Não se sinta mal se você foi assistir a Matrix reloaded e saiu confuso ou sem entender bulhufas do filme. O diálogo entre Neo e o Arquiteto (leia aqui na íntegra), por exemplo, é rebuscado e as legendas não fazem justiça ao que é dito na língua original. Portanto, muita coisa se perde.
Eu, o Jovem Nerd [N.do E. - dono de um dos blogs mais divertidos da net brasileira], um leitor fanático de ficção-científica, após muitas discussões com os amigos e leituras atentas da transcrição do diálogo, proponho uma análise, não da filosofia, mas do que representam estas revelações para a trama da saga de Matrix. Ressalto que esse arrazoado é apenas uma possibilidade e se baseia em minhas opiniões sobre o filme. Deve-se admitir a eventualidade de que, em Matrix revolutions, algumas destas informações venham a ser desmentidas ou que outras verdades sejam acrescentadas ao enredo.
O Arquiteto é humano?
Parece uma pergunta idiota, mas, ao contrário do que foi publicado em uma coluna na Folha de São Paulo, o Arquiteto não é humano. A meu ver, isso fica claro quando ele define Neo como um humano e diz ao escolhido que redesenhou a Matrix com base na história de vocês para refletir com maior precisão as variações grotescas de sua natureza.
Neste momento, ele se coloca fora do grupo que define como a humanidade. Quem é o Arquiteto? Certamente, aos olhos da Matrix, ele é Deus, o pai, o criador. No entanto, em relação ao mundo real, pode não passar uma consciência digital, criada para governar o universo virtual.
Então, o Neo também é um programa?
Não. Algumas pessoas chegaram a levantar esta hipótese, mas ela não me parece muito factível. O Arquiteto diz no início da conversa: Você tem muitas perguntas, e embora o processo tenha alterado sua consciência, você continua irrevogavelmente humano.
Ao dizer que o processo alterou sua consciência, ele se refere à iluminação de Neo, quando ele descobriu seus poderes e a maneira de enxergar a Matrix, mas sem deixar de ser um humano.
Isso, todavia, não é só. Neo é especial? Sim.
Sua vida é a soma do saldo de uma equação desequilibrada inerente à programação da Matrix. Você é o desenlace de uma anomalia, que, a despeito de meus mais sinceros esforços, fui incapaz de eliminar daquela, caso eu fosse capaz, seria uma harmonia de precisão matemática.
Esta afirmação confundiu muita gente. Ao se referir a Neo como um erro no sistema, algo na sua programação que tomou consciência e lhe arrumou problema, o Arquiteto sugere que ele seria um programa. Não me parece o caso. O Arquiteto, que é o programa criador, descreveu Neo como o vê. Seu universo se limita ao sistema da Matrix e, para ele, Neo é uma força consciente da humanidade, trata-se de um bug, algo que nem ele consegue decifrar ou apagar. Uma anomalia. Complicado? Calma que mais tarde eu volto a essa questão.
Quem é a Oráculo?
O Arquiteto afirma (assim como o Agente Smith no primeiro filme) que uma primeira versão da Matrix representava um mundo perfeito, mas que não funcionou.
Um triunfo equiparado apenas ao seu fracasso monumental. A inevitabilidade de sua ruína é tão evidente para mim agora quanto é uma conseqüência da imperfeição inerente a todo ser humano.
Então, criou outra Matrix, baseada na história da humanidade, mas esta também foi um desastre. Daí, concluiu que não estava entendendo como fazer o sistema funcionar com os seres humanos. Levando-se em consideração o que Smith diz no primeiro filme, podemos crer que, em certo ponto, as pessoas conectadas rejeitavam o mundo virtual e começavam a despertar.
O Arquiteto justifica sua frustração: [Eu] compreendi que a resposta me escapava, porque ela necessitava de uma mente inferior, ou talvez uma mente menos afeita aos parâmetros da perfeição.
Então, um programa intuitivo inicialmente criado para investigar aspectos da mente humana, encontrou por acaso a resposta. A solução encontrada funcionou para quase todas das pessoas e projetou a Matrix como ela é hoje, um sistema de controle quase perfeito.
Este tal programa intuitivo, nós conhecemos como Oráculo.
Como assim, esta é a sexta versão da Matrix?!
Na verdade, existiram outras, mas a Matrix Utópica e a primeira versão dela, baseada na história humana não contam pelo que o Arquiteto diz: A Matrix é mais velha do que você imagina. Eu prefiro contar a partir do surgimento de uma anomalia integral para a seguinte. Neste caso, esta é a sexta versão.
Ou seja, ele só conta a partir da primeira Matrix que realmente funcionou, que, por conseqüência, trouxe o surgimento da anomalia Neo. Há houve seis. Isso sugere que assim como houve cinco Matrixes anteriores, também houve cinco Neos. Reparem que os Neos nas televisões na parede algumas vezes têm reações diversas à conversa. Talvez sejam as versões anteriores, no momento equivalente, reforçando a idéia de um ciclo.
Morpheus discursa em Zion que os humanos estão há 100 anos em guerra incessante com as máquinas. Podemos supor, então, que há 100 anos, o ciclo recomeçou, na forma da sexta versão da Matrix. Fazendo uma projeção rudimentar, podemos imaginar que a humanidade está há 600 anos ou mais presa em um ciclo de destruição e renascimento.
Então, Zion sempre é destruída e reconstruída? Por quê?
