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O Silêncio de Lorna - Mostra SP 2008

Irmãos Dardenne fazem suspense dramático com as aparas do gênero

08.10.2008, às 00H00.
Atualizada em 02.11.2016, ÀS 14H02

Há um certo alento no cinema dos irmãos Dardenne, mestres belgas do cinema humanista. Do cinema realista. Do cinema.

Depois do extremamente bem-sucedido A Criança, Jean-Pierre e Luc Dardenne realizaram O Silêncio de Lorna (Le Silence de Lorna). Para quem conhece a produção da dupla, é como se voltássemos a um universo já estabelecido, o da classe média-baixa belga - as ruas do tal "primeiro mundo". Não há grandes mudanças de tom, tampouco de técnica. Os irmãos continuam fazendo o que fazem melhor - e é exatamente o que deveriam, considerando que tão poucos cineastas hoje conseguem demonstrar brilhantismo filme após filme, causando reações emocionais no público que não se dissipam ao longo dos dias.

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O Silêncio de Lorna também tem alguns elementos de tensão inesperados. Há um problema criminal durante o filme que se prova envolvente - é como se observássemos os bastidores de um thriller. Os diretores rejeitam todas as obviedades do gênero, todas as cenas esperadas e constróem seu filme com os pedacinhos de película que o cinema comercial deixaria no chão da sala de edição. São os pequenos momentos entre os grandes atos que importam.

Na história, contada através de um roteiro vencedor em sua categoria no Festival de Cannes 2008, Lorna (Arta Dobroshi) é uma imigrante albanesa com cidania belga que busca seus sonhos ao lado do namorado. Para tanto ela aceita trabalhar com um pequeno criminoso, algo que pode apressar seus objetivos. Mas conforme as semanas passam, Lorna percebe que não há sonho futuro algum que compre sua paz presente.

A talentosa Dobroshi é um mistério. Acompanhá-la, sisuda, nas tarefas cotidianas enquanto ela fala ao celular, trabalha em uma lavanderia e vai pra casa, onde tem uma estranhíssima e inexplicada (a princípio) relação com o personagem de Jérémie Rénier (de A Criança), é parte da experiência de O Silêncio de Lorna. Os pedacinhos do quebra-cabeça juntam-se aos poucos, sem esforço, revelando algo muito maior e ao mesmo tempo extremamente profundo e íntimo. A atriz é excepcionalmente boa e o amadurecimento de sua personagem, algo que ela conduz com naturalidade, é fundamental para o sucesso do filme.

O solitário ato final gerou certas críticas negativas, mas me pareceu um passo adiante no cinema dos irmãos. Parece que o público, especializado ou não, segue querendo desfechos cármicos, que mostrem como o mundo responde às transformações de caráter positivas com um tapinha das costas, uma manifestação de apoio. Já os Dardenne parecem querer discutir aqui que os atos de decência num mundo conspurcado geram cruzes - e carregá-las pode ser algo mais difícil que simplesmente errar.

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