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Gay Nerd | Drag Queens como ícones pop

A importância de RuPaul na ascensão da arte drag

22.09.2015, às 12H21.

RuPaul's Drag Race é um desses programas de TV que mudam a vida. Sem exageros, o reality liderado por RuPaul é um show de talentos, aprendizado, humanidade, representatividade e, claro, diversão das melhores. Miga, dá para chorar, gargalhar e se inspirar a cada episódio das sete temporadas, além dos extras. No geral, a Corrida das Drags de RuPaul é de extrema importância  para o mundo gay nerd. Aqueçam os motores e venham comigo.

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A origem do termo "drag" é controversa e a mais aceita é a expressão "dressed as a girl", do teatro, na época de Shakespeare, quando todos os atores eram homens e interpretavam inclusive os personagens femininos. Encarando dessa forma, uma drag queen é um homem que encarna um personagem feminino para uma performance, seja teatral, musical ou qualquer que seja a natureza artística.

Se você é gay e já visitou alguma casa noturna deste mundo, deve ter encontrado drags e assistido a um de seus shows, que incluem dublagem e performances com coreografias. Esses shows fazem parte da cultura gay desde o seu início e no Brasil podemos encontrar, inclusive, casas especializadas como a Blue Space.

Embora estejam inseridas na cultura LGBTI, drags sempre sofreram preconceito por serem figuras femininas que "agridem o masculino" tão valorizado entre os gays "ativos, discretos e fora do meio". Já presenciei amigays torcendo os narizes ao saber que gosto de shows de drag ou que costumo frequentá-los. Coisa de afeminada, né?

A Drag Queen não é necessariamente transgênero, mas pode ser, como já expliquei numa coluna anterior. A Drag Queen também não é necessariamente travesti, mas pode ser. Gosto de encarar as drags como artistas cuja obra são elas mesmas, cuja expressão artística é o próprio corpo e a capacidade de se transformar no palco. E é dentro desta realidade que RuPaul, uma das drags mais famosas do mundo do entretenimento, conseguiu levar uma cultura de gueto, das boates LGBTI, para o mainstream. RuPaul, um ícone pop em si, encontrou a fórmula para, digamos, "fabricar" drags e lançá-las ao estrelato.

A trajetória de RuPaul é longa e repleta de conquistas, merecendo uma coluna inteirinha dedicada a ela. Como esta não é a tal coluna, e para não deixar de citar alguns de seus feitos, vale dizer que a famosa drag queen já conduziu o programa de entrevistas The RuPaul Show durante 100 episódios e fez um dueto com Elton John - ouça aqui. Quando lançou RuPaul's Drag Race em 2009, com formato simples e objetivo, conseguiu criar um dos melhores realities da TV norte-americana.

A fórmula é simples: um número de competidoras, um desafio por episódio no qual uma participante é eliminada e uma ganhadora ao fim da temporada. A estrutura dos episódios também é simples: um mini-desafio que leva ao desafio principal, a apresentação do desafio e um desfile temático, além de uma eliminação baseada numa batalha de dublagem. A melhor fica, a pior vai embora.

Dentro dessa fórmula há espaço para a discussão de temas como sexualidade e gênero, além de aceitação, respeito e, pasmem, reflexão. A montagem do programa é ágil e ajuda no ritmo da coisa, colocando outros realities no bolso. Além disso tudo, RuPaul's Drag Race é uma escolinha de novas gírias. Okaaay, guuurl?! Entre desafios de canto, costura, performance ou foto, podemos também ver o que está por trás de cada uma daquelas personagens, suas histórias pessoais, dramas, dores e felicidades. Algumas se destacam e viram ícones.

É neste contexto, nesta escolinha de drags, que RuPaul conseguiu, através de um reality show, apresentar ao mundo drags talentosas, outras nem tanto, dar uma guinada na carreira delas e representar com poder o mundo LGBTI. Gosto do seriado pela polêmica, pela subversão de gênero e presença de drags trans, assim como drags com HIV. Ali, a cada 40 minutos semanais, podemos refletir, com diversão, sobre todas essas questões. Alguns dirão que há futilidade demais, mas RuPaul conseguiu, através do entretenimento, levantar questões importantes para o nosso mundo. É, de longe, a maior representatividade LGBTI que temos na televisão nos tempos atuais.

Além da temática drag ter se tornado parte do mainstream do entretenimento, as garotas da RuPaul se tornaram ícones pop, abrindo as portas para que outras drags ao redor do mundo também brilhem. A festa Priscilla, por exemplo, traz desde o ano passado as participantes do reality ao Brasil. Já passaram por aqui Adore Delano, Willam, Raja, Shangela, Alaska, entre outras. Nos próximos meses Bianca Del Rio e Jinkx Monsoon, ambas vencedoras, também desembarcam em terras tropicais. Tudo isso acompanhado do burburinho que é trazer grandes artistas: ingressos esgotados, meet & greet disputadíssimo e uma legião de fãs.

Há também bastante espaço para as drags brasileiras, que ganharam o mesmo status de estrelas: Penelopy Jean (minha favorita), Tiffany Bradshaw, Alexia Twister, Amanda Sparks, Márcia Pantera, Ikaro Kadoshi e Silvetty Montilla.

Hoje as drags são ícones LGBTI, ícones pop, antes relegados ao mundo dos guetos e dos círculos fechados. RuPaul levantou a bandeira para que todas essas drags, as que passam por seu programa e tantas outras, tenham a chance de ganhar a vida fora das casas de show e dentro do mainstream.

Existe, claro, os que acusam RuPaul de ser transfóbica, de se aproveitar de cada uma dessas drags para se promover e de criar mentiras com a edição do programa, mas vejo tudo isso como um grande shade. Depois da contribuição de Mama Ru, falta bom senso na galera que atira pedra. Afinal de contas, quando você vira emoji LGBTI no messenger do Facebook, algum bem precisa ter feito pela comunidade. Vamos tirar a bunda da cadeira e apoiar as drags das nossas cidades.

Por fim, não esqueçam da máxima rupauliana: se você não consegue se amar, como vai amar outra pessoa? Posso ouvir um AMÉM? Um bayjo, um quayjo e até a próxima coluna.

Adotamos a sigla LGBTI por ser a mais completa para se referir à diversidade de gênero e identidade sexual nos dias atuais. O T se refere a "TRANS" (travestis, transexuais e transgêneros) e o I a "Intersexual", pessoas com características de ambos os sexos e que podem se reconhecer como homem ou mulher, independente das características físicas. Esta definição é contribuição do leitor Vinícius.

*Gay Nerd é uma coluna quinzenal que mistura nerdices aos temas LGBTI


Isaque Criscuolo é editor do Imerso, nerd, adora um lipsync e acredita que menos é mais

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