O que existe depois do auge, se não a decadência? Quando O Exterminador do Futuro 2 - O Julgamento Final fez sua estreia no cinema, há exatos 30 anos, presenteou o público com revoluções simultâneas em diferentes frentes do cinema de entretenimento. Mais do que isso, se sedimentou como um dos maiores filmes de ação de todos os tempos, lançando uma sombra grande demais para que qualquer sequência conseguisse sequer passar perto de repetir seu brilho.
O filme de James Cameron é uma ficção científica divertida e inteligente sobre viagem temporal e o fim da humanidade; um rompante de cenas de ação eletrizantes executadas no mais alto nível técnico; uma história envolvente sobre o reencontro de uma mãe e seu filho, frente a um enorme trauma; um ensaio bem humorado sobre a estranha amizade entre um garoto e um ciborgue assassino; a árdua jornada de amadurecimento de uma das heroínas mais sensacionais da ficção. Tudo junto, misturado e equilibrado com apenas um propósito: entregar pouco mais de duas horas de diversão memorável. E deu certo. Até demais!
A influência do longa-metragem de 1991 vive forte mesmo três décadas depois, ainda sem dar sinais de que perderá força. Em Bill & Ted: Encare a Música (2020), um robô assassino viajante do tempo é apresentado com uma trilha sonora que parodia o tema musical de Brad Fiedel para O Exterminador do Futuro 2. No filme animado Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas (2018), Robin joga videogame com um personagem que é introduzido igual ao exterminador T-1000 (Robert Patrick), principal antagonista da produção noventista. Isso sem falar das incontáveis releituras dos bordões “hasta la vista, baby”, “venha comigo se quiser viver” e “I’ll be back”, melhor lido e falado no original, inundando longas e séries por aí.
O problema é como essa influência acabou minando as perspectivas de repetição desse sucesso em basicamente tudo que a franquia lançou depois. A figura imponente e carismática de Arnold Schwarzenegger como o exterminador T-800 se tornou tão análoga à saga que virou ora uma amarra, ora uma muleta. A importância da Sarah Connor de Linda Hamilton, dona do arco emocional que amarra a história dos dois primeiros filmes, acabou ofuscada ou esquecida até ser resgatada em uma sequência ruim, mais de 25 anos depois. E os avanços tecnológicos capitaneados por Cameron criaram a falsa noção de que O Exterminador do Futuro era uma franquia que se apoiava primariamente em grandes efeitos especiais, quando a realidade era muito mais rica.
Pioneirismo na aplicação da tecnologia de captura de movimentos para registrar uma performance em computação gráfica; criação do primeiro personagem principal parcialmente gerado por computador; o orçamento mais alto de um longa-metragem na história, até então (estimado entre US$94 milhões e US$102 milhões). Essas eram algumas das marcas históricas que já gravavam O Exterminador do Futuro 2 nos anais do cinema, antes mesmo de sua estreia. Mas o filme dirigido por Cameron e escrito por ele em parceria com William Wisher, tinha seu maior trunfo em como espelhava o original, de 1984. Enquanto sequência, ele não só expandia a escala do que foi visto anteriormente, mas subvertia expectativas anteriormente estabelecidas, colocando o enredo e a manipulação emocional do público sempre em primeiro plano.
De forma inteligente, Cameron enxergou o potencial de Schwarzenegger como protagonista, colocando o antigo vilão como herói e apresentando um novo antagonista, travestido de mocinho. Entre uma de muitas escolhas criativas acertadas da produção, o implacável T-1000 passa a maior parte do longa empilhando corpos de inocentes enquanto veste uma roupa de policial, aprofundando o subtexto distópico do filme e flertando com o comentário social. Se Sarah Connor foi uma inadvertida vítima carente de salvação em 1984, na sequência ela se torna uma guerreira determinada a proteger seu filho, a si mesma e a toda a humanidade a qualquer custo. E de uma história de amor romântico impossível entre ela e Kyle Reese (Michael Biehn) no primeiro longa, evoluímos à trama de amizade improvável entre John Connor (Edward Furlong) e o T-800 em O Exterminador Futuro 2.
Não é à toa que Cameron nunca mais assinou a direção de um longa da franquia, tendo se reservado ao papel de produtor. De uma perspectiva criativa, primeiro e segundo filme são obras complementares perfeitas, de forma que adicionar um novo capítulo estará sempre fadado a ser derivativo ou distante demais das convenções que fizeram da saga um sucesso; o que acontece em O Exterminador do Futuro 3 - A Rebelião das Máquinas (2003) e O Exterminador do Futuro - A Salvação (2009), respectivamente. E embora O Exterminador do Futuro: Gênesis (2015) e O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio (2019) tentem fazer diferente, buscando mais uma vez aquela ênfase na subversão da expectativa, ambos o fazem de forma tão cínica que flertam com o ofensivo, tamanha a sua mediocridade.
Justiça seja feita: se nos cinemas a franquia não voltou a acertar o tom desde os anos 1990, na TV ela deu a prova de que é sim possível contar boas histórias dentro desse universo. Com só duas temporadas, Terminator: The Sarah Connor Chronicles (2008 - 2009) apenas reforçou como histórias envolventes precisam ter o desenvolvimento dos personagens em primeiro lugar, além do fôlego e da confiança de que elas também podem vir a se tornar clássicos graças aos próprios méritos. Uma pena que isso não tenha se traduzido em qualquer aprendizado para as telonas.
Assim, não há melhor maneira de celebrar o aniversário de um dos maiores filmes de todos os tempos do que refletir sobre como ele não só expandiu, mas esgotou uma das histórias mais marcantes já contadas nas telonas. E, claro, reconhecendo que O Exterminador do Futuro deveria ter acabado ali mesmo, em 1991, quando encontrou o seu auge. Quem sabe essa corrente de pensamento não chega até Hollywood e nos poupa de mais versões pasteurizadas de um filme com 30 anos de idade? Está aí um futuro que eu adoraria exterminar.