Adam Driver em Cena de Ferrari

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Ferrari evita rotular fundador da escuderia como herói ou vilão

Longa de Michael Mann coloca espectador dentro de corrida dos anos 1950

Omelete
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31.08.2023, às 14H49.
Atualizada em 31.08.2023, ÀS 15H19

Foram anos tentando levar a vida de Enzo Ferrari para as telas. Tantas, que o fundador da Ferrari seria interpretado por Christian Bale em uma versão e por Hugh Jackman em outra. O papel acabou nas mãos de Adam Driver, que estrela Ferrari, um dos filmes mais aguardados da competição do 80º Festival de Veneza, exibido na manhã dessa quinta-feira (31) em sessão de imprensa. O filme conta com a participação do brasileiro Gabriel Leone, no papel do piloto de origem espanhola Alfonso de Portago – um personagem importante na trama, embora não seja muito aprofundado.

Ferrari marca a volta de Michael Mann ao cinema – o diretor de Ali (2001) e Colateral (2004) não lançava filme desde Hacker (2015). No ano passado, ele estreou a série Tokyo Vice na HBO Max.

Valeu a espera. Mann sabe como poucos investigar a masculinidade clássica, os homens ambiciosos que erguem barreiras à sua volta para conseguir chegar aonde desejam. Enzo Ferrari hoje é uma lenda para quem gosta de automobilismo e carros, mas, em 1957, quando o filme se passa, estava em crise. Sua fábrica, fundada no pós-guerra, passava por dificuldades, e nas corridas, onde investia boa parte do dinheiro, a sua escuderia não estava indo bem, perdendo sempre para a Maserati.

Acima de tudo, é um homem que tentou escapar das emoções, mas foi alcançado por elas. Que é poderoso, mas não conseguiu derrotar a doença que levou seu filho. É um homem em luto, que passa por uma crise no casamento com Laura (Penélope Cruz, ótima), que o ajudou a criar a companhia no pós-guerra. Não ajuda que ele mantenha há anos um relacionamento com Lina (Shailene Woodley), mãe de seu outro filho, que pergunta todos os dias qual será, afinal, seu sobrenome. Mesmo sendo um filme sobre um homem e a masculinidade, Laura, Lina e a mãe de Enzo são mulheres com personalidade, cujas razões ficam claras e fazem sentido.

Ferrari foi corredor e viu dois amigos morrerem na pista. No automobilismo, afinal, a morte caminha ao lado da vitória – ainda mais naquela época, em que nem cinto de segurança havia. Mann retrata de maneira fiel a sensação de estar no meio da corrida, com o ronco dos motores, a visão limitada do piloto, os movimentos precisos, e as consequências de uma saída da pista ou acidente fatal.

Mas Enzo Ferrari não consegue abandonar as corridas. Na verdade, a fábrica é apenas uma desculpa para ele poder participar delas. Ao mesmo tempo, é pressionado para usá-las como propaganda para a venda de automóveis. Por isso, ele vê como sua única saída uma participação vitoriosa nas Mil Milhas, uma corrida por estradas e ruas estreitas da Itália. Entre os pilotos que ele escala está Portago – curiosamente, Leone interpretará Ayrton Senna na série da Netflix que está em produção.

Por ser o diretor que é, Michael Mann escapa das armadilhas das cinebiografias que, mesmo quando tentam mostras as falhas de seus personagens, fazem de maneira superficial. Enzo Ferrari pode ter feito coisas dignas de nota, mas não é herói nem vilão. É apenas um homem, com todas as suas limitações.

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