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O Equilibrista

Documentário ganha espectador pelo que tem de construção romantizada e estrutura ficcional

09.04.2009, às 15H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H46

O documentário O Equilibrista refaz a maior aventura da vida de Philippe Petit - o dia em que o francês andou por 45 minutos da Torre Sul à Torre Norte do World Trade Center sobre um cabo de aço - por meio de filmagens de arquivo, entrevistas recentes e reconstituições dramatizadas. É uma mera fotografia, porém, o momento mais assombroso do filme.

Na foto, tirada do nível da rua, vemos lá no alto o pequeno Petit se equilibrando no nada, para a direita, ao mesmo tempo em que um avião cruza o enquadramento no sentido oposto, para a esquerda. Em momento algum do documentário de James Marsh são mencionados literalmente os ataques aéreos às Torres Gêmeas. Mas quando o avião aparece em cena, um avião qualquer em 7 de agosto de 1974, o choque instantâneo nos traz a 11 de setembro de 2001.

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São de embasbacar não só o talento, a vaidade e a teimosia de Philippe Petit, mas O Equilibrista não teria o mesmo valor - não teria ganho Sundance, o BAFTA, o Oscar - se não fosse a sombra das torres ausentes.

O inglês Marsh tem total consciência do imaginário que está manejando, tanto que busca gravações da construções do WTC em 1968. Vemos sendo levantadas as armações de ferro que tão fácil desabaram há oito anos; ao fundo, "Fish Beach", a música orquestrada de Michael Nyman, lembra aqueles temas "rumo ao progresso" de propragandas governamentais.

Um entrevistado diz que é como se as Torres tivessem sido erguidas para Petit. Pela forma como o filme romantiza o equilibrista francês, a declaração não parece longe da verdade. Não é o tipo de documentário, enfim, que se presta a imparcialidades. Ao final não fica claro como amores terminam, como amizades se desmancham, não ficamos sabendo sequer o que Philippe Petit achou dos atentados. O foco principal é edificar um mito.

O Equilibrista é um documentário menor por se furtar a fazer as perguntas incômodas? Não necessariamente, mesmo porque não é a investigação que interessa a Marsh. A genialidade do seu trabalho está justamente em trabalhar bem com elementos da chave oposta à do "bom" documentário: a manipulação dos fatos e a reencenação da história para mitificar ainda mais a jornada do herói. O Equilibrista é irresistível, emocionante, cativante - adjetivos normalmente associados a filmes de ficção - porque é mesmo a ficção que o longa procura.

O que nos leva de volta aos atentados.

Para empalidecer a barbárie fatalmente sortuda dos fundamentalistas, o WTC lembra que teve um dia um herói tipicamente ocidental: self-made man, perseverante, que brinca com a morte mas a domina, que desafia a lei, que perdoamos quando trai a mulher, que tem amigos confiáveis mas cientes de suas posições de coadjuvantes. O estilo da narrativa, meio filme de assalto, também é tipicamente ocidental. O arco dramático, com perigos crescentes, e o momento de superação, com uma quase desistência às raias da conquista final, são tipicamente ocidentais - como o são vários dos personagens, do maconheiro que arrega na hora H ao milionário que põe em risco seu nome para bancar a aventura.

É do mito Petit e é desses arquétipos tão próximos a nós que O Equilibrista se faz. Nessa hora, pouco importa se correspondem à realidade. O que importa é o que a história nos conta: que "o bem venceu", por 45 minutos, em 1974.

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