos. Fingimos porque faz parte - estamos ali só por causa da Halle Berry.
O problema é que sempre tem alguém querendo inserir uma pseudoarte no meio. No caso de A Estranha Perfeita, a partir do roteiro escrito a seis mãos por John Bokenkamp, Frank Rinzulli e Todd Komarnicki, o diretor Foley soterra o espectador com um discurso excessivo sobre privacidade, identidade e outras complexidades. Incapaz de traduzir esses temas em imagens, o que daria aos personagens alguma profundidade, Foley roda em falso. Tenta suprir carências narrativas com a reviravolta de sempre, mas mesmo o plot twist ele só consegue resolver com um personagem detalhando o que aconteceu. Aliás, se Giovanni Ribisi está ali mesmo só para intermediar as explicações para o espectador, que ficasse como narrador em off e nos poupasse dos seus tiques.
A Estranha Perfeita seria ótimo se fosse um filme mudo. Uma estranha gostosa e muda.