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A história por trás de Alice no País das Maravilhas

Livro que nasceu do pedido de uma menina por uma história faz 150 anos cada vez mais vivo e forte

04.07.2015, às 12H36.

Fez sol no dia 4 de julho de 1862 em Oxford, na Inglaterra. E não é preciso verificar os jornais da época ou algum arquivo sobre aquecimento global para ter certeza. Naquele dia, Charles Lutwidge Dodgson e a família de Henry Liddell fizeram um passeio de barco entre a Folly Bridge e a vila de Godstow. Para distrair as meninas Lorina, Alice e Edith, Charles contou uma história que fez sucesso com seu pequeno público. Dois anos depois, a história foi publicada, tornando-se um dos mais importantes livros da literatura mundial.

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Para a publicação, Charles usou seu nome artístico. Primeiro, traduziu seu nome para o latim, onde Charles virou Carolus e Lutwidge se tornou Ludovicus. Em seguida, os dois nomes foram trazidos de volta ao inglês, onde Carolus Ludovicos se tornou Carroll Lewis, terminando o malabarismo linguístico com uma inversão que transformou Charles Lutwidge em Lewis Carroll. Parece um plano infalível, mas na verdade esse foi um dos pseudônimos de uma pequena lista enviada pelo autor ao editor Edmund Yates, a quem cabe o crédito pela escolha. Sem ele, Aventuras de Alice no País das Maravilhas poderia ter sido assinado por Edgar Cuthwellis, Edgar U.C. Westhill ou Louis Carroll.

As duas Alices

Embora ligado para sempre às aventuras de Alice, a escolha do pseudônimo aconteceu anos antes, em 1856, quando Dodgson publicou um poema na revista The Train. O passeio do dia 4 também foi um de vários nos quais o escritor contou histórias para as meninas, mas foi o pedido de Alice Liddell que o fez colocar a narrativa no papel. A primeira versão da história, batizada de As Aventuras de Alice no Subterrâneo, foi escrita e ilustrada à mão pelo autor como um presente de Natal para Alice Liddell. Já a expansão do livro foi sugestão de George MacDonald, autor de livros infantis e amigo de Lewis Carroll, que leu a história de Alice para os filhos.

Incentivado pelo teste de audiência, Carroll fez algumas alterações para a publicação. Entram em cena o chá do Chapeleiro Maluco e o Gato Risonho, que não existiam no original. Com medo que o público confundisse seu livro com um manual de mineração, Carroll tirou o "subterrâneo" do título, substituindo por País das Maravilhas. Saíram também os desenhos do autor, substituídos pelo trabalho de Sir John Tenniel, que deixou de ser famoso pelos cartuns políticos da revista Punch para ser conhecido como o ilustrador oficial das histórias de Alice. E assim, em 4 de julho de 1865, três anos após o passeio de barco no Tâmisa, Alice no País das Maravilhas chegava às livrarias em uma primeira edição de dois mil exemplares e uma crítica feroz. Tenniel ficou descontente com a impressão, e uma nova primeira edição foi impressa em dezembro de 1865. Em um ano, Alice seria um campeão de vendas da era Vitoriana, com cinco mil exemplares vendidos.

Mais uma incentivadora do que uma musa, Alice Liddell passaria a vida sob a sombra da personagem do livro, a ponto de em 1932 escrever a um dos filhos que não queria ser ingrata, mas às vezes ficava cansada de ser Alice. A multidão de fotógrafos que a cercaram quando chegou aos Estados Unidos para a festa dos cem anos de nascimento de Lewis Carroll e as exigências de ser vista como uma eterna criança sem dúvida cobrando seu preço.

Para Lewis Carroll, o sucesso eclipsou seu trabalho como matemático, professor, fotógrafo inventor e estudioso no campo da lógica. A situação ficou ainda pior com as acusações de que o autor seria um pedófilo, polêmica reforçada pelo fim da amizade do escritor e a família Liddell no verão de 1863 e o sumiço de várias páginas de seu diário de junho daquele ano. Para alguns, Charles Dodgson foi um homem incapaz de se relacionar com adultos, dedicado a amizades com meninas, posição desmentida por seus diários e cartas. Em uma delas, ele tranquiliza sua irmã, preocupada com os boatos sobre seu relacionamento com uma mulher de 25 anos. Numa resposta que ficaria bem nas redes sociais, Charles Dodgson diz que toda pessoa capaz de falar, uma hora ou outra vai falar mal de alguém.

Fora dos mitos e polêmicas sobre Carroll e os Liddell, Aventuras de Alice no País das Maravilhas encontrou seu espaço entre os clássicos que atravessam o limite entre literatura infantil e adulta. Como outros livros que partem do mundo real para um universo de regras próprias, onde o absurdo, o mágico e o ilimitado coexistem, a narrativa de Carroll é capaz não só de envolver seu público alvo, mas também de levar os adultos a voltarem à infância. É também um universo fértil para adaptações, seja a animação feita pela Disney em 1951 ou a visão pessoal de Tim Burton (2010), que trabalhou com seus habituais comparsas, Johnny Depp, como o Chapeleiro, e Helena Bonham Carter como a Rainha Vermelha, ou a mal sucedida derivada de Once Upon a Time, Once Upon a Time in Wonderland. Um processo em constante evolução e ebulição, reforçado pelos eventos que comemoram os 150 anos do livro.

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