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Natimorto | Crítica

Filme-terapia de Lourenço Mutarelli põe a misantropia em questão

28.04.2011, às 19H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H20

O principal acerto de Natimorto, um filme de altos e baixos, é silenciar quando Simone Spoladore canta, ideia implícita no próprio subtítulo do livro de 2004 em que o filme se baseia, O Natimorto - Um Musical Silencioso. A personagem, uma cantora que chega à cidade para fazer um teste, tem supostamente a mais bela das vozes. Não a ouvimos porque isso a estragaria; a beleza é intangível.

As marcas de Lourenço Mutarelli, autor do romance e protagonista do filme, são facilmente identificáveis neste psicodrama de teor autobiográfico, sobre um escritor caça-talentos que, encantado com a cantora, sugere que os dois vivam isolados em um quarto de hotel para o resto da vida. O transtorno romântico-obsessivo é o mesmo de O Cheiro do Ralo, e ganha contornos esotéricos com o tarô jogado, diariamente, nas fotos da campanha antitabagista dos maços de cigarro.

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O que está no nervo do filme, porém, não tem nada de místico. É a questão do prazer estético. Onde e como buscar a beleza e o que fazer dela são os dilemas que originam todos os demais em Natimorto, porque vão de encontro à crise do autor. Escrever, afinal, não deixa de ser uma busca pelo belo. Como enxergar a beleza depende, por contraste, da aceitação das imperfeições do mundo, o Mutarelli personagem se vê desafiado naquela que é a sua única convicção, a misantropia.

Dá pra fazer uma leitura religiosa de Natimorto - o enforcado do tarô às vezes é retratado como um Cristo crucificado de cabeça para baixo -, mas, independente dessa interpretação, temos aqui em curso, sem dúvida, uma tentação da carne, como se aquele prazer estético, em si, fosse quase um pecado. O homem impotente ante a nudez da mulher ideal é mais uma reiteração do autor em conflito, com suas ilusões de pureza, diante da sedução do mundo.

Mutarelli diz no filme que a "vaidade é o caminho do inferno", mas a terapia que ele faz em Natimorto, criando uma imagem espelhada de si ("eu só me vejo invertido", diz), não deixa de ser uma forma de vaidade. Se a questão é entender a crise, talvez a pergunta a ser feita seja: o que há de tão ruim no inferno?

Natimorto | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom
Natimorto
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Ano: 2009

País: Brasil

Classificação: 12 anos

Duração: 92 min

Direção: Paulo Machline

Elenco: Lourenço Mutarelli, Simone Spoladore, Betty Gofman

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