Existe esse consenso de que Eddie Murphy faz as piores comédias, multiplicando sua presença em cena com muitas camadas de maquiagem e piadas de flatulência, mas em essência não é isso que faz os filmes serem ruins (faz apenas serem grosseiros). O Grande Dave é ruim porque o humor de Murphy é baseado numa mistura de constrangimento com ofensa, e o filme, paradoxalmente, luta o tempo inteiro para anular isso.
Primeiro o longa começa investindo no absurdo. O negro alto careca aterrisa em Nova York com um terno todo branco. Diante das pessoas, sorri de um jeito que mostra todos os seus 32 dentes brancos - sempre em constante close-up, em planos que duram tempo suficiente para constranger os co-protagonistas de Murphy e a platéia. Quando aperta a mão de um sujeito branco e imita seu jeito de rir, Murphy o faz da forma mais caricata. Parece relinchar como um cavalo com problemas mentais.
o grande dave
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Desde seus tempos de Saturday Night Live o comediante aposta na exacerbação desse constrangimento racial. Mas os tempos são outros e a proposta de O Grande Dave também é distinta. Dá pra saber bem a hora em que o filme deixa de lado o humor anárquico para começar com as melosidades: quando Murphy conhece a personagem de Elizabeth Banks e a câmera vai atrás de Gabrielle Union para denotar o triangular conflito amoroso.
A história em si falava de estrahamentos. Representante de uma civilização tipo terra de Gulliver, Murphy vive o diminuto capitão de uma nave alienígena (espaçonave essa que tem a forma de um Eddie Murphy em tamanho real) que ruma à Terra para chupar seus recursos hídricos. Gabrielle Union interpreta a terceira em comando na nave. E Banks é uma mãe viúva e carente em NY. As piadas começam a partir do momento em que a "nave" precisa interagir com os humanos. E de repente as piadas param.
Os roteiristas Rob Greenberg e Bill Corbett e o diretor Brian Robbins abdicam do humor em nome de uma história tão velha quanto o próprio gênero da ficção científica: os ETs que invadem o planeta e aqui se apaixonam pelo modo de vida pouco racional dos terráqueos. É uma história não de diferenças, mas de assimilações. A tripulação da nave assimila os gestos e os hábitos dos humanos, os humanos assimilam a esquisitice de Dave. Mais do que ruim, O Grande Dave é então um filme equivocado. Impõem a Murphy a assimilação, mas seu humor sobrevive justamente do contrário, do confronto.
Pode parecer à primeira vista que não é tão ruim quanto as comédias escatológicas que ele faz. Mas é só mais inofensivo.