Chamar de promissora a carreira cinematográfica do paulistano Beto Brant, três longas em cinco anos, é chover no molhado. Formado em 1987 no curso de Cinema pela FAAP, ex-aluno de teatro da escola Proscênio, no Bexiga, Brant acumula, com a sua experiência cinematográfica, prêmios nacionais e internacionais, além de aspectos visuais e narrativos que se tornaram suas marcas registradas. Em apenas três películas, Os matadores (1997), Ação entre amigos (1998) e no novíssimo O Invasor (2001), o diretor, também roteirista, se faz conhecer e respeitar.
Sua justificativa para ter abandonado o palco (aliás, Brant se considerava um ator de qualidade) não poderia ser mais pragmática: tinha pressa, e o caos dos grupos teatrais limitava essa urgência. A saída encontrada foi a linguagem do vídeo. Tal qual muitos dos jovens autores de sua geração, como Patricia Melo, Fernando Bonassi e Marçal Aquino, inspirados por Rubem Fonseca, o diretor busca nas tramas policialescas e no submundo criminoso uma explicação para problemas sociais. Aquino, aliás, co-assina os roteiros das produções de Brant.
A temática das suas tramas coincide. O mais bem realizado, sua estréia, um retrato da realidade na fronteira Brasil-Paraguai e as suas mortes por encomenda, ganhou vários Kikitos no Festival de Gramado. O segundo repete o mote dos assassinatos, quatro amigos, torturados durante a Ditadura, buscam vingança contra o seu carrasco. Agora, chega O invasor, com cenas cheias de movimento e ação; dentre as três idéias a mais crua, a mais provocativa e a mais premiada.
Grande fliperama
Como cenário, a Paulicéia e a sua divisão desleal entre a insanidade suburbana e as negociatas da elite. Parceiros numa construtora, Ivan (Marco Ricca) e Gilberto (Alexandre Borges) brigam com o sócio majoritário, Estevão (George Freire), quando este se nega a participar de uma associação fraudulenta. Ambiciosos, Gilberto e Ivan decidem contratar um matador, simular um seqüestro, eliminar Estevão e assumir a empresa. Assim, rumam à periferia atrás de Anísio (o titã Paulo Miklos), um mercenário de aluguel. Dias depois, serviço completo.
No entanto, a reação seguinte de Anísio, o invasor do título, surpreende a dupla. Com desenvoltura, ele chantageia os mandantes, emprega seus "manos" na construtora, e ainda cria amizade com Marina (Mariana Ximenez), exatamente a órfã de Estevão. Daí, sufocados, Ivan e Gilberto desesperam-se. Apesar do apelo de atores globais e da inusitada participação do músico Miklos, o resultado não soa superficial ou forçado. O titã surpreende, um desempenho digno do troféu especial do júri como ator-revelação, entre outros cinco prêmios, no Festival de Brasília, em 2001. Cabe a Ricca, no entanto, sustentar o roteiro naquilo que há de mais importante: suas expressões exibem bem o conflito psicológico e moral que surge dos desdobramentos do crime.
Os méritos da fita enumeram-se além das já citadas. Merecidamente, O Invasor recebeu, em janeiro de 2002, o prêmio de melhor filme latino-americano em Sundance. O tratamento dado à cidade também se destaca. Filmada numa película de 16mm, depois trabalhada e adaptada para a tradicional 35mm, a bela fotografia exibe a metrópole como um grande fliperama, seja no grafite da periferia, na velocidade das grandes avenidas ou nas cores psicodélicas das casas noturnas. Também a trama mostra-se fiel: todas as falas de Anísio foram escritas pelo rapper Sabotage, um dos responsáveis pela trilha sonora barulhenta, que inclui, claro, Paulo Miklos.
Enfim, há muito o que comentar. Aos paulistanos, o programa é obrigatório. O Invasor possui as qualidades daqueles filmes que não esgotam análises e discussões.
Ano: 2001
País: Brasil
Classificação: 18 anos
Duração: 97 min
Direção: Beto Brant
Elenco: Paulo Miklos, Marco Ricca, Alexandre Borges, Mariana Ximenes, Malu Mader, Chris Couto, George Freire, Tanah Correa, Jayme del Cueto, Sabotage, Marina Franco, Daniela Tramujas, Thavyne Ferrari, Priscila Luz, Marcos Azevedo, Silvio Luz, Amanda Santos, Ida Sztamfater, Tom Curti, Manoel Freitas, Joeli Pimentel, Audreia Regina, Piero Sarjentelli, Arthur Marsan, Walmir Pinto, Mario Bortolotto, Viétia Zangrandi, Black Gero