Sim. O Arquiteto ressalta que quando tentava controlar totalmente a humanidade, fracassava. Então, apenas depois que lhe deu o livre arbítrio, a Matrix serviu seu propósito.
Como eu dizia, ela [Oráculo] se deparou por acaso com uma solução por meio da qual quase 99,9% de todas as cobaias aceitavam o programa, contanto que lhes fosse dada uma escolha, mesmo que só estivessem cientes dela em um nível quase inconsciente. Embora esta resposta funcionasse, ela era óbvia e fundamentalmente defeituosa, criando, assim, a anomalia sistêmica contraditória, a qual, sem vigilância, poderia ameaçar o próprio sistema. Por conseguinte, aqueles que recusavam o programa, ainda que uma minoria, se não vigiados, constituiriam uma probabilidade crescente de catástrofe.
Para que a humanidade fosse enganada pelo sistema, era necessário que lhe fosse dada a liberdade de escolha, ainda que esta fosse a de lutar contra o próprio sistema (em outro exemplo: assim como Deus deu a liberdade ao Homem de até duvidar Dele.).
Como o Arquiteto disse anteriormente, essa era ao mesmo tempo a solução e a falha fundamental do sistema. A única maneira de combater esta falha era controlar o quanto fosse possível a crescente descrença no sistema, e quando ela representasse perigo (com o surgimento de Neo), destruir tudo e começar do zero.
Ou seja, quando a Matrix está mais infectada com esses vírus, é hora de formatar o HD e instalar tudo de novo.
E quanto à escolha de Neo entre as duas portas?
Segundo o Arquiteto, ele não consegue destruir Neo. E mesmo se pudesse não o faria, pois a existência dele é necessária para que o sistema funcione. A única maneira que encontrou de derrotá-lo foi confrontá-lo com um dilema que, ao mesmo tempo, era um grande risco à sua própria existência.
Sempre que Neo corria para o Mainframe a fim de derrotar a Matrix naquele momento único, se deparava com o Arquiteto e com a escolha em questão. A armadilha era essa: Zion não tem escapatória. Vai ser destruída de qualquer maneira, assim como foi cinco vezes antes. O propósito do Predestinado seria o de entrar na fonte e temporariamente disseminar o código que ele carrega, com todas as suas experiências, a fim de alimentar a Matrix e prepará-la para sua próxima versão. Neste momento ele seria obrigado a escolher 23 indivíduos, 16 mulheres e 7 homens para serem desplugados da Matrix e reconstruir Zion. Se não cumprisse isso, resultaria em uma falha catastrófica de sistema que mataria todos os plugados na Matrix, e como Zion vai ser destruída, resultaria na extinção completa da raça humana.
Uma bela chantagem.
Eis a armadilha. Ou Neo concordava em reiniciar o ciclo ou adeus à humanidade. Neo ainda tenta confrontá-lo com a verdade de que as máquinas precisam dos humanos para sobreviver, mas o Arquiteto não se abala dizendo: Há níveis de sobrevivência que estamos preparados para aceitar. Isso o deixa mais uma vez sem escolha.
Quer confirmar isso com o primeiro filme? Lembra quando Morpheus disse a Neo que existia alguém que podia remodelar a Matrix como quisesse? Que foi quem libertou o primeiro deles? Que seu retorno poria um fim à Matrix? O Arquiteto confirma esta verdade: O que nos traz finalmente ao momento da verdade, em que a falha fundamental é definitivamente expressa e a anomalia revela ser tanto o começo quanto o fim.
A Matrix começa e termina com Neo.
A profecia é uma mentira? Neo não é escolhido? A Oráculo é um inimigo?
É precipitado afirmar essas coisas. Sem dúvida, o propósito inicial da Oráculo foi o de criar um sistema de controle eficiente para escravizar a humanidade. E apesar da profecia ter sido colocada em dúvida, já que todo o caminho de Neo é manipulado para que ele aja como o início e fim da Matrix, não vamos esquecer de que a Oráculo diz que ele a fez uma crente. E que, desta vez, Neo sente algo que seus predecessores não sentiram: Amor.
É possível que a Oráculo realmente tenha desenvolvido uma conexão forte com a humanidade. Afinal, ela foi o único programa que entendeu a mente humana. Apesar de ter terminado como uma personagem dúbia, acredito que ainda esteja do nosso lado.
E embora pareça que a profecia não passa de uma maneira de enganar Neo, quando analisada por outro ângulo, pode ser uma maneira de encorajá-lo a enfrentar seu destino. Afinal, cabe a ele tomar a última decisão: recomeçar o ciclo ou rompê-lo. É o que ele faz no fim do filme ao escolher salvar Trinity.
Ao romper o ciclo, Neo não condenou a humanidade à extinção?
Pelas regras estabelecidas pelo Arquiteto, sim, pois, ao escolher Trinity, deixou de ir à fonte da Matrix e escolher os 23 indivíduos para recomeçar a reconstrução. Lembre-se de que, se isso não fosse feito, a Matrix estava programada para falhar e matar todos os plugados. E, como Zion está prestes a ser erradicada, parece que é o fim mesmo.
As respostas para este confuso e ao mesmo tempo brilhante estratagema só teremos no terceiro filme. Como a humanidade vai se safar dessa? Qual é a participação do Agente Smith encarnado? Por que Neo apresentou poderes no mundo real?
Seis meses nos separam destas respostas. Conselho meu: não vejam trailers. Vamos ao cinema no completo escuro que vai ser muito mais emocionante.
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